Desabrigados do RS preferem alojamento e moradia provisória a voltar para casa afetada pela cheia

PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – A aposentada Lorena da Cruz Gomes, 66, não vê motivos para retornar para a casa em que vivia, na Ilha das Flores, em Porto Alegre. “Voltar para casa para quê?”, questiona. Ela conta que a casa de aluguel ficou submersa, eletrodomésticos sumiram e ela perdeu o cachorro e o gato.

“Não adianta chorar, descabelar. Paciência, perdi”, continua, dizendo que não chorou por ter perdido roupas de marca ou a cama, mas pelos bichinhos de estimação que não conseguiu salvar da enchente.

Lorena afirma que, se voltar, vai viver com medo a cada chuva. Abrigada no Centro Vida, no bairro Costa e Silva, ela diz que não está ansiosa nem apreensiva em relação ao futuro.

“Eles vão dar uma casinha para nós”, diz a aposentada em referência ao projeto do governo do Rio Grande do Sul com participação da prefeitura que prevê a construção de um pavilhão para desabrigados no campo de futebol do centro. A expectativa é que o local receba até mil pessoas.

Ainda no Centro Vida, Getulio Nery, 67, também aguarda a moradia provisória. “Quero refazer minha vida”, diz o aposentado. Ela conta que escapou do local em que vivia no Sarandi, na zona norte de Porto Alegre, pouco antes de as ruas ficarem cheias d’água.

“Foi horrível. Na verdade, foi pior que horrível”, lembra. Ele, que diz já ter passado por três abrigos desde o início das chuvas, admite que a convivência não é fácil, com barulho, crianças e muita gente no mesmo local, mas aguarda a casa prometida pelo governo para retomar a vida. “Tenho fé que vai dar certo.”

Muitos gaúchos já voltaram para seus lares e tentam retomar a vida enquanto limpam a casa e calculam prejuízos. Nesta quinta-feira (13), porém, o RS ainda tinha 35 mil pessoas em abrigos e 575 mil desalojados.

Em relação às moradias provisórias, o estado afirma que serão construídos cinco abrigos com capacidade para acolher 3,7 mil pessoas —três em Porto Alegre e outros dois em Canoas, na região metropolitana, que reúnem mais de 50% da população desabrigada do Rio Grande do Sul.

As unidades modulares têm formato de tenda, estruturas metálicas e divisórias internas. De acordo com o governo do estado, a infraestrutura prevista é a mesma de hospitais de campanha, por exemplo.

Parte delas é composta por 208 tendas familiares do Acnur, a agência da ONU para refugiados, com capacidade de cinco pessoas por unidade. As demais ainda estão em contratação pela Fecomércio.

Não há prazo definido para que as pessoas vivam nessas moradias. A solução, segundo o governo, é transitória —até que a população receba as moradias definitivas do programa habitacional anunciado pelo governo federal.

O governo Lula (PT) anunciou que entregará 14 mil imóveis —em construção ou concluídos— nas cidades afetadas.

Nos últimos dias, o presidente Lula criticou o projeto da gestão Eduardo Leite (PSDB) que prevê a construção de 500 moradias provisórias, e o debate gerou troca de farpas entre os governos.

O projeto prevê investimento de R$ 66,7 milhões para moradias de 27 metros quadrados na região metropolitana de Porto Alegre, Eldorado do Sul e no Vale do Taquari —apenas em Eldorado já foi definido o terreno que receberá as casas.

Para Lula, é preciso encontrar uma solução definitiva, em “terreno sólido”. “Vai ter que fazer casa com rua, com esgoto, com água, com energia elétrica, com área de lazer para as crianças, com escola, porque a gente não pode fazer o pessoal, depois do que passaram no Rio Grande do Sul, voltar a morar em lugar inóspito, inseguro.”

Além das moradias provisórias, a gestão Leite anunciou um investimento de R$ 20 milhões para a construção de 250 moradias definitivas. O governo do estado disse, ainda, que não há motivo para desistir do plano, uma vez que o programa de casas provisórias é estadual e não possui nenhum vínculo com o Executivo federal.

MAPEAMENTO DE ÁREAS DE RISCO

Locais apontados como áreas de ricos em Porto Alegre devem ser mapeados pela Defesa Civil na próxima semana.

De acordo com a secretária do Demhab (Departamento Municipal de Habitação), Simone Somensi, esse trabalho ainda não foi realizado porque a prioridade após as chuvas foi gerenciar os resgates e encaminhar as pessoas para abrigos, seguida da acomodação da população e, depois, retorno para casa. Agora, o objetivo é identificar os territórios para os quais os moradores não podem voltar por perigo.

Além das áreas de risco, 37 casas irregulares erguidas sobre o dique Sarandi foram destruídas pela prefeitura para a recomposição de pontos da proteção contra cheias. Neste caso está previsto o pagamento de um bônus-moradia de R$ 127 mil para cada grupo familiar adquirir uma casa.

O valor, porém, ainda não foi liberado. Um que vivia no local —e que pediu para não ser identificado— afirma que tem passado dificuldades. Primeiro, eles contam, foram para um abrigo. Depois, seguiram para a casa de familiares e agora alugaram uma casa. Mas reclamam da falta de assistência da prefeitura no curto prazo e afirmam que foram esquecidos.

A secretária Somensi afirma que, nesta sexta (14), outro benefício, chamado Estadia Solidária —de R$ 1.000 mensais e com duração de até 12 meses—, deve ser lançado para quem perdeu tudo e que as famílias que viviam na área do dique devem ser contempladas.

ISABELLA MENON / Folhapress

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