BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Polícia Federal prendeu nesta quinta-feira (4) os dois fugitivos da penitenciária federal de Mossoró (RN). A fuga, inédita no sistema penitenciário federal, completou 50 dias.
Segundo Ministério da Justiça e Segurança Pública, os dois foram presos em Marabá (PA), a 1.600 km do local da fuga. A ação reuniu equipes da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal.
A fuga ocorreu na madrugada do dia 14 de fevereiro e expôs o governo de Lula (PT) a uma crise justamente em um tema explorado por adversários políticos, a segurança pública.
Rogério da Silva Mendonça, 36, conhecido como Martelo, e Deibson Cabral Nascimento, 34, chamado de Tatu ou Deisinho, foram presos com mais quatro pessoas, em três carros. Todos foram presos. Eles foram capturados em uma ponte e tentavam sair do país, segundo informou o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, em entrevista coletiva nesta quinta.
“Estavam num comboio do crime”, declarou o ministro, que acrescentou que a dupla estava recebendo ajuda externa. “Eles, obviamente, foram coadjuvados por criminosos externos. Tiveram auxílios de seus comparsas e das organizações criminosas às quais eles pertenciam”, disse Lewandowski.
Com o grupo foram encontrados oito celulares e um fuzil com dois carregadores.
De acordo com o ministro, os detentos voltarão para o presídio de Mossoró. Lewandowski disse que a penitenciária foi “totalmente reformulada, no que diz respeito aos equipamentos de segurança”.
“Eles ficarão separados, haverá vistorias diárias. A direção [do presídio] foi trocada, os protocolos foram reafirmados e aperfeiçoados e, de lá, certamente [eles] não se evadirão”, afirmou.
Ao longo dos 50 dias do crime, os fugitivos mantiveram uma família como refém, foram avistados em comunidades diversas, se esconderam em uma propriedade rural e agrediram um indivíduo na zona rural de Baraúna. Os investigadores suspeitam que os dois detentos tenham sido mantidos por membros do Comando Vermelho do Rio de Janeiro em parte desse tempo. Segundo Lewandowski, moradores foram cooptados pela dupla.
Sobre a fuga da prisão, a pasta da Justiça considera que houve falhas em procedimentos, mas descarta corrupção de agentes na fuga de dois presos da penitenciária federal de Mossoró (RN), segundo apontou um relatório da corregedoria-geral da Senappen (Secretaria Nacional de Políticas Penais), órgão ligado à pasta.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, as celas dos dois presos que fugiram ficaram ao menos 30 dias sem revista e, por isso, foram abertas as apurações contra os dez servidores.
A fuga, a primeira registrada nesse sistema desde sua implantação (em 2006), colocou em teste a gestão de Ricardo Lewandowski com apenas 13 dias à frente do Ministério da Justiça. A administração das penitenciárias federais é de responsabilidade da pasta, que teve a sua primeira crise em 13 dias sob o novo titular (que substituiu Flávio Dino, hoje ministro do Supremo Tribunal Federal).
A avaliação no Palácio do Planalto é que a prisão dos foragidos dá um alivia a pressão sobre Lewandowski, que já havia ganhado reconhecimento pela prisão dos supostos mandantes do assassinato de Marielle Franco.
No entanto, o titular da pasta ainda segue pressionado por problemas específicos de segurança pública, em estados como a Bahia e o Rio de Janeiro.
Lewandowski, inclusive, já havia recebido uma cobrança do presidente Lula durante reunião ministerial no mês passado, mesmo estando há pouco tempo no cargo. Pesquisas internas do governo apontam que a segurança pública é um dos motivos de desgaste junto à opinião pública.
Após a prisão, Lula ligou para Lewandowski para parabenizar os trabalhos do Ministério da Justiça.
Mais de 600 policiais foram envolvidos na operações de busca dos foragidos, incluindo cem integrantes da Força Nacional. Helicópteros e drones foram usados nas buscas. Durante as buscas, oito pessoas foram presas, sendo sete sob suspeita de ajudar os fugitivos. Com a captura desta quinta, destacou Lewandowski, o número de presos chega a 14.
A fuga provocou uma crise no governo e causou medo na população local. O juiz federal Walter Nunes, corregedor do Penitenciária Federal de Mossoró, disse à Folha de S.Paulo em fevereiro que, “sem dúvidas”, esse foi o episódio mais grave da história dos presídios de segurança máxima do país.
Os dois presos estavam em RDD (Regime Disciplinar Diferenciado), onde as regras são mais rígidas que as do regime fechado. Nesse tipo de ala há um local para o banho de sol para que os detentos não tenham contato com outros presos.
Na época, o presídio de Mossoró também abrigava Luiz Fernando da Costa, conhecido como Fernandinho Beira-Mar, que em março foi transferido para a unidade de Catanduvas (PR).
A fuga da penitenciária federal de Mossoró ocorreu logo após o Carnaval, na madrugada da Quarta-Feira de Cinzas, quando, segundo o ministro da Justiça, as pessoas estão mais “relaxadas”.
De acordo com Lewandowski, algumas câmeras não estavam funcionando adequadamente, assim como lâmpadas, que poderiam ter ajudado na detecção da fuga.
Os investigadores identificaram que os dois fugitivos usaram uma barra de ferro, retirada da estrutura da própria cela, para escavar um buraco no vão da luminária. Com a abertura do espaço, os presos conseguiram escapar.
Os detentos teriam conseguido a barra de ferro, de cerca de 50 centímetros, descascando parte da cela que já estava comprometida, devido a infiltração e falta de manutenção.
Com o buraco na luminária, os dois chegaram ao local da manutenção do presídio, onde estão máquinas, tubulações e toda a fiação.
De lá, a dupla conseguiu alcançar o teto do prédio. Também não havia nenhuma laje de concreto ou sistema de proteção.
Os fugitivos encontraram ferramentas que estavam sendo usadas na reforma interna do presídio. Com um alicate para cortar arame, conseguiram passar pela grade que impedia o acesso ao lado externo do presídio.
Os dois detentos haviam sido transferidos do Acre para o presídio em Mossoró, cidade localizada a 281 quilômetros de Natal, após uma rebelião que deixou cinco pessoas mortas em julho do ano passado.
De acordo com o governo acreano, Martelo e Tatu, que se declaram integrantes do Comando Vermelho, estavam entre os 14 presos transferidos para o sistema federal, em setembro passado, suspeitos de liderarem a matança. Eles cumpriam penas de 74 anos e 81 anos, respectivamente, no presídio de segurança máxima Antônio Amaro, destinado a abrigar chefes do crimes.
O país tem cinco presídios federais de segurança máxima. Além de Mossoró, há instalações em Porto Velho, Campo Grande, Brasília e Catanduvas (PR).
As penitenciárias, inauguradas a partir de 2006, foram criadas com o objetivo de isolar criminosos de alta periculosidade e desarticular organizações criminosas. Nelas, os presos ficam em celas individuais de aproximadamente 7 m² e têm direito a banho de sol de duas horas por dia.
Redação / Folhapress