Abuso emocional na infância aumenta em seis vezes risco de depressão pós-parto

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Ser vítima de abusos emocionais durante a infância pode aumentar em até seis vezes o risco de mulheres desenvolverem depressão pós-parto, aponta estudo publicado nesta segunda-feira (13) na “Revista Latino-Americana de Enfermagem”.

O artigo associou a depressão pós-parto a cinco diferentes tipos de trauma na infância: abuso emocional, negligência emocional, abuso físico, negligência física e abuso sexual. A pesquisa foi feita em conjunto por pesquisadores da UniRV (Universidade de Rio Verde), USP (Universidade de São Paulo) e UFMA (Universidade Federal do Maranhão).

Foram avaliadas, por meio de um questionário, 253 puérperas entre o segundo e o quinto dia pós-parto, em uma maternidade pública de Rio Verde, em Goiás, com filhos nascidos entre fevereiro e abril de 2022. Variáveis como tempo de gestação, cor da pele e idade da puérpera, status de relacionamento, histórico de depressão, número de partos e abortos espontâneos foram consideradas.

Mais da metade das puérperas (52,6%) vivenciou pelo menos um tipo de trauma. O abuso emocional foi o mais comum (34%), seguido de negligência emocional (26%), abuso sexual (23%) e abuso físico (18%).

Os resultados sugeriram uma associação entre as diferentes formas de trauma e o desenvolvimento de depressão pós-parto, que foi comum a 37% das mulheres (93).

A exposição a abuso emocional foi o tipo de trauma na infância que gerou maiores chances de desenvolvimento de depressão pós-parto, em comparação às mulheres que tiveram a condição e não sofreram o abuso.

O abuso emocional é caracterizado por experiências de rejeição, agressão verbal, isolamento ou provocação, de acordo com o artigo.

Já a exposição à negligência emocional na infância resultou em riscos três vezes maiores de depressão pós-parto, assim como o abuso físico (2,91 vezes). A negligência física e o abuso sexual dobraram os riscos de desenvolvimento da condição.

“Esse é um dos primeiros estudos com essa associação em contexto brasileiro. Estudos anteriores foram feitos em países desenvolvidos, que não se assemelham em relação às características demográficas com a população brasileira”, afirma Elton Brás, professor titular da Faculdade de Enfermagem da UniRV, em Goiás.

Brás lembra que a prevalência de depressão pós-parto no estudo pode ter sido, ainda, influenciada pelo período de coleta de dados, que coincidiu com a pandemia de Covid-19. A literatura tem indicado piores índices de saúde mental durante o período, diz o estudo.

Segundo Edilaine Gherardi-Donato, professora titular da Escola de Enfermagem da USP em Ribeirão Preto, quando a mulher passa por uma situação de trauma, ela acaba sofrendo os impactos dessa experiência em níveis psicológicos e fisiológicos.

“Temos vários processos que são naturais do corpo, para que possamos regular o nosso sistema e responder aos próximos eventos estressores. Quando esses eventos são muito fortes ou prolongados, esses mecanismos se desregulam. Então, na vida adulta, essa mulher fica mais predisposta a se estressar com as situações, fica com menos recursos psicológicos para lidar com essas situações na vida adulta, e tem um maior risco para a depressão”, diz.

A gestação é um evento de vida que pode gerar uma crise emocional, um sentimento de mudança de papéis e um nível de estresse, afirma ela. Se já há uma predisposição ou um histórico, as chances de que a mulher vivencie essa fase da vida de forma mais intensa são maiores.

A depressão pós-parto afeta 1 em cada 5 mães de recém-nascidos no mundo, mas apenas 10% recebem cuidados baseados em evidências. No Brasil, o transtorno afeta 1 em cada 4 mães, segundo dados da Fiocruz.

De acordo com os pesquisadores, o estudo aponta que o trauma na infância é um indicador para os profissionais de enfermagem rastrearem fatores de risco de depressão pós-parto durante o acompanhamento obstétrico.

“Os resultados contribuem para uma assistência que vai além do olhar clínico e vai considerar experiências de vida que foram traumáticas para essas mulheres e o quanto elas têm peso no desenvolvimento de transtornos mentais. Essa mudança de paradigma na assistência pré-natal pode prevenir o surgimento de doenças que podem interferir na saúde da mulher e na relação dela com seu filho”, afirma Maria Neyrian Fernandes, professora-adjunta de Enfermagem da UFMA.

LUANA LISBOA / Folhapress

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