Lula diz em viagem à Bolívia que país não pode cair em armadilha do golpismo

SANTA CRUZ DE LA SIERRA, BOLÍVIA (FOLHAPRESS) – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nesta terça-feira (9) que a Bolívia sofreu uma “grave ameaça” com a tentativa de golpe militar contra o governo de Luis Arce, no fim de junho, e que o país não pode sucumbir ao que descreveu como armadilha do golpismo.

O mandatário brasileiro não citou em seu discurso o ex-presidente boliviano Evo Morales, que vive uma disputa política com Arce a respeito da sucessão presidencial. Ao mesmo tempo, criticou a “desunião das forças democráticas” internas —uma fala que foi vista como um recado aos dois líderes.

Lula também citou na declaração as eleições presidenciais na Venezuela, programadas para o dia 28 deste mês, dizendo esperar que o pleito ocorra de forma tranquila e que os concorrentes aceitem o resultado final. Ainda afirmou que espera receber Caracas de volta ao Mercosul em breve.

Lula falou à imprensa na tarde desta terça, ao lado de Arce. Não houve espaço para perguntas de jornalistas. O brasileiro realiza uma visita oficial à Bolívia, em Santa Cruz de la Sierra, em um momento em que o país ainda sente os efeitos de uma tentativa de golpe militar.

Antes, de domingo (7) à segunda (8), o brasileiro participou da cúpula de chefes de Estado do Mercosul, em Assunção, no Paraguai.

“Assim como no Brasil, a democracia boliviana prevaleceu após um longo caminho entrecortado por golpes e ditaduras. Mas o que julgávamos que era o fim da estrada provou ser ainda um terreno movediço”, afirmou o presidente brasileiro.

“O povo boliviano já havia provado desse gosto amargo com o golpe de Estado de 2019 e agora se viu acometido pela tentativa de 26 de junho. Às vésperas de comemorar o seu bicentenário em 2025, a Bolívia não pode voltar a cair nessa armadilha. Não podemos tolerar devaneios autoritários e golpismos”, completou.

A viagem a Santa Cruz de la Sierra estava marcada há alguns meses, e tinha como objetivo celebrar a relação entre os dois países, impulsionar as trocas comerciais e também marcar a entrada da Bolívia no Mercosul. No entanto, ganhou novos contornos com a tentativa fracassada de golpe.

No último dia 26, o general Juan José Zúñiga e seus comandados tomaram a praça em La Paz onde fica o palácio presidencial e tentaram destituir Arce do cargo. O movimento foi controlado. Já Zúñiga acabou preso e acusou —sem apresentar provas— o presidente boliviano de tentar um autogolpe.

A versão também foi defendida pelo correligionário de Arce e ex-presidente Evo Morales, que vem travando uma disputa política dentro do partido de ambos, o MAS (Movimento ao Socialismo), e em todo o país para voltar ao poder. Evo declarou que o objetivo da ação era melhor a imagem do atual chefe do Executivo.

O ex-presidente busca disputar um quarto mandato nas eleições presidenciais de 2025, embora esteja impedido pela mais alta corte do país. Houve rumores de que Evo buscaria se encontrar com Lula durante a sua estada em Santa Cruz de la Sierra, o que não se confirmou;

Lula evitou declarações que pudessem parecer uma tentativa de intervir em uma questão doméstica boliviana. No entanto, em uma fala que soou como um recado, ele pediu mais união das forças democráticas. “Temos a enorme responsabilidade de defender a democracia contra as tentativas de retrocesso. Em todo o mundo, a desunião das forças democráticas só tem servido à extrema direita.”

O presidente também afirmou que convidou a Bolívia para participar da cúpula do G20, que será realizada no Rio de Janeiro em novembro. Luis Arce também disse ao brasileiro que pretende ingressar nos Brics, grupo que originalmente era formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, mas que foi expandido no ano passado.

Lula também abordou em sua fala as eleições na Venezuela. O presidente não comentou o banimento de candidatos da oposição, algo que ele mesmo havia criticado anteriormente. Também não citou o desconvite do regime de Nicolás Maduro aos observadores da União Europeia que acompanhariam a votação.

Em vez disso, ele afirmou esperar que o processo seja conduzido de forma tranquila e que o resultado seja reconhecido por todos. “A normalização da vida política venezuelana significa estabilidade para toda a América do Sul.”

Durante o evento em Santa Cruz de la Sierra, integrantes dos governos brasileiro e boliviano assinaram uma série de atos, em áreas como combate ao tráfico de pessoas, fortalecimento em gestão migratória e saúde.

Também foram assinados memorandos de entendimento no setor de energia. Um deles tratava do lítio, mineral utilizado na fabricação de baterias que é abundante no território boliviano —após a tentativa de golpe, houve quem tenha especulado que o ato tinha sido motivado pelo interesse internacional no material.

Outro dos acordos prevê que a usina de Jirau, sobre o Rio Madeira, opere na cota de 90 metros em alguns períodos do ano, o que resultará em ganhos na produção de energia. Parte desse excedente será destinado para a Bolívia.

RENATO MACHADO / Folhapress

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