SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A remoção do vermelho dos pilares do Masp, no contexto das reformas que ocorrem no museu desde abril, muda o cenário do cartão postal da avenida Paulista.
O cinza pode causar estranhamento, mas o Masp, inaugurado em 1968, exibiu uma fachada sem tinta por mais de 20 anos, remetendo ao projeto original da arquiteta Lina Bo Bardi. Foi só em 1991 que ganhou o detalhe em vermelho vivo.
O museu do bairro da Bela Vista não é o único edifício de São Paulo a acumular mudanças de visual e estrutura ao longo da história.
Abaixo, veja uma lista de construções da capital que guardam surpresas arquitetônicas para quem passa com pressa.
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COPAN E O HOTEL QUE NÃO FOI
O edifício Copan, projeto de Oscar Niemeyer finalizado por Carlos Lemos, fica localizado no centro da cidade e chama atenção por seu formato de “S”. A obra começou em 1952 e só terminou em 1966, com várias interrupções e troca de empresas envolvidas.
O projeto original previa um edifício residencial de 30 andares e outro que abrigaria um hotel com 600 apartamentos. Os dois prédios deveriam ser ligados por uma marquise no térreo que teria garagens, cinema, teatro e comércio, mas apenas o edifício residencial foi construído.
A quantidade de apartamentos do projeto original do Copan também foi alterada durante a obra, indo de 900 para 1.160, com a conversão de algumas unidades maiores em quitinetes.
MARTINELLI NAS ALTURAS
A construção do edifício Martinelli, também na região central, foi encomendada pelo empresário italiano Giuseppe Martinelli.
A obra começou em 1924 e, em 1929, o prédio foi inaugurado com 12 andares. Mas, na disputa para se tornar o mais alto da América Latina, passou de 12 para 14, depois 18 e, em 1928, alcançou 24 pavimentos.
O objetivo de Martinelli era chegar a 30 andares. Para isso, construiu uma nova residência no topo do prédio, atingindo o feito em 1934.
Diversos imprevistos prolongaram as obras entre eles, a danificação de estruturas de um prédio vizinho, problema abafado com a compra do prédio pelo próprio empresário italiano.
“Se você continua a construir andares, vai deixando a estrutura mais pesada, processo há muitos anos totalmente fora das normas técnicas e preceitos de boa construção. Não é algo comum nem recomendado”, diz Marcos Costa, coordenador do curso de arquitetura na Fundação Armando Alvares Penteado, a Faap.
CENTRO HISTÓRICO EM OCRE E SALMÃO
Os edifícios 148 e 184 do Pátio do Colégio foram projetados por Francisco de Paula Ramos de Azevedo e inaugurados no final do século 19 para abrigar as secretarias da Agricultura e da Fazenda e do Tesouro. A secretaria da Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo os ocupa desde 1997.
Obras recentes mostraram que diferentes cores estavam escondidas sob várias camadas de tinta nas paredes. A raspagem de uma pilastra do prédio mostrou uma paleta de cores que representam uma tendência em prédios de cada época, segundo o restaurador Julio Moraes.
“O ocre e o rosado eram comuns no final do século 19 porque vinham do mesmo pigmento. Se formos estudar antigas escolas públicas, a tendência é a mesma”, diz.
DE FÁBRICA DE TAMBORES A ESPAÇO CULTURAL
A área ocupada pelo Sesc Pompeia já foi uma fábrica de tambores, construída em 1938 pela Mauser & Cia e comprada em 1945 pela Ibesa que lá instalou a indústria de geladeiras Gelomatic.
A conversão para espaço cultural conduzida por Lina Bo Bardi ocorreu entre 1977 e 1982.
Elementos da antiga fábrica permaneceram, como tijolos sem revestimento, tubulações aparentes, detalhes em ferro e telhado visível. Os rebocos foram retirados e as paredes receberam a aplicação de jatos de areia.
A readequação das estruturas da fábrica foi finalizada em 1982. Em 1986, o complexo foi aberto por completo, com mais dois novos prédios construídos, um em cada margem do córrego da Água Preta.
CASA DE DONA YAYÁ
Situada no bairro do Bixiga, a casa do final do século 19 abrigou Sebastiana de Melo Freire, conhecida como Dona Yayá. A aristocrata acumulou vasta herança após perder pais e irmãos, desenvolveu problemas mentais e se tornou incapaz de administrar a própria fortuna versão contestada por alguns estudiosos.
A casa se tornou símbolo da opressão de gênero e trato estigmatizado à saúde mental, acumulando várias reformas durante os 40 anos em que a herdeira lá viveu.
“Ela não quis um casamento arranjado, desafiando os padrões da época. Foi considerada louca e impedida de gerir o próprio dinheiro. A casa mostra como ela se transformou em refém”, diz o arquiteto e urbanista Fernando Atique.
Dona Yayá passou a vida em quartos com janelas que só abriam do lado de fora e seu único acesso ao ar livre era por meio de um solário, construído em 1952. Morreu em 1961, aos 74 anos, sem herdeiros.
Em 1968, sua herança foi considerada vacante e todos os seus bens foram transferidos para a USP.
LAURA A. INTRIERI / Folhapress