SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O alto número de colisões entre aeronaves e animais levou o tema para instituições de ensino superior em várias partes do país.
Em um desses projetos, a Secretaria Nacional de Aviação Civil desenvolve uma parceria com o LabTrans/UFSC (Laboratório de Transportes e Logística da Universidade Federal de Santa Catarina) para gerenciamento de risco de fauna em aeródromos brasileiros, com mapeamento genético dos bichos envolvidos nos acidentes.
Somente nos dois primeiros meses deste ano, 451 colisões entre aeronaves e animais em aeroportos e aeródromos no país acabaram reportadas oficialmente –na média, foram quase oito por dia. Do total, 414 envolveram aves.
Os dados fazem parte do Painel Sispaer, de ocorrências aeronáuticas, desenvolvido pelo Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos), órgão ligado à FAB (Força Aérea Brasileira), pelo Decea (Departamento de Controle do Espaço Aéreo) e pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), e envolvem casos que provocaram algum tipo de dano estrutural à aeronave.
De acordo com Secretaria Nacional de Aviação Civil, o projeto com a UFSC pretende incrementar ações para redução dos acidentes com a identificação das espécies colididas com aeronaves, por meio da análise de DNA e da disponibilização de uma base de informações de medidas de mitigação do risco de fauna.
A Folha de S.Paulo mostrou que os investimentos de aeroportos para afastar, principalmente aves, vão da contratação de biólogos, veterinários e engenheiros agrônomos, ao uso de drones, cães e aves de rapina.
Atualmente, a rede colaborativa estruturada para o projeto tem 39 aeródromos e três laboratórios de universidades parceiras, conforme a pasta.
A Secretaria Nacional de Aviação Civil diz que o projeto com a UFSC desenvolveu uma base de informações com mais de 5.300 medidas de mitigação de risco de fauna no país, relacionadas a 122 espécies e a 216 grupos de animais.
Além de instituições de ensino, governo e aeroportos, companhias de aviação têm participado do projeto.
Segundo Raul de Souza, diretor de Segurança e Operações de Voo da Abear (Associação Brasileira das Empresas Aéreas), tripulantes têm sido orientados pelas companhias a reportar qualquer tipo de avistamento e colisões.
A empresa Azul, por exemplo, diz que além da preparação de relatórios, seus pilotos também são treinados para identificar e responder a ameaças de aves durante o voo, incluindo procedimentos para desvio de rotas ou altitude para evitar colisões.
A empresa afirma manter registros detalhados e realiza análises para identificar tendências e padrões dos acidentes.
“Essas informações são usadas para aprimorar protocolos de segurança e prevenção”, explica a companhia, que diz manter inspeções regulares em suas áreas de operação para identificar possíveis atrativos de aves, como lixo ou corpos d’água abandonados.
O pesquisador Rodrigo Souza Torres estima que apenas 31% dos casos sejam relatados, apesar da tendência de crescimento nesses reportes.
“Relatos de colisões e a identificação das espécies envolvidas são essenciais para obter estatísticas confiáveis, visando à efetividade dos planos de gerenciamento de risco de fauna, melhoria de projetos e componentes de aeronaves, tornando possível subsidiar planos de manejo ambiental”, afirma.
Segundo as informações analisadas por sua pesquisa, a maioria dessas colisões ocorre no ambiente do aeroporto ou em suas proximidades, durante as fases de decolagem, aproximação e pouso.
A vegetação existente nas áreas de pistas, além dos entornos com pontos de alimentação, são aspectos que explicam a presença não só de aves, mas da fauna em geral, que busca alimento, abrigo, segurança e descanso, afirma a pesquisa.
Foi o lixo jogado nas ruas que chamou a atenção da então estudante de biologia Ianna Mara de Queiroz Barrozo, 32, no seu caminho diário de volta para casa. O problema se tornou tema de seu trabalho de conclusão de curso na Universidade Federal do Ceará.
Barrozo, que integra a equipe de biólogos do aeroporto de Fortaleza, desenvolveu uma cartilha de educação ambiental em seu TCC para ensinar o descarte correto de resíduos e mostra como o lixo jogado sem cuidados pode provocar uma tragédia aérea.
“A questão dos atrativos [a animais que podem colidir com aviões no pouso ou na decolagem] próximos a aeródromos também pode ser aplicada na sala de aula, por isso a ideia do material”, afirma a bióloga, que planeja levar a cartilha para as escolas de Fortaleza.
O aeroporto Pinto Martins, onde a bióloga trabalha, opera drones com câmera térmica para identificação de animais à noite ou em locais de difícil acesso.
FÁBIO PESCARINI / Folhapress