BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ministro Ricardo Lewandowski impôs um novo estilo à pasta da Justiça e Segurança Pública após três meses à frente do cargo no governo Lula (PT).
Com perfil mais discreto, o substituto de Flávio Dino –que dava entrevistas recorrentes e assumiu a linha de frente no embate público entre governo e oposição– tem encampado um discurso mais burocrático com foco no papel de liderar nos bastidores o diálogo e a harmonia entre os Poderes, segundo a leitura de integrantes do governo, estudiosos da área e parlamentares.
Mantém a gestão petista, porém, sem marca positiva na segurança pública –os 50 primeiros dias à frente do cargo foram dominados pela fuga no presídio de Mossoró (RN) e pela dificuldade na recaptura dos foragidos.
Aliados de Lula afirmam que a escolha por um perfil distinto do de Dino foi o objetivo ao nomear Lewandowski. Enquanto Dino era considerado um político experimentado, o ex-magistrado carrega a bagagem de ministro aposentado do STF (Supremo Tribunal Federal).
Nesses três meses, o ministro ainda não apresentou avanço concreto sobre o programa de Dino para o programa de enfrentamento do crime organizado, o Enfoc.
Em uma das pautas positivas, o avanço na investigação do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ), Lewandowski fez uma entrevista coletiva para anúncio do acordo de delação do ex-PM Ronnie Lessa e acabou sendo alvo de reclamações da classe política e de procuradores.
A falta de marca na segurança faz uma ala de colegas da Esplanada criticar a atuação por entender que o governo federal perdeu o protagonismo que tentava impor com Dino.
O ministro costuma afirmar que a atribuição constitucional sobre o tema é dos governadores e que é difícil a União resolver os problemas do setor. A tese de parte dos ministros, porém, é que se trata de um erro no discurso político se apegar à Constituição e tentar eximir o governo federal de responsabilidade, uma vez que seria impossível evitar que os problemas do país recaiam sobre o presidente da República.
A gestão de Dino na segurança recebeu críticas por promessas não cumpridas, como mostrou a Folha de S.Paulo. No entanto, o agora ministro do Supremo viajou o país para anunciar programas e assumiu a frente do debate sobre a segurança pública. O antecessor também era considerado mais próximo da cúpula da Polícia Federal do que o atual.
Outra ala do Executivo acredita que a mudança no ministério era fundamental para melhorar a imagem de Lula. A avaliação desse grupo é que Dino cumpriu papel importante após os atos golpistas de 8 de janeiro, mas que o perfil combativo alimenta a polarização e leva para o colo do Planalto os problemas da área.
Além disso, aliados de Lewandowski ponderam que o ministro assumiu a pasta e, menos de dez dias depois, enfrentou a crise da fuga dos detentos em Mossoró, o que dificultou a implementação de seus projetos. Esses aliados dizem que após essa crise e o desfecho da investigação sobre Marielle, as políticas da pasta ficarão mais evidentes.
Um exemplo citado é que o ministro passou a defender de forma enfática uma mudança na Constituição para dar mais poderes à União. A ideia é permitir que o governo federal elabore o plano nacional de segurança previsto na lei do Susp (Sistema Único de Segurança Pública), espécie de SUS do setor, e possa obrigar os outros entes a cumpri-lo. Hoje, o governo federal não tem essa ascendência sobre estados e municípios.
A intenção é também prever a vinculação de recursos para a área no Orçamento federal, como ocorre com a saúde e na educação.
Ainda assim, aliados e opositores de Lula apontam dificuldade do governo federal para encontrar um discurso palpável para a população sobre segurança pública.
Um exemplo foi a posição do governo no projeto de lei que breca as saídas temporárias de presos em regime semiaberto. Lewandowski pediu veto ao trecho que impedia essas saídas para visitas a familiares. O governo, porém, evitou se posicionar durante a tramitação da proposta, já que ela tinha o apoio majoritário do Congresso, com perfil conservador.
Um episódio destacado por aliados e opositores que marca uma mudança no estilo do ministério foi a participação em audiência no último dia 16 na Comissão de Segurança Pública da Câmara. O ministro foi elogiado ao final da sessão.
O deputado Alberto Fraga (PL-DF), presidente da comissão, diz que o diálogo com o ministério melhorou após a saída de Dino, mas reclama da demora em atender pleitos dos parlamentares.
“Ampliou o diálogo, inclusive com a bancada da bala. Eu prometi que ele não seria desrespeitado e tivemos quatro horas de audiência sem nenhum incidente. É uma mudança importante”, diz.
Fraga diz que Lewandowski não teria atendido a pedidos feitos na audiência, como alterações no decreto das armas. Na ocasião, o ministro admitiu rediscutir pontos como a restrição de clubes de tiro próximos de escolas. Na mesma sessão, porém, ele ressaltou que o decreto está sob jurisdição do Exército e só retomará para a análise do ministério no final do ano.
O presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, também ressalta a diferença nos estilos do comando da pasta.
“O que caracterizou o Dino foi colocar dinheiro em operações e ir administrando as crises. O bom: pautou o assunto. O ruim: pautou o assunto e acabaram na conta do governo cobranças pelo problema dos estados, como a alta letalidade em São Paulo e na Bahia”, diz.
Segundo ele, Lewandowski tira “o ministério da agenda cultural” e a audiência no Congresso mostrou “um recuo tático na forma de diálogo”.
Lima diz que é cedo para avaliar o desempenho do ministro na segurança pública e elogia a iniciativa de propor uma PEC para discutir o Susp, vista como fundamental por ele.
Procurado, o Ministério da Justiça afirmou que uma das principais diretrizes do ministro é integrar os atores que compõem a segurança pública para formular políticas públicas.
A pasta destaca a ideia de mudar a Constituição como contraponto à ideia de que Lewandowski eximira a União de responsabilidades.
Ressalta ainda que o trabalho de inteligência é “prioridade absoluta” e que tem atuado para haver “trabalho integrado” dos agentes de segurança das esferas estadual, municipal e federal para melhorar os índices de segurança pública.
A pasta também ponderou que o ministério repassa verba de quatro fundos a estados e municípios e tem organizado oficinas e outras iniciativas para os gestores responsáveis por esse dinheiro.
JULIA CHAIB E MATHEUS TEIXEIRA / Folhapress