Liderança do governo no Senado vê PEC que amplia autonomia do BC como inconstitucional

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Um parecer feito pela liderança do governo no Senado afirma que a PEC (proposta de emenda à Constituição) que dá autonomia financeira ao Banco Central é inconstitucional, cria insegurança jurídica para os servidores e coloca em xeque a fiscalização de instituições financeiras.

A nota técnica, obtida pela Folha de S.Paulo, diz que a proposta viola a harmonia e a separação de Poderes (uma cláusula pétrea da Constituição) ao retirar o BC da estrutura administrativa do Executivo e submeter a instituição à supervisão do Congresso Nacional.

Entre outros pontos, o parecer afirma que a proposta é ambígua e gera “incerteza quanto ao regime jurídico” ao criar uma empresa pública com funções incompatíveis com a exploração de atividade econômica, como a emissão de moeda e a gestão de reservas internacionais.

A nota também aponta incerteza jurídica para o funcionalismo. O documento diz que o reenquadramento dos servidores à CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) não tem precedentes e pode gerar impactos indesejáveis para outras categorias do serviço público.

“Há também implicações previdenciárias, uma vez que a migração de regime próprio para regime geral de previdência até poderia manter o tempo de contribuição, mas limitaria a aposentadoria ao teto do INSS”, diz o documento interno.

Outro ponto de preocupação, segundo a liderança do governo no Senado, é a fiscalização do mercado financeiro. Ao transformar o BC em empresa pública, o Congresso pode comprometer o poder da instituição de investigar irregularidades e aplicar multas.

“A transformação do Bacen em empresa pública e, consequentemente, a transformação e/ou contratação de seus funcionários sob o regime da CLT […] pode comprometer de forma muito séria a imparcialidade, segurança jurídica e demais aspectos essenciais ao regular exercício do poder de polícia inerente ao Bacen.”

O parecer também afirma que há inconstitucionalidade por vício de iniciativa, uma vez que a proposta “usurpa” a atribuição privativa do presidente da República de deflagrar o processo de discussão de um tema como este no Legislativo.

“Ao constitucionalizar a autonomia técnica, operacional, administrativa e financeira, acrescentando, ainda, a autonomia orçamentária, a PEC consolida o distanciamento da gestão da política monetária do núcleo dirigente da política econômica e das escolhas democráticas, resultantes das urnas, sobre os melhores projetos políticos de governo.”

Procurada, a liderança do governo no Senado afirmou que o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda não tem posição sobre a PEC e que a nota, elaborada pela assessoria técnica de forma preliminar, está sujeita a alterações.

Apesar do apoio do presidente do BC, Roberto Campos Neto, a PEC enfrenta a resistência de cardeais do Senado, como Omar Aziz (PSD-AM). O líder da União Brasil, Efraim Filho (PB), avalia que a medida está no radar dos senadores, mas não deve avançar a curto prazo.

A proposta ainda não tem data para votação. O relator, senador Plínio Valério (PSDB-AM), esperava ler o parecer na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) na quarta (12), mas o presidente, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), pediu a realização de uma audiência pública antes.

Governistas avaliam reservadamente que Campos Neto tenta imprimir uma marca de sua gestão com a aprovação da PEC. Um aliado de Lula afirma que a postura do presidente do BC nesta semana também pode ter comprometido o avanço das discussões.

Campos Neto sinalizou ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que aceitaria ser ministro da Fazenda dele, como mostrou o Painel S.A. O governador de São Paulo é apontado como possível adversário de Lula nas próximas eleições.

O Sinal (Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central) também intensificou a pressão contra a medida. Sindicalistas protestaram em frente ao Senado na quarta com cartazes escrito “PEC 65 não” e dizem ter visitado todos os gabinetes.

O presidente do Sinal, Fábio Trad, afirma que os defensores da proposta tentaram vender para a opinião pública um sentimento de “já aprovou” que não é verdadeiro. Ele avalia que os senadores começaram a se atentar para eventuais riscos.

“Uma coisa é você ser uma instituição de Estado com autarquia federal dentro da União. A outra coisa é você ser uma empresa pública seletista. Algumas prerrogativas que são exclusivas do poder público são perdidas”, afirma.

Desde que foi apresentada pelo senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), em novembro, a PEC contou com o apoio de Campos Neto. Apesar de ter autonomia assegurada em lei desde 2021, a autoridade monetária não tem autonomia financeira.

A partir da PEC, o Banco Central passaria de autarquia especial para empresa pública de natureza especial, o que daria maior poder sobre o próprio orçamento, como ocorre no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

THAÍSA OLIVEIRA / Folhapress

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