SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Riz Ahmed já é querido em Hollywood. O vilão Carlton Drake de “Venom” esteve também em “Rogue One: Uma História Star Wars”, para em 2021 ser indicado ao Oscar de melhor ator pela interpretação de um baterista que está ficando surdo em “O Som do Silêncio”. Entre boatos de que pode voltar a ser o antagonista de Tom Hardy na franquia da Marvel, Ahmed estrela o curta intimista “Dammi” de Yann Demange, na Mubi.
No filme, Ahmed vaga pela Paris noturna atormentado, enquanto pensa sobre suas origens argelinas. Os pais do personagem deixaram o país árabe para que ele e seus irmãos crescessem na metrópole e, ainda assim, ele sente que não pertence a lugar algum.
A voz do personagem narra constantemente suas reflexões, como se fosse possível ouvir seus pensamentos. Em uma caminhada quase onírica, ele entra em um café lotado de homens argelinos mais velhos que jogam dados e conversam. Depois, ele passa a dividir as estreitas ruas parisienses com uma mulher, sua paixão.
Ela também é descendente de argelinos, mas parece se misturar à Paris com mais facilidade, o que suscita discussões constantes entre os dois. “Nossas raízes podem ser complicadas”, diz o ator, por videochamada.
“Vivemos em uma era da política de identidade em que as pessoas estão decididas a traçar linhas que separam o nós do eles. O que está por baixo disso é que as pessoas estão muito inseguras sobre suas identidades, que são mais complexas hoje em dia”, diz Ahmed. “Estamos ficando cada vez mais interconectados, e isso pode ser confuso para as pessoas.”
Segundo o ator, às vezes, a conexão com nós mesmos é mais fácil em lugares onde somos estranhos. O tema é caro para ele, que nasceu em Londres pouco depois de seus pais paquistaneses se mudarem para a cidade na década de 1970.
Depois de fazer sucesso em produções britânicas como “Shifty”, de 2008, e “Four Lions”, de 2010, Ahmed passou a atuar em filmes e séries americanas –entre elas “The Night Of”, da HBO Max, que lhe rendeu o Emmy de melhor ator em minissérie, tornando-o o primeiro muçulmano e homem de ascendência asiática a vencer na categoria em 2017. Ele faria história novamente em 2019, quando se tornou o primeiro muçulmano indicado ao Oscar de melhor ator.
A história de “Dammi” é inspirada na vida do próprio diretor, Demange, amigo de Ahmed, que no ano que vem lançará “Blade”, também da Marvel. “Ele [Demange] está sempre em busca da vulnerabilidade, mesmo que seus filmes às vezes explorem a masculinidade e tenham uma espécie de impulso muscular”, diz Ahmed.
A intimidade entre os dois atenuou o que o ator chama de “senso de responsabilidade” em um set, que, segundo ele, costuma gerar bastante tensão. “Quando se trata de fazer um filme, acho que o que realmente diferencia as coisas é o tom da produção que é estabelecido pelo diretor. Quanto o diretor realmente se importa com isso? Tem diretores dispostos a explorar e aqueles que estão tentando controlar.”
O formato diminuto não é estranho para Ahmed. “The Long Goodbye”, filme no qual dava vida ao pai de uma família paquistanesa na Europa que enfrenta uma marcha da ultradireita, ganhou o Oscar de melhor curta em live-action em 2022.
O curta celebrado pela Academia dá nome também ao segundo álbum de estúdio de Ahmed, que também é rapper. Ainda que suas musicas falem sobre temas políticos, como imigração e representatividade, ele diz que quando escolhe um filme para fazer, prefere se guiar pela beleza das histórias.
É o que o levou a fazer “Nimona”, por exemplo, animação que foi indicada ao Oscar no ano passado. “Não acho que seja uma coincidência que algumas das melhores histórias tenham algo a dizer sobre o mundo em que vivemos”, argumenta o ator.
“Elas nos desafiam a ver as coisas de forma diferente. Uma das coisas mais poderosas do cinema é que ele nos força, através dos nossos sentidos, a ver o mundo de uma perspectiva que nunca vimos antes. E isso é um ato político na medida em que nos instiga a mudar o mundo um pouco.”
DAMMI
Onde: Disponível na Mubi
Classificação: 12 anos
Elenco: Com Riz Ahmed e Souheila Yacoub
Direção: Yann Demange
ALESSANDRA MONTERASTELLI / Folhapress