SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O antissemitismo disparou no Brasil ano passado após os ataques terroristas do Hamas a Israel em 7 de outubro seguidos de contraofensiva israelense na Faixa de Gaza e se mantém elevado em 2024. Desde então, as denúncias aumentaram mais de sete vezes. Foram registradas 2.005 queixas do início do conflito até maio deste ano, ante 275 no mesmo período anterior, uma alta de 630%.
Os dados compilados em um relatório foram apresentados pela Conib (Confederação Israelita do Brasil) e pela Fisesp (Federação Israelita do Estado de São Paulo) na manhã desta terça-feira (11), durante evento no Clube Hebraica, em São Paulo, com a presença dos presidentes das entidades, respectivamente, Claudio Lottenberg e Marcos Knobel.
As informações, coletadas em canal de denúncias administrado pelas instituições, comparam ainda todo o ano de 2023 com o de 2022, quando houve 1.410 reclamações contra 397, um aumento de 255%. Somente de 1º de outubro a 31 de dezembro passado, houve 1.119 denúncias, ante 125 no mesmo período de 2022 (800%).
Para Lottenberg, esses números são alarmantes. “Divulgar esses dados é fundamental. Não podemos conviver com a intolerância.” “Esse é um momento de dor para o povo judeu, desde o dia 7 de outubro. O discurso do ódio jamais deixou de existir, ele só estava latente”, declarou.
Lottenberg diz ainda que a mídia social exacerba essa situação, permitindo que pessoas desinformadas propaguem antissemitismo. Segundo o presidente da Conib, há uma banalização e utilização imprópria do conflito por influenciadores digitais e “declarações esdrúxulas” de autoridades que têm “alimentado a intolerância e o ódio, algo que não víamos antes.”
O relatório destaca uma fala do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 18 de fevereiro, como um dos motivos para o aumento de atos antijudaicos. Na ocasião, o petista disse que as ações militares de Israel na Faixa de Gaza se comparavam a “quando Hitler resolveu matar os judeus” na Segunda Guerra Mundial, em referência ao Holocausto embora Lula tenha dito posteriormente que não citou o termo em sua frase, para afirmar que não quis fazer tal associação.
As declarações abriram uma nova crise diplomática com o governo israelense, que convocou o embaixador brasileiro em Tel Aviv para uma “chamada de reprimenda”. Desde então, a embaixada de Israel não tem um representante, e o governo Lula não deve indicar substituto até que a guerra termine e que o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu saia do poder.
No recorte do ambiente virtual, afirma o relatório, as agressões contra os judeus aumentaram 419% em 2023 em relação ao ano anterior, saltando de 202 para 1.048. No mesmo período, foram registradas 42 incidentes verbais e cinco agressões físicas, enquanto em 2022 houve um incidente de cada tipo.
As plataformas Instagram e X concentram o maior número de denúncias, 43% e 32%. Essas queixas revelam picos de interações online de cunho antissemita, segundo o relatório, quando autoridades públicas ou influenciadores expressam ideias consideradas anti-Israel.
Um trecho do levantamento lembra casos como o da chilena suspeita de atacar comerciante judia de Arraial dAjuda, em Porto Seguro (BA), em fevereiro, antes da fala de Lula, e de alunos de escola de elite Beacon School, em São Paulo, que em março teriam ofendido um colega de turma que é de família judaica.
Fora das redes sociais, as instituições relatam que o preconceito contra judeus se manifesta, também, em locais públicos e próximos a sinagogas, além de pichações, cartazes antijudaicos e nazistas, e a distribuição de materiais que promovem o antissemitismo. Essas ocorrências aumentaram 86% após 7 de outubro, aponta o relatório.
Para Marcos Knobel, da Fisesp, a educação é a chave para combater o antissemitismo, quer seja nas universidades ou nas escolas. “Vamos às universidades levantar problemas de intolerância aos judeus e para levar nosso ponto de vista, e isso tem ajudado a reduzir a visão antissemita. Mas também é preciso agir na base, que são as escolas, em especial as não judaicas, onde houve relatos de antissemitismo. Só assim conseguiremos um mundo sem antissemitismo, sem racismo, um mundo melhor.”
Em novembro passado, logo após o início da guerra Israel-Hamas, a Conib apresentou dados que mostravam que as denúncias de antissemitismo no Brasil haviam aumentado dez vezes de outubro de 2022 em comparação com o mesmo mês do ano passado, indo de 44 para 467.
De acordo com o relatório, atos considerados antissemitas incluem, entre outros, negar a existência do Holocausto, seu alcance ou seus efeitos, ou que sua intenção fosse cometer um genocídio contra os judeus; reproduzir estereótipos como os de que judeus controlam a mídia ou a economia; e usar símbolos historicamente associados ao antissemitismo, como a suástica nazista.
A depender do contexto, as ações podem ser tipificadas como diferentes crimes no Brasil, como incitação ou indução a preconceito, crime de ódio ou mesmo racismo.
Segundo a Liga Antidifamação (ADL, na sigla em inglês), entidade americana que monitora crimes de ódio, também se enquadram na categoria de antissemitismo manifestações de antissionismo, isto é, negar o direito dos judeus de ter seu próprio Estado ou, alternativamente, responsabilizá-los coletivamente por decisões tomadas pelo Estado de Israel.
Outro relatório divulgado em maio expôs a escalada do antissemitismo no Brasil, com dados da Universidade de Tel Aviv e da ADL. Segundo o levantamento, o número de casos quadruplicou no país em 2023 em comparação com o ano anterior. A maioria das nações analisadas registrou um aumento de ocorrências, em especial Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, França e Austrália.
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O QUE É CONSIDERADO ANTISSEMITISMO?
Definições retiradas de publicação do Instituto Brasil-Israel (IBI)
1 – Negar a existência do Holocausto, seu alcance ou seus efeitos, ou que sua intenção fosse cometer um genocídio contra os judeus
2 – Reproduzir estereótipos como os de que judeus controlam a mídia ou a economia
3 – Usar símbolos historicamente associados ao antissemitismo, como a suástica nazista
4 – Manifestações de antissionismo, isto é, negar o direito dos judeus a ter seu próprio Estado
5 – Responsabilizar judeus coletivamente por decisões tomadas pelos governos de Israel
6 – Atacar e/ou prejudicar fisicamente um judeu em razão de sua relação com Israel
7 – Tratar Israel de forma diferente apenas porque ele é um Estado judeu
TATIANA CAVALCANTI / Folhapress