Veja as principais diferenças, ponto a ponto, nos votos de juízes sobre cassação de Moro

CURITIBA, PR, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Os dois juízes do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do Paraná que já votaram no julgamento que pode levar à cassação do mandato do senador Sergio Moro (União Brasil) apresentaram uma série de diferenças em seus votos.

As ações encabeçadas pelo PT e pelo PL acusam a chapa de Moro de suposto abuso de poder econômico na pré-campanha eleitoral.

Enquanto o relator do caso, Luciano Carrasco Falavinha, avalia que não houve nenhum abuso de poder econômico, o juiz José Rodrigo Sade, por outro lado, cita “gigantescos aportes de recursos” que teriam desequilibrado a disputa.

Entenda, ponto a ponto, as diferenças nos argumentos dos magistrados.

Total de despesas

Uma das controvérsias ao longo do processo é a definição sobre quais despesas seriam ou não de pré-campanha, para avaliar se houve ou não desequilíbrio.

Ao contrário de Falavinha, que calcula um gasto de quase R$ 225 mil na pré-campanha de Moro, Sade leva em consideração a soma do Ministério Público, que aponta para uma quantia aproximada de R$ 2 milhões. As diferenças ocorrem porque os juízes discordam sobre diversas premissas.

Mudança de rumo da pré-campanha

Inicialmente filiado ao Podemos, Moro migrou em março de 2022 para a União Brasil e, sem respaldo da sigla para insistir na corrida ao Planalto, ficou como pré-candidato por São Paulo –ainda sem definição sobre cargo. No entanto, em junho de 2022, ao não ter autorização para trocar de domicílio eleitoral, em ação movida pelo PT, assumiu, por fim, a pré-candidatura ao Senado pelo Paraná.

Para Falavinha, não é possível, por exemplo, fazer uma soma simples dos gastos das três fases da pré-campanha de Moro. Ele defende que isso só seria possível se ficasse comprovado que Moro tinha, desde o início, a intenção de ser candidato a senador. Também entende que somente os valores empregados efetivamente na pré-campanha ao Senado paranaense devem ser computados para análise de suposto abuso.

Sade, por sua vez, afirma que a pretensão do candidato é irrelevante. “A construção de um nome a ser incutido na cabeça do eleitor não permite simplesmente apagar tudo, sendo bastante razoável concluir que a pré-campanha para presidente acabou o beneficiando quando, mudando as velas de seu barco, passou a tentar aportar no Senado”, completa.

Base territorial da pré-campanha

Para Falavinha, além da intenção de Moro, outro aspecto a ser levado em conta é o local em que ocorreram os atos de pré-campanha. Ele avalia que só podem ser contabilizados para análise sobre se houve abuso de poder aqueles que ocorreram no Paraná.

Sade discorda. Para o juiz, gastos da pré-campanha realizados fora do Paraná também têm influência na eleição estadual e devem ser considerados. “Os tempos atuais são outros e, com infinito alcance das redes sociais e alta propagação das mídias tradicionais na internet, não se pode mais sequer falar em limites geográficos”, argumenta.

Tipos de gastos

Além de diferenciar os cargos almejados e o local alvo dos gastos de pré-campanha, Falavinha também fez uma análise individualizada de quais despesas teriam sido, a seu ver, de caráter eleitoral. Ele excluiu, por exemplo, gastos com escolta.

“É evidente que a contratação de segurança pessoal não possui aptidão a fomentar a candidatura e atrair votos; ao revés, pode até mesmo representar obstáculo à aproximação com o eleitorado”, argumenta o relator.

Sade teve entendimento distinto. O magistrado afirma que “quase R$ 600 mil de dinheiro público” com segurança acabaram viabilizando a pré-campanha do hoje senador, “benefício esse que os demais candidatos não tiveram, daí o evidente desequilíbrio”.

“Há muitas despesas de índole instrumental mas que, ao fim e ao cabo, irão auxiliar no desenvolvimento da estratégia de campanha”, diz Sade.

Abuso

Em 2022, o limite para a campanha presidencial foi de quase R$ 89 milhões só para o 1º turno, enquanto a da campanha ao Senado do Paraná foi de cerca de R$ 4,4 milhões.

Não há, entretanto, regras que definam o quanto pode ser gasto em pré-campanha ou mesmo a partir de quando despesas podem ser assim contabilizadas, mas levando em conta o teto da campanha oficial, Sade indica que o total injetado na pré-campanha de Moro seria desproporcional.

Chegando a cálculo bastante inferior devido à diferença de critérios, Falavinha argumentou que não houve gravidade nos atos e nas despesas que ficaram demonstradas na pré-campanha, votando, por isso, contra a cassação.

Disputa acirrada nas urnas

Os juízes também interpretam de formas distintas o resultado do pleito paranaense. Moro foi eleito com 33,5% dos votos, seguido pelo então deputado federal Paulo Martins (PL), que obteve 29,1%; e pelo então senador Alvaro Dias (Podemos), que fez 23,9%.

Para Falavinha, trata-se de uma prova de que os candidatos tinham paridade de armas, ou seja, de que os gastos de Moro não interferiram na disputa. “Nada há [na pré-campanha] que tivesse causado desequilíbrio ou vantagem, valendo anotar que a disputa no Senado no Paraná foi extremamente acirrada”, diz.

Já Sade sugere o contrário: a disputa acirrada, a seu ver, indica que o tamanho da pré-campanha pode ter feito diferença no resultado. Para Sade, houve “desproporcional injeção de recursos financeiros” na pré-campanha de Moro, o que afeta um pleito “com cerca de 4% de diferença entre os dois principais candidatos”.

Fama prévia de Moro

A relevância do período da pré-campanha para alguém que já era nacionalmente conhecido em função da atuação como juiz da Lava Jato também foi ponto de embate.

Para o relator, Moro já ingressou na disputa com significativo capital político. Assim, o investimento na sua pré-campanha não teria afetado a normalidade das eleições. “Até as pedras sabem que Moro não precisaria realizar pré-campanha para tornar seu nome popular, eis que notoriamente conhecido”, diz Falavinha.

Já Sade afirma que tal argumentação “não passa de retórica”. “Caso essa fama fosse suficiente para, por si só, alçá-lo ao cargo pretendido, não faria sentido os partidos destinarem à sua pré-candidatura a quantia absurda de dinheiro que aplicaram”, argumenta. Ele afirma ainda que a fama anterior pode ser “boa e ruim” e que houve investimento para “convencer a população de que o então juiz poderia ser um bom político”.

CATARINA SCORTECCI E RENATA GALF / Folhapress

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