BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O TST (Tribunal Superior do Trabalho) gastou cerca de R$ 42,6 mil para que o ministro Cláudio Mascarenhas Brandão apresentasse em Portugal o seu trabalho de conclusão do curso de doutorado na Universidade Autónoma de Lisboa.
Para isso, foram fornecidas oito diárias ao ministro, no valor de R$ 30,7 mil, de 18 a 25 de março do ano passado, além de R$ 11,9 mil em passagens pela classe executiva de Brasília a Lisboa, ida e volta.
O ministro recebe um salário bruto de R$ 43 mil.
Segundo publicação divulgada no perfil de uma rede social do magistrado, ele apresentou a sua tese no dia 21 de março de 2023. A informação do motivo da viagem de Brandão não estava no Portal de Transparência da corte e só foi acrescentada após questionamento da reportagem.
Antes, o portal apenas informava: “Compra de 3 mil euros, referente ao pagamento de diárias internacionais tendo em vista viagem à cidade de Lisboa”. O valor se refere à parte das diárias que foi entregue em espécie ao ministro.
A assessoria de imprensa do tribunal afirmou que Brandão participou da defesa de trabalho em ciências jurídicas da Universidade de Lisboa Luís de Camões, em atividade de aperfeiçoamento profissional.
Segundo o tribunal, “a viagem permitiu o aperfeiçoamento do magistrado nos conhecimentos jurídicos que serão utilizados na atividade jurisdicional”.
De acordo com o órgão, as diárias são concedidas a partir da data do afastamento do território nacional e contadas integralmente do dia de partida até o dia do retorno, “logo compreendem o período do evento acrescido do tempo de deslocamento”.
Também disse que a reportagem “considerou o valor bruto de diárias, sem os devidos descontos legais”.
O desconto sobre os valores das diárias é referente à alimentação, no valor de R$ 268,8.
Além disso, citou um artigo da Lei Orgânica da Magistratura Nacional que diz que um magistrado pode ser afastado de suas atividades, sem prejuízo de seus vencimentos e vantagens, para frequência a cursos e estudos, “a critério do tribunal ou de seu órgão especial, pelo prazo máximo de dois anos”.
O TST também mencionou a resolução de 2012 do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que dispõe sobre as diretrizes administrativas e financeiras para a formação de magistrados e servidores do Poder Judiciário.
A norma diz que a formação inicial e continuada dos magistrados do trabalho “será realizada exclusivamente pelas escolas judiciais”.
Nesse caso, a Enamat (Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho) oferece os cursos, além eventos de estudo e pesquisa, ou convênios com outras instituições nacionais ou estrangeiras.
Ainda segundo o tribunal, o magistrado ou o servidor que se deslocar, em razão de serviço, em caráter eventual ou transitório, para outro ponto do território nacional ou para o exterior tem o direito de receber diárias para indenização das despesas de alimentação, hospedagem e locomoção urbana, além de passagens.
A concessão e o pagamento das diárias pressupõem, obrigatoriamente, compatibilidade dos motivos do deslocamento com o interesse público e correlação entre o motivo do deslocamento e as atribuições do cargo efetivo ou as atividades desempenhadas no exercício da função comissionada ou do cargo em comissão.
O valor da diária internacional para ministros do TST é de US$ 727, cerca de R$ 3.947. A quantia tem como referência o valor do benefício fixado pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
O valor da diária e as regras para viagens varia em cada órgão, que fixa suas próprias regras.
No Senado, são US$ 600,59 (R$ 3.309) para parlamentares e US$ 509,63 (R$ 2.808) para os demais servidores. Já a Câmara paga US$ 528 (R$ 2.909) ao presidente da Casa para viagens a países da América do Sul e US$ 550 (R$ 3.030) para os demais destinos.
Os ministros do TST afastados de suas atividades não participam das sessões realizadas nos períodos em que não estão presentes, e as ausências não são consideradas falta.
Questionada se outros ministros ou servidores do TST já receberam diárias e tiveram as passagens pagas pelo órgão para defender trabalhos acadêmicos, a assessoria da corte respondeu que “a informação consta no Portal da Transparência do tribunal”. A reportagem não localizou outros casos.
O trabalho defendido pelo magistrado teve como título “Os impactos da reforma trabalhista no sistema de cotas de emprego: análise comparativa entre o Brasil e Portugal à luz da convenção da ONU sobre os direitos das pessoas com deficiência”, com especialidade em ciências jurídicas.
Junto com a foto com a capa de seu trabalho, o ministro escreveu: “conseguir concretizar uma tese de doutoramento não é um feito individual”. E agradeceu sua mulher, filhos, pais e outros parentes.
“Estudar, pensar e escrever são atos solitários e por todos os momentos em que estive ausente, mesmo que presente fisicamente, eles são merecedores do meu reconhecimento e do agradecimento, no mínimo, por haverem compreendido essa ‘solidão acadêmica'”, disse.
Cláudio Brandão era integrante do TRT-5 (Tribunal Regional do Trabalho da Bahia) antes de tomar posse como ministro do TST, em 2013. Em setembro passado, entrou para o Conselho Superior da Justiça do Trabalho. Em 2005, se tornou mestre em direito pela Universidade Federal da Bahia.
CONSTANÇA REZENDE E LUCAS MARCHESINI / Folhapress