BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai editar uma MP (medida provisória) que restringe o uso de créditos tributários do PIS/Cofins como compensação para bancar a desoneração da folha para empresas de 17 setores e de municípios até 156 mil habitantes. O Ministério da Fazenda batizou a medida de MP do equilíbrio fiscal.
Como mostrou a Folha de S.Paulo na semana passada, a proposta foi apresentada pelo governo na semana passada a algumas lideranças do Congresso Nacional. O governo espera arrecadar até R$ 29,2 bilhões com a medida em 2024.
O valor é mais do que suficiente para compensar a perda de arrecadação de R$ 26,3 bilhões estimada pelo Ministério da Fazenda com a desoneração da folha (R$ 15,8 bilhões das empresas e R$ 10,5 bilhões dos municípios).
A medida do governo atua em duas frentes. Em uma delas, o governo vai restringir o uso de créditos tributários de PIS/Cofins, obtidos pelo recolhimento do tributo na aquisição de insumos. Hoje, eles podem ser usados para abater o saldo devedor de outros tributos -inclusive contribuições à Previdência. A prática é chamada de compensação cruzada.
Com a MP, o aproveitamento do crédito só será permitido para abater o próprio PIS/Cofins. A mudança tem potencial para elevar a arrecadação em até R$ 17,5 bilhões neste ano, segundo a Fazenda.
Na segunda frente, o governo vai restringir o uso do crédito presumido do PIS/Cofins, uma espécie de benefício fiscal concedido com a intenção de fomentar algumas atividades econômicas e mitigar o efeito cumulativo dos impostos.
Segundo a Fazenda, as leis mais recentes já vedam o ressarcimento desse crédito em dinheiro como forma de impedir a tributação negativa –o contribuinte não só não recolhe tributos, mas ainda recebe um valor do governo, como uma espécie de subvenção financeira.
No entanto, há ainda oito casos em que esse ressarcimento é permitido. Em 2023, eles pleitearam o recebimento de R$ 20 bilhões, de acordo com a Receita Federal. A MP fecha a porta para esses oito casos.
Segundo a Fazenda, os contribuintes continuarão a poder usar os créditos presumidos, desde que haja tributo a ser pago e abatido. Essa medida deve acrescentar outros R$ 11,7 bilhões à arrecadação federal.
A medida foi anunciada nesta terça-feira (4) pelo ministro interino da Fazenda, Dario Durigan, e o secretário especial da Receita Federal, Robinson Barreirinhas.
O ministro Fernando Haddad (Fazenda) está em Roma, onde se reúne com o Papa Francisco para pedir apoio à proposta do governo brasileiro no G-20 de taxação dos super-ricos. O Brasil ocupa neste ano a presidência do G-20.
No anúncio da MP, a equipe econômica destacou que a medida corrige distorções do sistema tributário brasileiro, sem elevar a alíquota dos tributos e prejudicar os contribuintes menores.
O diagnóstico da equipe da Fazenda é que essas distorções com as brechas na legislação têm permitido que arrecadação de alguns setores com o PIS/Cofins seja praticamente nula ou até mesmo negativa, enquanto outras atividades carregam o ônus da tributação.
Dados apresentados pelo Ministério da Fazenda apontam que, para esses setores beneficiados, a alíquota real (efetivamente paga) tem ficado abaixo de 1%. A alíquota nominal do PIS/Cofins incide por duas sistemáticas: não cumulatividade (9,25%) e o modelo cumulativo (3,65%).
A restrição do uso dos créditos também tem a vantagem de não precisar respeitar a chamada noventena, prazo de 90 dias entre a edição de medida que eleva um imposto e a efetivação da cobrança sobre os contribuintes. Ou seja, os impactos sobre a arrecadação tendem a ser imediatos.
Além disso, PIS e Cofins são contribuições sociais, cujo produto da arrecadação não é dividido com estados e municípios. Isso significa que a União vai absorver todo o ganho esperado com a medida.
A desoneração da folha das empresas foi criada em 2011, na gestão Dilma Rousseff (PT), e prorrogada sucessivas vezes. A medida permite o pagamento de alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, em vez de 20% sobre a folha de salários para a Previdência.
A desoneração vale para 17 setores da economia. Entre eles está o de comunicação, no qual se insere o Grupo Folha, empresa que edita a Folha de S.Paulo. Também são contemplados os segmentos de calçados, call center, confecção e vestuário, construção civil, entre outros.
No caso dos municípios, a desoneração foi aprovada pelos parlamentares em 2023, vetada por Lula e reinstituída pelo Congresso a partir da derrubada do veto. O governo editou uma medida provisória para revogar o corte nas alíquotas para 8%, mas sofreu resistências e precisou fechar um acordo para manter a cobrança reduzida em 2024.
ENTENDA AS NOVAS REGRAS
CRÉDITO DO PIS/COFINS EM GERAL
Serão compensáveis apenas na sistemática da não cumulatividade, sem compensação com outros tributos ou cruzada, exceto com débitos do próprio PIS/Cofins. Mantém-se a possibilidade de ressarcimento em dinheiro, mediante prévia análise do direito creditório.
CRÉDITO PRESUMIDO DE PIS/COFINS
Espécie de benefício fiscal concedido a empresas. Leis mais recentes já vedam o ressarcimento em dinheiro, impedindo a tributação negativa ou subvenção financeira para setores contemplados, mas em oito casos a autorização permanecia.
A MP estende a vedação ao ressarcimento para os oito casos que permaneceram e que representaram R$ 20 bilhões pleiteados em 2023. Não se altera a possibilidade de compensação na sistemática da não cumulatividade, ou seja, o direito permanece, desde que haja tributo a ser pago pelo contribuinte.
ADRIANA FERNANDES E IDIANA TOMAZELLI / Folhapress