SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Ouvidoria da Polícia de São Paulo considera ao menos quatro irregularidades cometidas durante a visita de um youtuber de origem americana a policiais militares do 18º Batalhão de Polícia Militar Metropolitano, localizado zona norte da capital.
A Folha de S.Paulo revelou na terça-feira (24) que policiais militares deixaram o youtuber Gen Kimura posar com uma arma e participar de uma perseguição policial do banco de trás de uma viatura. O vídeo foi publicado no início de junho.
Nas imagens, um agente da corporação afirma em inglês ao criador de conteúdo que mortes de criminosos são comemoradas com “charutos e cervejas”.
Conforme a ouvidoria, “entre as diversas irregularidades flagrantes na gravação, nota-se o uso de equipamento restrito da Polícia Militar por um civil, como arma e colete balístico, o embarque de civil sem nenhum treinamento numa viatura em atendimento à ocorrência, incursões na comunidade com entrada em domicílios sem mandado, o acesso à áreas restritas do batalhão com guarda de material bélico, entre outras”.
O órgão classificou como ultrajante “o registro de que policiais comemoram mortes com charutos e cerveja”.
A Ouvidoria declarou ter aberto um procedimento solicitando providências à Corregedoria da PM, à Corregedoria da Polícia Civil e ao Ministério Público, no caso de se verificar improbidade administrativa.
“A espetacularização da violência produz frutos nefastos na corporação e na sociedade como um todo, transformando servidores em justiceiros e cidadãos em plateia de um espetáculo mórbido que não desejamos mais ver encenado”, acrescentou a nota.
A Polícia Militar afirmou ter aberto uma sindicância para apurar os fatos. Cinco policiais militares envolvidos na visita do youtuber foram afastados das funções. “As investigações prosseguem com o objetivo de esclarecer todas as circunstâncias e adotar as medidas cabíveis em relação ao fato”.
As cenas foram compartilhadas na publicação “Patrulhando FAVELAS com o Batalhão Tático da PM (24 hrs na vida de um Policial)”, no canal de Kimura do Youtube.
No vídeo com mais de 1,5 milhão de visualizações, os policiais também mostram o interior de um local onde são guardados armamentos da PM. Nesse momento, a filmagem capta um monitor que mostra ângulos de câmeras de segurança do perímetro.
Kimura passou o dia com oficiais e participou de operações em três comunidades na zona norte de São Paulo. Ele tem 380 mil seguidores em seu canal do Youtube.
A Secretaria de Segurança Pública afirmou que, assim que teve acesso ao vídeo, solicitou esclarecimentos à Polícia Militar, que instaurou uma sindicância para apurar todas as circunstâncias e adotar as providências necessárias.
“Toda a dinâmica mostrada nas imagens, envolvendo um civil em práticas exclusivamente militares, não é permitida e fará parte das investigações”, diz o órgão.
A SSP declarou que a frase sobre comemorar mortes “não condiz com as práticas adotadas pelas forças de segurança do Estado”.
“Excessos e desvios não são tolerados e todos os casos são punidos com rigor. Além disso, a dinâmica do vídeo não é permitida de acordo com as regras internas da Corporação”, disse a SSP.
Para o conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e policial federal Roberto Uchôa, o vídeo reforça a imagem que certas parcelas da população têm sobre a PM.
“Eles dão declarações de que comemoram a morte de criminosos em confrontos e também de que não há racismo na atuação dos policiais. É preciso entender que a população que normalmente é abordada tem uma visão exatamente oposta a esta”, afirma.
O vídeo que mostra onde são guardados armamentos e o youtuber posando com uma arma fragiliza a segurança do local, segundo Uchoa.
Sobre a perseguição, o especialista afirma que o criador de conteúdo correu riscos e poderia ter colocado os demais em perigo por não ter treinamento adequado, “ainda mais por ter acesso a armamento que estava imediatamente à sua frente enquanto estava no veículo.”
Procurado pela reportagem, Kimura inicialmente respondeu as perguntas por email. Mas, em um segundo momento, comunicou que havida mudado de ideia e solicitou que suas respostas não fossem publicadas.
Na descrição do vídeo, o criador de conteúdo afirma que a produção serve para “abordar temas controversos” e que o canal “não endossa ou apoia qualquer forma de discurso de ódio, discriminação ou violência”.
A reportagem não conseguiu localizar os PMs que aparecem no vídeo.
Redação / Folhapress