BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – Com aumentos anuais consecutivos na última década, o número de pessoas forçadas a deixar seus lares por guerras, conflitos, perseguições ou violações de direitos humanos chegou a 117,3 milhões no último ano, informou a Organização das Nações Unidas.
É como se uma a cada 69 pessoas, ou então 1,5% da população global, estivesse nessa situação de deslocamento forçado. Dez anos atrás, essa proporção era de uma pessoa a cada 125 no mundo.
Neste grupo estão incluídos aqueles já reconhecidos como refugiados ou em situação semelhante; aqueles que estão solicitando asilo em outros países; e também aqueles que estão deslocados dentro de seus próprios países, em uma migração doméstica forçada pela violência.
Os novos dados divulgados pelo Acnur, o alto comissariado da ONU para refugiados, reforçam a importância do Brasil como receptor de refugiados. Em toda a América Latina, é o país com mais pessoas refugiadas ou em situação semelhante, como mais de 87 mil haitianos que recebem a chamada autorização de residência humanitária.
Ao todo, são 235,7 mil no Brasil. É um número consideravelmente maior que o observado no México (127,7 mil), país reconhecido no imaginário global como um dos principais destinos de imigrantes que buscam o “sonho americano”, o desejo de chegar aos Estados Unidos.
Ainda que o aumento do número de deslocados não mais surpreenda instituições como o Acnur, dado o crescimento da população global acompanhado de uma multiplicação de conflitos internacionais e domésticos em todo o mundo, alguns fatores chamam a atenção.
Um deles é o tamanho da crise na Venezuela, asfixiada pela ditadura de Nicolás Maduro e que, no dia 28 de julho, deve ir às urnas sob desconfiança de que o pleito não seja democrático e transparente. São mais de 6,1 milhões de refugiados venezuelanos expulsos de seu país pelo definhar econômico ou pela perseguição política.
É um número muito similar ao de um país em guerra civil, como a Síria, ou o Afeganistão, que vive sob o regime fundamentalista do Talibã cada um com 6,4 milhões de refugiados. Se levado em consideração o fato de que há outros venezuelanos que não são reconhecidos como refugiados mas estão em categorias similares, a diáspora desse país sul-americano alcança 7,3 milhões. Muito mais que a de países em guerra.
Em outro continente, na África, o cenário do Sudão causa alarme. Desbancando a Síria, o país se tornou o que tem mais deslocados internos no seu território, fruto do conflito civil que eclodiu há mais de um ano e agravou uma situação já dramática de disputas locais. São mais de 9 milhões de sudaneses forçados a deixar seus lares.
Mais, existem ainda outros 810 mil sudaneses que hoje buscam asilo em países vizinhos, notadamente no Chade, que justamente por isso deu as caras como segundo país que mais recebe pedidos de asilo, atrás dos EUA, sempre na liderança desse ranking.
No Sudão, lembrou o Acnur, a fome generalizada já atinge 20 milhões de pessoas, ou 42% da população local, que enfrentam níveis severos de insegurança alimentar e sem nenhuma perspectiva de melhora.
A ONU chama também a atenção para a situação dos refugiados palestinos um tema histórico na instituição. As Nações Unidas consideram que há ao menos 6 milhões de refugiados palestinos, entendidos como aqueles retirados à força de seu local de origem nos anos 1940, na chamada nakba, e seus descendentes.
No relatório deste ano, o Acnur aponta que ao menos dois terços desses refugiados que vivem na Faixa de Gaza estão atualmente deslocados de suas casas devido à guerra contra o Estado de Israel.
Também a Turquia, que costumeiramente era o país detentor do maior número de refugiados, com um grande volume de sírios, foi agora ultrapassada pelo Irã. É um reflexo não apenas da saída de muitas dessas famílias do país como também do grande volume de afegãos que foram ao país vizinho para fugir do Talibã.
“Por trás desses números crescentes estão incontáveis tragédias humanas”, diz o chefe do Acnur, o diplomata italiano Filippo Grandi, na apresentação dos dados. “Esse sofrimento deve levar a comunidade internacional a agir urgentemente para enfrentar as causas do deslocamento forçado.”
MAYARA PAIXÃO / Folhapress