SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Seria o casamento uma instituição falida? Não para H e M, os personagens de Fabio Assunção e Drica Moraes na peça “Férias”, que estreia no Teatro Procópio Ferreira nesta sexta-feira (7). Para comemorar seus 25 anos de união, eles recebem de presente dos filhos um cruzeiro até o Caribe.
Mas, graças à sua compulsão sexual, o casal se comporta como um par de adolescentes, fazendo sexo nas áreas públicas do navio sem nenhum pudor, até que, flagrados pelas câmeras de segurança, são gentilmente convidados a desembarcar em uma praia colombiana. Lá, são obrigados a dividir um apartamento com um casal de mochileiros, que vive com o dinheiro faturado com sexo online.
“Não sei o que é ficar 25 anos casado e acho que nunca saberei. Eu tenho inveja desses que conseguem, que são felizes”, diz Assunção, aos 52 anos, que viveu dois enlaces. “Meus casamentos foram catastróficos. Ou quase. Casamento é algo difícil, muito pessoal. A minha vida também nunca teve uma rotina. Acredito que o casamento demanda uma certa estabilidade de agenda. Mas é muito difícil.”
No ano passado, ele passou 65 dias no Ceará filmando “Motel Destino”, thriller erótico de Karim Aïnouz que concorreu à Palma de Ouro no Festival de Cannes. Já para essa peça, Assunção ficou um mês e meio ensaiando no Rio de Janeiro. “Quando estou trabalhando, entro em imersão profunda, quase não uso o celular.”
O questionamento também é feito por Drica Moraes, que, com o espetáculo, comemora 40 anos de carreira. “Já passei por dois ótimos casamentos, que é uma eterna renovação de voto. Você tem que sempre se perguntar se está valendo a pena, por que vale a pena e como vale a pena”, afirma a atriz de 54 anos que hoje prefere apenas namorar.
“A grande sacada da peça escrita pelo Jô Bilac é que esse casal é extremamente criativo, pois inventa a realidade, e a dramaturgia usa os atores como autores da própria história. Os personagens estão sempre reescrevendo uma nova narrativa para a própria vida, como em um teatro.”
Dirigida pelos também atores Enrique Diaz e Débora Lamm, “Férias” tem todos os papéis divididos entre Drica e Assunção. “Como se trata de uma comédia, é um grande exercício estilístico para os dois que têm total domínio do humor”, afirma Diaz.
Assim, eles também interpretam o capitão do cruzeiro, a dona do apartamento do Airbnb, e X e Y, os jovens colombianos que desafiam os brasileiros a participarem do negócio. Como querem aproveitar a vida, H e M se metem em outra enroscada. Resultado: vão parar na delegacia.
Drica buscava um texto leve para festejar as quatro décadas de carreira, especialmente depois de enfrentar papéis sombrios como Lúcia, a síndica corrupta da minissérie “Os Outros”, do Globoplay. “Não trocamos de figurino, nem usamos perucas ou bigodes. É só na fisicalidade. O espetáculo é muito verbal e também muito físico”, conta Drica.
“O que mais gosto é que se trata de um casal que gosta do contato da pele, comprovando que o amálgama afetivo, sanguíneo, não cabe na tela de um computador.”
Drica sentia uma forte necessidade de voltar ao palco. Em 2010, logo após fazer 40 anos, descobriu uma doença grave e rara, a leucemia mieloide aguda. A atriz fez quimioterapia, perdeu os cabelos e esperou meses por um doador de medula óssea.
“Nesta última terça-feira, faz 14 anos que fiz o transplante, como se fosse o plantio de uma sementinha”, diz, emocionada. O fato reordenou sua carreira. “Passei a ter mais consciência dos meus limites e das minhas potências. Agora, faço escolhas mais pensadas sobre qual trabalho posso pegar, qual carga horária estou disposta a enfrentar.”
Assunção também enfrentou problemas ligados à saúde. Em 2008, ele se internou para tratar do vício em cocaína e abuso de álcool, e teve uma recaída que se tornou pública em 2017. “Eu preferia não ter passado por esses momentos, mas agora vejo como algo positivo. Tive muitos ganhos pessoais como desenvolver um autoconhecimento que me permite investigar e entender meus limites”, diz o ator, que acredita ter falhado na tentativa de ser discreto em relação à vida pessoal.
“Sempre houve muita exposição, intromissão na minha vida. Minhas relações ficam expostas. É como se a sociedade também participasse da sua vida. Busco hoje realmente separar a pessoa física da jurídica. Preservar mesmo o namoro, os filhos.” Mesmo assim, portais noticiaram com alarde nesta semana o fim de seu último breve relacionamento com a atriz Isa Salmen.
Sem querer comentar sobre o tema, Assunção ressalta a importância de sua participação em “Férias”, pois H está na mesma faixa etária dos 50 anos. “Ele e a mulher não são mais jovens, mas também ainda não são velhos. É o momento de maior lucidez da vida para se fazer escolhas, quando se aprende a fazer o cálculo”, afirma.
“Lido com mais tranquilidade com os perrengues do cotidiano, vejo que as coisas se assentaram. Até o fato de ter a vida exposta, que interfere diretamente na personalidade dos meus filhos, até nisso encontro um lado positivo. Acredito que isso aumenta a admiração dos meus filhos por mim e a minha por eles.”
UBIRATAN BRASIL / Folhapress