BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Comissão de Anistia aprovou de forma unânime nesta quarta-feira (3) a condição de anistiada política de Clarice Herzog, viúva do jornalista Vladimir Herzog, perseguida pela ditadura militar no Brasil.
O pedido de anistia é um instrumento de reparação e preservação da memória e da verdade. Com ele, o Estado pede perdão às vítimas dos crimes cometidos durante o regime militar.
Vladimir Herzog foi torturado e morto em 1975 em unidade do DOI-Codi do Exército. Os militares forjaram uma versão de suicídio e a foto criada para simular essa versão tornou-se um símbolo da repressão do período.
Com a morte do marido, Clarice começou um movimento para que fosse investigado o assassinato e punidos os responsáveis. Nas últimas décadas, travou uma luta para que o Estado reconhecesse, investigasse e punisse os responsáveis pelo assassinato.
Presidente do colegiado desde o início do governo Lula (PT), Eneá de Stutz e Almeida afirmou que a realização do julgamento é emblemática e que significa também um momento também para homenagear todas as mulheres que atuaram no movimento por anistia política.
Um dos filhos de Clarice, Ivo Herzog acompanhou o ato. Em sua fala, disse que a partir da morte de seu pai, o objetivo da vida de Clarice passou a ser “a verdade e a justiça sobre o assassinato” dele. “Clarice é uma das heroínas dessa história”, afirmou.
A relatora do pedido, Vanda de Oliveira, afirmou que a resistência de Clarice é uma “luz que ilumina os erros que o país tem cometido diante de sua própria história”. “Ao ser tão determinada, ela ajudou o Brasil, um país que se acostumou ao esquecimento e à impunidade.”
Além do pedido de desculpa, haverá uma reparação econômica de caráter indenizatório, em uma única prestação, correspondente a 390 salários mínimos (respeitando o teto legal de R$ 100 mil).
“Nenhum Estado tem direito de abusar de seu poder e investir contra seus próprios cidadãos. A história de sua mãe é uma história emblemática, que nos inspira, que nos dá forças para seguir lutando pela democracia. Em nome do Estado brasileiro eu peço perdão por todas essas perseguições que ela passou”, disse Eneá a Ivo Herzog após resultado do julgamento.
“A partir de agora, fica registrado nos anais da Comissão de Anistia, na memória do povo brasileiro, reforçada com as homenagens e a certeza de que ela é uma heroína do povo brasileiro. Muito obrigada pela vida, pela luta, pela coragem de enfrentar o Estado, que é muito poderoso. Mas ela enfrentou e ela venceu”, continuou.
Ana Maria Oliveira, vice-presidente da Comissão de Anistia, citou em sua fala os ataques golpistas do dia 8 de janeiro e disse que é preciso que o Brasil conheça a sua própria história para que isso não aconteça mais.
“Se aconteceu um 8 de janeiro, foi porque nós não contamos para as gerações pós-1964 o que aconteceu nesse país. O Brasil é um país que viveu mais tempo em governos ditatoriais do que democráticos. A nossa democracia é jovem e precisa ser defendida em todos os lugares desse país”, disse.
O julgamento ocorreu durante o seminário “60 anos do golpe militar de 1964: lembrar para que nunca mais se repita”, realizado em parceria com a comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados, em auditório da Casa.
VICTORIA AZEVEDO / Folhapress