CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) – O Ministério Público do Paraná disse nesta terça-feira (11) que vai investigar o vídeo que foi enviado pela Secretaria de Estado da Educação a pais de alunos da rede pública de ensino com conteúdo crítico à greve dos professores e com ataques à APP-Sindicato, entidade que representa a categoria.
O procedimento foi instaurado pela 5ª Promotoria de Justiça de Proteção do Patrimônio Público de Curitiba e o objetivo é “averiguar as circunstâncias do custeio, da produção e do envio” do vídeo.
Procurada nesta terça pela Folha de S.Paulo, a secretaria não se manifestou. Também manteve o silêncio em relação às questões da reportagem sobre o vídeo. A pasta diz apenas que está “apurando os fatos” e que “zela pela transparência”.
A greve dos professores foi aprovada pela categoria em 25 de maio para início em 3 de junho por tempo indeterminado. Ela acabou na noite de quarta (5), após uma forte mobilização da categoria contra o projeto de lei do governador Ratinho Junior (PSD) que cria o programa Parceiro da Escola, principal ponto de insatisfação do movimento grevista.
De acordo com a APP-Sindicato, os disparos em massa do vídeo foram feitos ao menos em duas ocasiões, nos dias 28 de maio e 3 de junho, e partiram do mesmo número usado pela secretaria para comunicados, embora o material não tenha a assinatura da pasta ou do governo estadual.
Em 6 de junho, a pasta admitiu ter feito os disparos “para alertar os pais”, mas não deu detalhes. No dia seguinte, divulgou uma nota em que afirma estar apurando o caso.
O conteúdo do vídeo critica o sindicato e fala de manifestações “partidárias e violentas” que colocariam “seu filho em risco”. Presidente da APP-Sindicato, a professora Walkiria Olegário Mazeto disse que a entidade reagiu ao vídeo com “indignação e preocupação”.
“Num país polarizado politicamente, como vivemos, um conteúdo que criminaliza a luta dos movimentos pode construir na população um ódio a todo tipo de luta dos trabalhadores”, afirmou ela. “O tom e os termos usados criminalizam todos os movimentos”, acrescentou.
A bancada de oposição na Alep (Assembleia Legislativa do Paraná), formada principalmente por deputados do PT, cobra explicações do secretário de Educação, Roni Miranda. O deputado estadual Hussein Bakri (PSD), líder do governo, disse nesta terça que o secretário irá à comissão de educação da Casa falar sobre o assunto, mas ainda não definiu uma data.
O deputado estadual Requião Filho (PT) também cobra a presença de representantes da Paranae ducação, um serviço social autônomo vinculado à Secretaria de Educação. De acordo com o petista, ao menos um dos responsáveis pelo envio do vídeo a pais de alunos seria funcionário da Fapec (Fundação de Apoio a Pesquisa ao Ensino e a Cultura), uma fundação privada com sede em Campo Grande (MS) e que mantém contrato com a Paranaeducação.
De acordo com informações que constam no site da Fapec, o contrato prevê a prestação de serviços técnicos “voltados ao desenvolvimento e execução do Projeto Formadores em Ação Municípios e a implantação do escritório de processos autônomos da Paranaeducação”. O valor do contrato é de R$ 36,8 milhões com duração até abril de 2026.
Em 6 de junho, a pasta disse que um funcionário da Fapec participou do episódio, mas não deu detalhes. Nesta terça, a fundação afirmou em nota que está apurando o caso.
“Quando tomamos conhecimento sobre uma possível participação de um funcionário contratado pela fundação na divulgação do vídeo, deu-se início a ações necessárias para apuração de veracidade. Questionamos diretamente a Seed sobre a ocorrência, solicitando esclarecimento, estando a secretaria ainda em prazo para resposta”, diz a nota.
A Fapec acrescenta que “caso haja indícios concretos [de participação de funcionário]” será instaurado um procedimento administrativo interno para apuração de responsabilidade. Também diz que “prima pela legalidade, moralidade, imparcialidade e transparência de suas ações”.
No vídeo, o narrador explica que se trata de um recado para os pais que se preocupam “dia e noite com o seu filho”.
Em 4 de junho, o governo estadual chegou a pediu a prisão da presidente da APP-Sindicato por supostamente desobedecer a uma liminar que tratava da greve. No pedido, a procuradora do estado, Mariana Carvalho Waihrich, menciona o protesto encabeçado pela APP-Sindicato na Alep e que terminou em confusão, na tarde de 3 de junho.
O ato tinha relação com a votação do projeto de lei sobre o Parceiro da Escola, que permite que a gestão administrativa de escolas seja feita por empresas. A multidão que participava da manifestação forçou a entrada no prédio do Legislativo e foi recebida com bombas de gás lacrimogêneo.
Cinco pessoas tiveram ferimentos leves, incluindo dois policiais militares que faziam a segurança do local. A grade principal do estacionamento foi arrebentada e uma porta de vidro interna também foi quebrada.
A procuradora do estado chamou a mobilização dos professores de “atos antidemocráticos e terrorismo”. Deputados aliados de Ratinho Junior, incluindo o presidente da Alep, Ademar Traiano (PSD), querem a responsabilização de manifestantes.
O projeto de lei, que tramitou em regime de urgência a pedido dos governistas, foi aprovado por ampla maioria na Alep e sancionado logo na sequência pelo governador.
A lei autoriza a transferência a empresas da parte administrativa de mais de 200 escolas. A APP-Sindicato teme interferência de empresas no processo pedagógico e fala em “privatização do ensino público”.
CATARINA SCORTECCI / Folhapress