Governo deve atrasar envio da regulamentação da reforma tributária

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Ministério da Fazenda deve atrasar em uma semana o envio ao Congresso Nacional dos projetos de regulamentação da reforma tributária.

O cronograma da equipe do ministro Fernando Haddad (Fazenda) era apresentar as propostas no máximo até esta segunda-feira (15), mas o calendário foi atropelado pelo envio do PLDO (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2025 e pela viagem do ministro aos Estados Unidos.

Haddad embarca para Washington nesta segunda e retorna ao Brasil no próximo dia 20 de abril.

Nos Estados Unidos, ele vai participar da reunião anual do Banco Mundial e do FMI (Fundo Monetário Internacional), vender o plano de transformação ecológica aos investidores internacionais, além de reforçar a defesa do Brasil por uma tributação global dos super-ricos.

Com o prazo apertado, a entrega dos projetos da reforma só deve ocorrer após o retorno da viagem, de acordo com membros da equipe de Haddad ouvidos pela Folha de S.Paulo.

O adiamento, no entanto, não deve passar de uma semana, já que o calendário de votação no Congresso Nacional também está mais apertado devido às eleições municipais.

Nos últimos dias, as equipes técnicas trabalharam intensamente para dar conta dos pareceres técnicos e jurídicos que fazem parte do processo de conclusão dos textos. No entanto, mesmo que essa etapa seja superada antes do dia 20, o envio deve aguardar o retorno do ministro.

A avaliação na área econômica é que seria importante Haddad entregar a proposta pessoalmente ao Congresso Nacional, para mostrar compromisso político do governo com a aprovação da regulamentação da reforma.

O secretário extraordinário de Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, que comanda a comissão responsável pela sistematização dos textos, é visto como um perfil técnico, não político. Por isso, sua presença desacompanhada do ministro não teria o mesmo simbolismo.

A emenda constitucional da reforma tributária, promulgada no final do ano passado, deu prazo de 180 dias para o governo enviar os projetos de lei complementar com a regulamentação.

Em acordo com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), Haddad antecipou o prazo para 90 dias devido ao calendário eleitoral. O atraso em alguns dias não é visto como um problema, dada a complexidade do tema.

No início do ano, a Fazenda formou 19 grupos de trabalho, com participação de representantes dos estados e municípios.

Cada grupo ficou responsável pela discussão de um ponto específico, como cesta básica e cashback, ou regime do setor financeiro, ou ainda Imposto Seletivo, entre outros. A comissão de sistematização reuniu as propostas dos 19 grupos e agora enfrenta a etapa final, que é passar pelo crivo das áreas jurídicas do governo: PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional), Casa Civil e AGU (Advocacia-Geral da União).

O governo deve enviar apenas dois projetos de regulamentação, como revelou a Folha de S.Paulo. A proposta é juntar em um único projeto de lei complementar as normas do Imposto Seletivo e dos dois novos tributos que serão criados, a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) federal e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), de estados e municípios.

O segundo projeto agruparia a regulamentação do Comitê Gestor do IBS e as novas regras para regular o chamado processo administrativo fiscal, que trata das disputas entre contribuintes e os fiscos –uma espécie de Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) do IBS.

Na área econômica, a aprovação das normas gerais é considerada mais urgente. A CBS entra em vigor em 2026. O diagnóstico no governo é de que é importante aprovar o projeto de regulamentação ainda em 2024 para viabilizar as normas infralegais e o sistema operacional do novo imposto federal em 2025.

O segundo projeto, do Comitê Gestor, não é tão urgente porque boa parte das questões específicas ficarão para 2029. A questão é mais de natureza política.

Representantes dos estados e municípios temem que a União faça tudo sozinha e eles fiquem à reboque das decisões do governo federal. Por isso, querem participar desde o início da construção simultaneamente.

Além disso, como mostrou a reportagem, a questão do contencioso administrativo foi um dos grandes impasses durante a fase da discussão dentro dos grupos de trabalho. Segundo interlocutores, o formato final do projeto não foi fruto de um amplo consenso e há grande possibilidade de a discussão ser retomada durante a tramitação no Congresso.

O presidente da Câmara já sinalizou em encontro com empresários que a regulamentação será “dez vezes mais discutida” que o texto constitucional. Lira ainda terá que escolher o nome dos relatores.

“O atraso de uma semana é irrelevante porque é um texto muito complexo. Uma semana não vai fazer diferença. O importante é que, chegando na Câmara, o presidente Arthur comande [a tramitação] com muita competência, como fez com a PEC [Proposta de Emenda à Constituição] da reforma “, avalia o ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia.

Ele lembra que parte do setor privado não acreditava que a PEC seria aprovada, mas Lira acabou surpreendendo os descrentes.

Para Maia, o ideal seria unir as propostas num único projeto, com um relator e dois subrelatores trabalhando de forma integrada. O ex-presidente da Câmara defende o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) na relatoria da regulamentação, dado que ele já fez esse papel na discussão da PEC e conhece os meandros técnicos do tema.

“Já vi no passado projetos desmembrados que acabaram avançando com dificuldade”, ressalta Maia, que é atualmente presidente da CNF (Confederação Nacional das Instituições Financeiras).

Ele diz esperar que a regulamentação garanta um modelo para todos os setores que seja o mais não cumulativo possível, e que os regimes específicos (com tributação diferenciada) sejam limitados.

A incidência não cumulativa é aquela que evita a cobrança de tributos em cascata sobre outros tributos. Nesse modelo, os impostos são cobrados apenas sobre o valor agregado entre uma operação e outra, e o tributo recolhido na etapa anterior gera um crédito para a empresa usar no abatimento de impostos nas operações futuras.

Segundo Maia, a preocupação é evitar a aprovação de um modelo que, na prática, tenha uma parte com tributação cumulativa e outra não.

ADRIANA FERNANDES E IDIANA TOMAZELLI / Folhapress

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