BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Banco Central não faz intervenções no mercado de câmbio quando os agentes econômicos precificam o risco de investir no Brasil, afirmou Roberto Campos Neto, presidente da autoridade monetária, nesta quarta-feira (17).
A declaração foi dada em uma reunião com investidores, organizada pela XP, em Washington, nos Estados Unidos, um dia depois de o dólar ter encerrado a sessão de terça (16) cotado a R$ 5,268, operando em seu maior valor desde março de 2023.
Após cinco sessões consecutivas de fortes altas, a moeda americana operava em queda na manhã desta quarta, devolvendo parte dos ganhos.
Segundo Campos Neto, essa função é usada em casos de disfunção no mercado de câmbio, lacuna de liquidez ou episódios marcados por má interpretação dos investidores.
“Não reagimos ao fato de as pessoas estarem precificando nosso prêmio de risco. Reagir a isso é muito perigoso porque há muitas maneiras diferentes de fazer hedge [instrumento de proteção] do prêmio de risco no Brasil”, disse.
O presidente do Banco Central atribuiu a maior parte do estresse do mercado financeiro à piora do cenário externo e outra parcela à questão fiscal doméstica.
No cenário global, o principal fator de atenção está relacionado à perspectiva de que o Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA) reduza os juros apenas no segundo semestre devido à resiliência da economia americana. Houve ainda o acirramento dos conflitos no Oriente Médio, com o ataque do Irã a Israel e um eventual impacto sobre o preço do petróleo.
Na política doméstica, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) propôs uma revisão na trajetória das contas públicas, reduzindo a velocidade do ajuste fiscal. Para 2025, a meta fiscal passa a ser zero, não mais um superávit 0,5% do PIB (Produto Interno Bruto), conforme o PLDO (projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) do próximo ano.
“Há muito tempo dizemos que é muito importante perseverar com as metas. Novamente, não há relação mecânica [entre a questão fiscal e a política de juros]. […] Mas a evidência que temos do que aconteceu nos últimos dias nos diz que o mercado ficou mais preocupado com a parte fiscal”, disse.
“Isso pode mudar as expectativas sobre qual será o equilíbrio fiscal no futuro e isso terá um efeito no prêmio de risco. Isso também torna o trabalho [do BC], em termos de política monetária, mais difícil e mais custoso. A reação do mercado implica que parte da revisão recente vem da parte fiscal, mas uma parte muito maior vem do [ambiente] externo”, complementou.
Campos Neto voltou a afirmar que as âncoras fiscal e monetária estão muito relacionadas e que, com a mudança em um dos lados, a autoridade monetária precisa entender agora como isso influenciará a sua função de reação.
“Sempre defendemos o fato de que eles deveriam se ater à meta e fazer o que fosse necessário para alcançá-la. Entendemos que houve a necessidade de mudança. A ideia não é comentar tanto sobre fiscal, mas tentar ver como isso vai influenciar nossas funções de reação através das várias medidas que são importantes para nós”, disse.
“O importante para nós é como essas variáveis [decorrentes da questão fiscal e do cenário externo] influenciam nosso quadro e se achamos que isso é temporário ou se há uma mudança mais estrutural na qual precisamos prestar atenção”, acrescentou.
Diante de uma nova turbulência no cenário econômico, Campos Neto relembrou uma conversa que teve com seu antecessor, Ilan Goldfajn, quando assumiu o comando da autarquia.
“Ele me disse que nunca há um momento calmo no Banco Central. Acho que estava certo. Quando olho para trás naqueles anos em que começamos, tivemos crise na Argentina, depois Brumadinho [rompimento da barragem]. Acho que não tivemos um período de três meses sem qualquer tipo de crise”, afirmou.
O Copom (Comitê de Política Monetária) volta a se reunir nos dias 7 e 8 de maio para recalibrar a taxa básica de juros (Selic), hoje fixada em 10,75% ao ano.
Em março, o colegiado do BC sinalizou que faria um novo corte de 0,5 ponto percentual na próxima reunião. Diante do atual cenário, Campos Neto traçou quatro situações que podem guiar os próximos passos do ciclo de política monetária.
Segundo ele, uma redução na incerteza levaria o Copom a seguir o caminho usual. Se houver incerteza elevada, mas sem uma mudança significativa no quadro, isso pode significar uma desaceleração no ritmo de cortes de juros.
“Poderíamos ter um cenário em que a incerteza começa a afetar mais fortemente variáveis importantes, então, precisaríamos falar sobre mudar o balanço de riscos. Poderíamos ter um cenário em que a incerteza realmente se agrava, criando estresse globalmente, nesse caso mudaríamos nosso cenário-base”, complementou.
O presidente do BC disse também que a autoridade monetária fará o que for necessário para levar as expectativas de inflação em direção às metas definidas pelo CMN (Conselho Monetário Nacional).
A partir deste ano, o alvo é de 3%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos. Isso significa que o objetivo é considerado cumprido se oscilar entre 1,5% (piso) e 4,5% (teto).
NATHALIA GARCIA / Folhapress