Especialista da USP integra o Grupo de Trabalho (GT) de cientistas internacionais em estudo que traz mais evidências sobre consumo de álcool e câncer. Tatiana Toporcov, do Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da USP, relata: “Foi uma experiência bastante interessante e enriquecedora, e acho que é importante também o Brasil participar dessas ações. A gente também tem muitos pesquisadores aqui que são de excelência e que participam da construção de uma saúde global mais equitativa, justa e que melhora de fato a vida das populações como um todo”.
O estudo
Cresce a quantidade de evidências associando o consumo de álcool ao risco de câncer. Em 1987, a Agência Internacional de Pesquisa em câncer da OMS classificou a substância pela primeira vez como carcinógenos para humanos, afetando tumores de cavidade oral, faringe, laringe, esôfago e fígado. Depois, em 2007 e 2009, houve mais evidência de que os tumores de mama feminino e colorretal se associavam também ao álcool.
Os próximos passos agora são aprofundar as pesquisas que relacionam um menor consumo com e melhora na incidência de cânceres: “Recentemente a Agência Nacional de Pesquisa em Câncer também realizou uma revisão com pesquisadores para avaliar se essa redução no consumo do álcool reduz o risco de câncer”, afirma Toporcov.
Álcool e câncer
A relação entre a substância e os tumores se dá em alguns tipos específicos, que por sua vez variam também em graus de certeza quanto à causalidade. “Para os tumores de esôfago e de cavidade oral já tem evidência, e a gente precisa para os outros também mais estudos ainda”, explica a médica. No dois casos mencionados, os dados são suficientes para apontar uma relação direta. Inclusive, os casos de esôfago são apontados como os mais frequentes em decorrência de álcool, representando 25,6% dos casos.
Já nos casos de câncer de laringe, colorretal e mama, há “evidência limitada”, e nos de faringe e fígado, “evidência insuficiente”. Para tanto, é preciso aprofundar os estudos e traçar dados mais embasados para se apontar uma relação de causalidade entre o consumo de álcool e esses tipos específicos de câncer. Ainda assim, os casos de colorreto e laringe são o segundo e terceiro mais comuns, sendo apontados como tipos de tumores em 21,1% e 20,9% dos números devidos ao consumo da substância.
É importante ressaltar que a entidade não coloca quantidades seguras para o consumo de álcool, ou seja, mesmo uma pequena porção já começa a prejudicar o organismo. “Portanto, é importante que pensemos em reduzir o consumo de álcool da população. Queria também lembrar que o álcool não se associa só com câncer, [mas também] com outras condições de saúde que afetam a saúde pública, incluindo violência e outras doenças crônicas”, afirma ela.
Impacto na sociedade
Os dados trazidos pela OMS são vitais para se traçar políticas públicas, demonstrando para os gestores dados concretos de como o consumo de álcool afeta a população, a qualidade de vida nacional e o sistema público de saúde. Sobre isso, a pesquisadora tem uma opinião otimista: “Eu acho que a gente tem evoluído – ainda tem muito a caminhar, sim –, mas acho que o fato de divulgarmos as informações, especialmente sobre que não há consumo seguro para a população de forma geral, é importante”. Segundo ela, ainda há falta de conhecimento por parte da população, com muitos acreditando que “um pouquinho não faz mal”, ou mesmo exagerando e não pensando sobre as consequências.
Já no caso dos jovens, a atenção é redobrada. Neste grupo existe a prática de “binge drinking”, expressão do inglês para caracterizar beber muito em pouco tempo. “É uma preocupação também para a saúde pública, e certamente para quem é pai e mãe. É importante conversar também com os nossos filhos sobre essas questões e indicar as melhores formas de prevenção do consumo abusivo”, comenta Tatiana.
**Texto de Jornal da USP