BRASÍLIA, DF, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, negou nesta quinta-feira (27) ter conversado com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), sobre um eventual cargo político após o fim de seu mandato na autoridade monetária.
“Nunca tive conversa com Tarcísio sobre ser ministro de nada. […] Continuamos conversando sobre economia, como converso com vários outros agentes, parlamentares, pessoas do governo. As nossas famílias são próximas, então a gente tem uma amizade grande”, disse. “Não tenho pretensão de me candidatar a nada nem ser político”, acrescentou.
No dia 10 de junho, Campos Neto participou de um jantar oferecido pelo governador em São Paulo. Como mostrou o Painel S.A., da Folha de S.Paulo, o chefe da autoridade monetária sinalizou nessa ocasião aceitar ser ministro da Fazenda caso Tarcísio entre na disputa pelo Palácio do Planalto e vença a eleição.
Ainda de acordo com o relato, a avaliação do presidente do BC é de que seria melhor Tarcísio se consolidar na chefia do governo de São Paulo por mais um mandato e se lançar à Presidência “consagrado”.
O episódio levou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a dizer que o presidente do BC tem lado político e trabalha para prejudicar o país. Lula também comparou Campos Neto ao ex-juiz da Lava Jato, senador Sergio Moro (União Brasil-PR).
Em entrevista a jornalistas, em São Paulo, Campos Neto disse que conversa pouco sobre política com Tarcísio, por achar que tem pouco a acrescentar. “Nesse tema, a minha percepção é que ele não é candidato agora”, afirmou.
Segundo o chefe da autarquia, o debate sobre uma eventual participação no governo de Tarcísio visa politizar a sua atuação no BC.
“Em 2030, vou ter 61 [anos], daqui a seis anos. Eu falar alguma coisa que vou fazer daqui a seis anos não faz o menor sentido. Nunca teve essa conversa. Tenho dito que vou para o mundo privado, provavelmente, ainda não sei hoje, vou fazer alguma coisa que misture tecnologia com finanças”, afirmou.
“O resto é uma especulação para contaminar nosso trabalho técnico, colocar um viés político em um trabalho que não tem política, que é técnico”, complementou.
O presidente do BC disse não ter se pronunciado antes sobre o assunto em respeito ao período de silêncio do Copom (Comitê de Política Monetária). Em junho, ele correspondeu ao intervalo entre os dias 12 e 25.
Ele também minimizou sua participação no evento na Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo), argumentando que foi convidado a comparecer a eventos similares no Mato Grosso e no Rio de Janeiro.
“São eventos até com, vamos dizer assim, visões partidárias diferentes. Quando eu vou nesses eventos, eu entendo que a minha presença é representando o Banco Central, que é um reconhecimento do trabalho que o Banco Central fez nos últimos tempos. Então, eu acho que é importante comparecer”, disse.
Campos Neto afirmou ainda que entrar no debate político não é bom para o BC e voltou a defender o caráter técnico de sua atuação no comando da instituição. Para sustentar sua argumentação, deu como exemplo a escalada de juros feita pelo Copom em ano eleitoral, quando o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) concorria à reeleição.
“O Banco Central do Brasil fez o maior aumento de juros em anos de eleição na história do mundo emergente. […] A gente veio de 2% para 13,75% [ao ano], mostrando claramente naquele período, véspera da eleição, que foi uma decisão técnica”, disse. “O futuro vai continuar mostrando isso do mesmo jeito que nós mostramos no passado.”
Quanto à sucessão do BC, o presidente disse que em nenhum momento anunciou que queria abreviar o seu mandato, que termina em 31 de dezembro. Segundo ele, é importante ficar até o último dia por esse ser “o primeiro grande teste da autonomia” da instituição.
“É importante que a autonomia tenha um valor institucional muito maior do que o valor político ou o valor do momento, que significa que eu tenho como dever fazer uma transição suave, independente de quem seja o sucessor, e fazer isso de tal forma que fique claro que o Banco Central é um órgão técnico.”
Campos Neto vem defendendo que a indicação do seu sucessor seja feita até outubro para que a transição do comando do BC seja feita de maneira suave.
Segundo a lei da autonomia da autoridade monetária, aprovada em 2021, cabe ao presidente da República a indicação dos nomes para a cúpula do BC. Posteriormente, os indicados passam por sabatina na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado Federal. Os escolhidos são, então, levados ao plenário para aprovação.
NATHALIA GARCIA E JÚLIA MOURA / Folhapress