CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) – Juízes do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do Paraná disseram inicialmente que evitariam tratar, durante o julgamento do senador Sergio Moro (União Brasil), da Operação Lava Jato, na qual o parlamentar foi juiz e uma das mais conhecidas autoridades, antes de ingressar na política em 2018.
A operação, contudo, acabou sendo mencionada nos votos, inclusive quando se discutia o peso de uma pré-campanha de alguém que já carregava uma fama de outrora, como a do ex-juiz.
Moro se tornou alvo de uma ação judicial no TRE, movida pelo PT e pelo PL, por supostos abuso de poder econômico no período da pré-campanha e utilização indevida dos meios de comunicação. As teses foram rejeitadas ao final do julgamento, nesta terça-feira (10), pelo placar de 5 a 2. Os dois partidos anunciaram que vão recorrer ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral), que terá a palavra final sobre a cassação.
Já no primeiro dia de julgamento em Curitiba, o relator do caso, Luciano Carrasco Falavinha, prometeu que não iria julgar na ocasião “a Operação Lava Jato, seus personagens, acertos e erros”. “O que está em julgamento é a imputação de desvios na pré-campanha de um ex-juiz que se candidatou a senador”, continuou ele, que votou pela absolvição de Moro no processo.
A Operação Lava Jato, que completou dez anos da deflagração de sua primeira fase em março, costuma despertar intenso debate nos meios político e jurídico por causa dos métodos adotados. Críticos dizem que a investigação atropelou garantias dos réus em nome do combate à corrupção, versão rejeitada por apoiadores, que veem hoje uma reação política contra autoridades que conduziram os processos.
Moro, inclusive, afirma que a ação eleitoral representa uma iniciativa de perseguição.
No TRE paranaense, o relator Luciano Carrasco Falavinha, embora tenha sido o mais enfático entre os sete julgadores na tentativa de desvincular o elo entre o caso eleitoral e a discussão sobre a Lava Jato, defendeu que todo processo protocolado na Justiça Eleitoral “tem relação com a política”.
“É muita ingenuidade acreditar que, atuando como juiz em grande operação de combate a corrupção que afetou razoável parte do quadro político, ao sair da magistratura e ingressar no governo beneficiado eleitoralmente pela indicada operação, não seria atacado”, disse Falavinha, em referência à entrada de Moro no governo de Jair Bolsonaro.
Antes, Falavinha também aproveitou para citar o que considera erros e acertos da operação.
“Não se vai aqui dizer de seus acertos, ou seja, dos bilhões de reais devolvidos aos cofres públicos pela prática confessada de corrupção nunca vista antes na história desse país; muito menos seus erros, muitos deles já reconhecidos pelo STF, tais como arbitrária quebra de sigilo telefônico do então ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, familiares e até advogados; divulgação ilegal de áudios, ou do levantamento do sigilo na última semana antes do primeiro turno das eleições da delação premiada de Antonio Palocci”, disse Falavinha.
O julgamento de Moro no Paraná também teve uma outra discussão política como pano de fundo, já que o hoje presidente Lula (PT) foi quem nomeou dois advogados como juízes da corte –que acabariam participando da análise do caso de Moro. Lula foi o principal réu da Lava Jato e passou 580 dias na prisão, entre 2018 e 2019, em decorrência de sentença assinada por Moro, posteriormente anulada.
Um desses juízes foi José Rodrigo Sade, que votou a favor da cassação de Moro na semana passada. Sade refutou a tese de que “a grande fama” adquirida por Moro como juiz à frente da Lava Jato já teria rendido a ele capital político suficiente, a ponto de se poder ignorar o investimento financeiro dos partidos e o quanto isso teria “afetado a normalidade das eleições”.
Sade também pontuou que a fama na esteira da Lava Jato “pode ser boa e pode ser ruim”, em referência à onda de críticas à operação, daí os “altos investimentos em comunicação para convencer” os eleitores.
Em seu voto, ele cita que a notoriedade que já dispunha Moro ocorria “em razão da sua atuação na Operação Lava Jato, das circunstâncias em que teve o nome envolvido na Operação Spoofing, sua suposta antagonização em relação ao então ex-presidente Lula”.
A Spoofing, deflagrada pela PF, apurou o hackeamento de celulares de autoridades, e o material aprendido nela continha mensagens que mostraram colaboração entre Moro e os procuradores na época da Lava Jato, o que é ilegal.
Em outra alfinetada, o Sade disse: “Sua estreia no mundo político se dá assumindo o cargo de ministro da Justiça. Aqui, abra-se parênteses para dizer que nessa função no Executivo talvez o ex-juiz tenha tido
sua maior legitimidade para combater a corrupção e criminalidade, funções essas que sabidamente não pertencem aos magistrados”.
Outro nomeado por Lula, o juiz Julio Jacob Junior, que também votou contra Moro, seguiu a mesma linha de Sade ao tratar da fama do ex-juiz em decorrência da Lava Jato e do impacto disso na eleição: “Se até as pedras sabiam quem era Sergio Moro, como aduziu o relator em seu voto, não precisaria de tamanha e intensa pré-campanha e campanha como foram feitas”.
Jacob argumentou que “é bem verdade que o investigado ganhou relevante fama pela sua atuação na Operação Lava Jato e à frente do Ministério da Justiça”, mas que “tanto a fama não era suficiente para uma candidatura que suas redes sociais foram profissionalizadas”.
Os outros cinco julgadores votaram a favor de Moro, definindo o resultado do processo na corte em Curitiba. Os autores da ação eleitoral, contudo, apostam na discussão aberta pelos dois votos divergentes e avaliam que o resultado final pode ser diferente em Brasília.
CATARINA SCORTECCI / Folhapress