PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – Mais de um mês após o nível do lago Guaíba atingir a máxima histórica de 5,33 metros e paralisar Porto Alegre, o recuo do alagamento e o retorno de serviços permite um ensaio de volta à rotina na capital gaúcha.
O acesso à cidade já foi liberado, e os três corredores humanitários já foram removidos. As operações de limpeza já tiraram mais de 48 mil toneladas de resíduos das ruas, e o trânsito se normalizou nas principais vias.
A rodoviária voltou a funcionar, assim como estações de tratamento de água e o comércio em muitos bairros afetados. Entretanto, todos esses retornos são parciais: menos horários, menor capacidade, e limitados a lugares já higienizados. O aeroporto do município deve seguir fechado ao menos até dezembro.
Segundo o secretário municipal de serviços urbanos Assis Arroyo o foco no momento é “o levantamento dos problemas maiores, agora que a água baixou”.
“São 380 equipamentos fazendo a limpeza na rua, muito material inservível que os moradores colocaram nas ruas, mas estamos avançando em todos os bairros”, disse.
Os terminais da região do centro histórico, um dos bairros mais afetados, já estão em operação novamente. Ainda assim, as restrições de transporte e os estragos nos empreendimentos privados dificultam a retomada.
“Tivemos cerca de 45 mil CNPJs atingidos pelas enchentes”, disse a vice-presidente da ACPA (Associação Comercial de Porto Alegre) Julia Evangelista Tavares. Ela diz que alguns bairros já estão retornando às atividades, como Menino Deus e Cidade Baixa.
Para Tavares, que também é secretária de Desenvolvimento Econômico de Porto Alegre, há um impacto emocional da enchente. “O grande empecilho acredito que é o receio das pessoas de circular, muitas pessoas atingidas psicologicamente”.
Enquanto bairros do centro de Porto Alegre retomam a rotina mais rapidamente, a zona norte e as ilhas do município concentram a maior parte dos problemas de serviços ainda interrompidos.
Das 14 unidades de saúde fechadas na cidade, 12 estão nessas regiões. Também ficam nelas o maior número de casas afetadas, de pessoas fora de casa e de desafios para a volta das atividades diárias.
As áreas também têm o maior número de escolas fechadas. A Secretaria Municipal de Educação disse que das 318 unidades escolares da cidade, 42 ainda estão fechadas, sendo 14 escolas próprias, 27 conveniadas e uma que está funcionando como abrigo para desabrigados.
“A limpeza iniciou em 32 unidades. Nenhuma voltou a funcionar ainda, e não há previsão do retorno”, disse a pasta em nota.
A região das ilhas finalmente teve o abastecimento de água retomado, com a religação da ETA (Estação de Tratamento de Água) Ilha da Pintada, a última estação ainda inoperante na cidade, neste sábado (8). Entretanto, muitos moradores ainda não podem voltar para suas casas.
A região das ilhas tem cota de inundação 80 centímetros menor do que o resto da cidade, e um dos maiores desafios é a locomoção na área.
“Tem ruas com 2 metros de areia em cima da via. Estamos lá, junto com a Marinha, equipes terceirizadas e nossas equipes próprias, removendo a areia das ruas para tentar voltar à normalidade”, disse Arroyo.
A EPTC (Empresa Pública de Transporte e Circulação) informou em comunicado que, devido ao comprometimento da malha viária especialmente nos bairros Anchieta, Humaitá, 4º Distrito e região das ilhas, algumas linhas ainda estão com desvios ou mudanças de rota para poder funcionar.
A oferta de transporte coletivo atualmente está em 94% para uma demanda de passageiros de 82,6% em comparação ao período anterior às enchentes.
Oito linhas de ônibus continuam desativadas temporariamente, todas na zona norte. Duas linhas são circulares da madrugada, duas são alimentadoras (que fazem ligação de bairros com corredores de ônibus) e outras quatro nas proximidades do aeroporto e bairro Humaitá.
Além dos danos na zona norte, um dos desafios é a recuperação das praias na zona sul da cidade. Em Ipanema, a enchente danificou o calçadão da orla. A água também causou danos no bairro Lami, onde a força do Guaíba formou ondas de quase 1,5 metro e atrapalhou operações de resgates de moradores.
“Os problemas maiores são próximos ao rio onde a água subiu e teve correnteza”, diz Arroyo. “Onde não houve muita correnteza, são danos localizados, e alguns problemas da rede de drenagem, que acaba erodindo com os problemas de muita vazão”.
Entretanto, segundo o secretário, ainda é preciso seguir as avaliações para saber a extensão real do prejuízo. “Estamos levantando esses problemas ainda, não dá para dar um panorama de tudo que foi danificado. Cada dia a gente está vendo cada local”.
CARLOS VILLELA / Folhapress