LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS) – Em uma eleição marcada pelo avanço da ultradireita, a bancada verde do Parlamento Europeu perdeu um quarto de seus deputados, caindo de 71 para 52 assentos, segundo as projeções oficiais mais recentes.
A nova configuração da Casa, que tem agora 720 representantes (15 a mais do que no último pleito), pode dificultar o andamento das medidas ambientais da União Europeia.
No último escrutínio do bloco, em 2019, as preocupações ambientais estavam em alta no velho continente, com os protestos da jovem ativista sueca Greta Thunberg ajudando a impulsionar a agenda climática. Nesse cenário, as legendas ambientalistas conquistaram seu melhor resultado da história, tornando-se a quarta força política em Estrasburgo.
Embora pesquisas de opinião indiquem que as mudanças climáticas sigam entre as principais preocupações dos europeus, outros temas têm dominado a agenda pública no continente.
A guerra entre Rússia e Ucrânia, a inflação recorde, a pandemia de Covid-19 e o aumento dos custos da energia parecem ter contribuído para a perda do fôlego eleitoral dos ecologistas.
Como quase tudo na União Europeia, os resultados tiveram grande variação entre os 27 países que integram o bloco. O destaque, contudo, foi a queda expressiva dos verdes na Alemanha e na França, os dois países com maior número de representantes no Parlamento Europeu respectivamente, 96 e 81 deputadose onde eles historicamente tinham bom desempenho.
Na França, onde o partido de ultradireita Reunião Nacional (RN) venceu com mais de 30% dos votos, os ecologistas tiveram o pior resultado em 30 anos: cerca de 5,5% da preferência nas urnas, ficando com 5 assentos parlamentares. Em 2019, eles obtiveram 13,4% e elegeram 12 deputados.
Na Alemanha, onde os verdes integram a coalizão que sustenta o governo do chanceler Olaf Scholz, eles obtiveram 12,5% dos votos, contra os 20,5% conquistados há cinco anos.
Para os ecologistas alemães, questões da política doméstica podem ter sido decisivas, já que o grupo foi alvo de críticas por ter concordado com a reabertura de usinas a carvão após invasão da Ucrânia pela Rússia.
Vice-presidente do grupo dos Verdes/Aliança Livre Europeia, o eurodeputado Bas Eickhout reconheceu o resultado desfavorável nos dois maiores partidos da UE, mas argumentou que houve também vitórias para os ecologistas.
Entre as boas notícias para o grupo estão um crescimento na Suécia e na Holanda, país de Eickhout, onde uma coalizão entre ecologistas e a esquerda ficou em primeiro lugar.
“As perdas na Alemanha e na França são obviamente um golpe, mas, ao mesmo tempo, em muitos países os eleitores reconheceram as soluções dos Verdes e elegeram eurodeputados de partidos verdes em nações onde eles nunca haviam sido escolhidos para Parlamento Europeu”, afirmou.
A redução da bancada verde, em paralelo ao crescimento da ultradireita, tem gerado temores sobre o futuro da agenda verde na União Europeia, que na última legislatura aprovou, entre outras coisas, uma série de medidas voltadas à descarbonização, transição energética e redução do uso de plástico.
“Todas as novas políticas serão mais difíceis de serem aprovadas. Mas é muito improvável que haja retrocessos”, disse Krzysztof Bolesta, secretário de Estado para o clima da Polônia, em declaração à Reuters.
Ainda que muitas das medidas ambientais não possam ser modificadas, os novos eurodeputados irão decidir sobre as futuras ações da agenda climática do bloco europeu, incluindo as ações a serem tomadas para atingir o compromisso com a neutralidade de carbono até 2050.
Ainda durante a campanha, representantes de vários países manifestaram o desejo de rever pontos do Acordo Verde Europeu, o principal pacote de políticas ambientais do bloco.
Um dos alvos principais provavelmente será a proibição, a partir de 2035, de novos carros movidos a diesel ou gasolina. Essa medida que já foi abertamente criticada por diversos políticos, incluindo a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni tem uma cláusula de revisão em 2026.
A agenda ambiental europeia, no entanto, já dava sinais de enfraquecimento antes mesmo das eleições. No início de 2024, pressionada pela eclosão de protestos de agricultores em vários Estados-membros, a Comissão Europeia, o braço executivo da UE, fez uma série de concessões ao setor.
Embora a agricultura seja responsável por apenas 1,4% do PIB (Produto Interno Bruto) da UE, a atividade conta com grande capital político e social no continente.
Em meio aos protestos, a comissão abandonou um plano de redução do uso de pesticidas, concedeu isenção temporária para as exigências de “descanso” de parte do solo entre as culturas e retirou o projeto de redução de 30% de emissões de gases-estufa em relação aos níveis de 2015 do setor da agricultura.
Em maio, ao defender a “reindustrialização” da França, o presidente Emmanuel Macron, pediu que a União Europeia faça uma pausa na imposição de novos regulamentos ambientais.
Segundo o líder francês, os europeus já fizeram “mais do que todos os vizinhos” pelo ambiente e agora o bloco “precisa de estabilidade”.
Destacando que a Europa é o continente com o ritmo de aquecimento mais rápido no planeta, ativistas ambientais têm afirmado que irão pressionar os novos representantes do Parlamento Europeu pela implementação de uma agenda climática ambiciosa.
“Esta eleição não tornará a crise climática e da natureza menos existencial. Inundações, secas e ondas de calor só vão piorar, e todos os políticos recém-eleitos terão que agir para manter a capacidade do nosso planeta de sustentar a vida e dar um futuro aos nossos filhos”, disse Ariadna Rodrigo, do Greenpeace na Europa. “Independentemente de quem estiver no poder, vamos responsabilizá-los.”
GIULIANA MIRANDA / Folhapress