‘Quarta Asa’ consegue se tornar fenômeno best-seller mesmo sem inovar

FOLHAPRESS – “Quarta Asa”, romance de fantasia da americana Rebecca Yarros, foi bem-sucedido na intenção de se tornar um best-seller e fez isso ao juntar dois fenômenos comerciais –violência e sexo.

Isso em um contexto de “academia-fantástica”, algo como Hogwarts, onde a protagonista, uma jovem introvertida e aficionada por livros, aprende a se tornar uma guerreira. O enredo não parece ser exatamente inovador. E não é.

Talvez o mais inventivo esteja nos elementos de fantasia, salpicados ao longo do livro, mas centrados na existência de dragões, que ganham papel fundamental no andar da narrativa para muito além de “animais de estimação” ou “meio de transporte”: é deles que emana a magia que existe em Navarra, esse universo ficcional onde, sem um dragão, um guerreiro é apenas uma pessoa comum.

Protagonista e narradora, Violet Sorrengail é uma jovem que se preparou para seguir a carreira de escriba. Mas, por pressão da sua mãe, acaba ingressando na academia de guerreiros, na qual cada reprovação equivale à morte do estudante. É comum em “Quarta Asa” despedir-se de muitos personagens, uma vez que ali mortes são bem triviais.

Como quase todo o livro se passa na academia, o universo de Navarra, sua cultura e sua complexidade não são aprofundados. Ao longo do processo, Violet amadurece e percebe que sua origem como pretensa escriba se torna, na verdade, uma vantagem na busca pelo seu dragão.

Newsletter Tudo a ler Receba no seu email uma seleção com lançamentos, clássicos e curiosidades literárias *** O romance e o sexo também são parte importantíssima do desenvolvimento da personagem, o que é bastante esperado e aponta para o consumo de livros que protagonizam o prazer feminino.

Se antes já percebíamos as relações entre “Quarta Asa” e “Harry Potter” ou “Jogos Vorazes”, não é absurdo lembrar outro fenômeno de vendas que mexeu na estrutura dos romances comerciais: “Cinquenta Tons de Cinza”.

Violet, em muitas circunstâncias, encarna o clichê da personagem que, mesmo com baixas chances de ser bem-sucedida, de alguma forma sempre vence. Some-se a isso a ideia de que os jovens nunca sabem se chegarão vivos ao final da jornada, dando ares de “carpe diem” aos estudantes, o que não se vê tanto nas fantasias comerciais por aí.

Há na escrita de Yarros, ainda que tocada por alguns clichês, uma leveza de quem não se leva tão a sério e tira o máximo de modelos que já se provaram de sucesso.

O que faz de um livro um fenômeno? Apenas o número de exemplares vendidos? Afinal, são títulos de diversos estilos de ficção, especialmente estrangeiros, os que têm procurado entrar na esteira de grandes campeões de vendas de anos passados para encontrar o pote de ouro no fim da tiragem.

A popularidade de “Quarta Asa” pode não ser tão impactante quanto de outros best-sellers que já passaram pelo mercado editorial dos Estados Unidos (e por consequência pelo brasileiro), mas isso não é necessariamente demérito do romance, e sim um reflexo de como as pessoas têm buscado suas próximas leituras dentro de nichos criados nas redes sociais.

O TikTok, em especial, molda o desejo dos jovens leitores pelo livro de Yarros, tornando-o um dos maiores fenômenos da rede e o primeiro de uma trilogia que já está em vias de finalização –o segundo título, em inglês “Iron Flame”, já está publicado. Assim, soluções pouco criativas são relevadas em nome da força do enredo e do romance.

Fenômenos literários são eventos raros, se levarmos em conta a quantidade de livros publicados todo ano, e seguem uma lógica que nem sempre está ligada à qualidade do texto. “Quarta Asa” não traz qualquer novidade ou fôlego criativo para a fantasia como gênero, mas vence pela capacidade da autora de criar reviravoltas e ganchos que prendem quem lê.

QUARTA ASA

Preço: R$ 99,90 (544 págs.); R$ 69,90 (ebook)

Autoria: Rebecca Yarros

Editora: Planeta

Tradução: Laura Pohl

Avaliação: Bom

RAQUEL TOLEDO / Folhapress

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