LISBOA, None (FOLHAPRESS) – Um dos mais conhecidos ativistas contra a caça às baleias, o americano-canadense Paul Watson, fundador da ONG Sea Shepherd, foi detido na Groenlândia, território autônomo da Dinamarca, com base em um alerta de captura emitido pelo Japão. O ambientalista pode acabar sendo extraditado para o país asiático, um dos últimos do mundo a prosseguir com a atividade baleeira.
Watson, 73, ficará detido pelo menos até 15 de agosto, enquanto as autoridades dinamarquesas analisam seu caso. O processo de extradição, no entanto, ainda depende de um pedido formal por parte dos japoneses para ser analisado.
“A extradição da Groenlândia para processos judiciais em outros países só pode ocorrer após um pedido de extradição do país que emitiu o mandado de prisão”, disse o Ministério da Justiça da Dinamarca em comunicado.
Segundo a pasta, as autoridades só começarão a analisar se há fundamentação para o processo de extradição após o pedido formal, que deve ser apresentado “no máximo 30 dias após a prisão”.
O Japão se manifestou pela primeira vez sobre o caso nesta quarta-feira (24). O porta-voz do governo, Yoshimasa Hayashi, afirmou que os esforços para capturar Watson já têm tempo.
“O Japão há muito vem fazendo os esforços necessários junto às autoridades dos países relevantes”, afirmou, em declaração a jornalistas em Tóquio. “Entendemos que a guarda costeira do Japão, que continua a investigar o assunto, tomará as medidas apropriadas em consulta com os ministérios relevantes.”
O capitão Paul Watson, como é conhecido, foi detido no domingo (21) quando chegava a Nuuk, capital da Groenlândia, a bordo do navio MY John Paul DeJoria. A embarcação de 72 metros parou no local para reabastecer quando se dirigia ao Pacífico Norte para interceptar um novo navio japonês de caça às baleias.
Em nota, a Fundação Capitão Paul Watson, criada pelo ambientalista após sua saída da Sea Shepherd, diz que a detenção está provavelmente relacionada a um alerta internacional de captura emitido pelo Japão em 2012. A organização diz que os japoneses agiram para esconder o alerta do sistema público.
“Estamos completamente chocados, pois o alerta vermelho [da Interpol] havia desaparecido havia alguns meses. Ficamos surpresos, porque isso poderia significar que ele havia sido apagado ou tornado confidencial. Agora entendemos que o Japão o tornou confidencial para atrair Paul a uma falsa sensação de segurança”, disse Locky MacLean, diretor de operações de navios da fundação.
“Imploramos ao governo dinamarquês que liberte o capitão Watson e que não aceite este pedido [de extradição] com motivação política”, completou.
Após diversas espécies praticamente serem extintas por conta da pesca intensiva, a caça comercial das baleias foi proibida pela CIB (Comissão Internacional das Baleias) em 1986.
Mesmo com a proibição, os japoneses continuaram com algumas atividades de caça às baleias, alegando que as ações tinham propósito científico, abatendo centenas de animais todos os anos.
Em 2018, a pedido do Japão, a CIB debateu a possibilidade voltar a autorizar, ainda que com limites, a caça das baleias. A medida foi rejeitada pela maioria dos países-membros em uma reunião realizada em Florianópolis.
O resultado desagradou as autoridades japonesas, que decidiram se retirar da organização pouco depois. Em 2019, o Japão retomou a caça comercial das baleias em suas águas territoriais e na zona econômica exclusiva.
Além do Japão, Noruega e Islândia são as outras duas únicas nações que continuaram com a prática. Os países argumentam que o consumo de carne de baleia é um hábito cultural e que nem todas as espécies do animal estão atualmente ameaçadas.
Ambientalistas afirmam, porém, que as populações de baleias ainda não se recuperaram das décadas de pesca predatória, chamando a atenção também para o elevado risco de contaminação da carne por várias substâncias, incluindo mercúrio.
Durante vários anos, Paul Watson participou de ações de intervenção contra navios baleeiros. O alerta de captura emitido pelo Japão seria relacionado a uma ação contra uma embarcação de pesca japonesa no mar da Antártida, há mais de uma década, que teria provocado ferimentos e prejuízos financeiros.
O ambientalista foi preso justamente quando se encaminhava para uma ação contra o mais novo baleeiro japonês, Kangei Maru.
A detenção de Watson e a possibilidade de que ele seja enviado para julgamento no Japão foi criticada por diversos grupos ambientalistas em diversas partes do mundo, que estão organizando protestos e petições online, inclusive no Brasil.
A Sea Shepherd Brasil convocou uma manifestação em São Paulo, no próximo sábado (27), às 13h. O grupo vai se concentrar em frente ao vão do Masp (Museu de Arte de São Paulo) e seguir até o consulado da Dinamarca, na rua Oscar Freire.
A organização também organizou um abaixo-assinado online para pedir que o governo dinamarquês liberte o ambientalista. O documento será entregue ao governo brasileiro com um pedido de posicionamento contra o encarceramento de Watson.
Na França, uma petição online semelhante já angariou mais de 500 mil assinaturas. O ambientalista também recebeu o apoio de celebridades, como a atriz Brigitte Bardot.
O gabinete do presidente Emmanuel Macron afirmou que o chefe de Estado pediu à Dinamarca que não extradite o ambientalista, que passou o último ano vivendo na França.
Nascido em Toronto, no Canadá, em 1950, Watson começou seu envolvimento com o ativismo ambiental em 1969, em protestos contra testes nucleares. Durante vários anos, fez parte do Greenpeace, mas saiu da organização em meio a divergência com outros membros.
Em 1977, fundou a Sea Shepherd, que se tornou célebre por ações controversas, incluindo lançamento de objetos em navios baleeiros e iniciativas de sabotagem e bloqueio das embarcações. As ações motivaram processos e imbróglios jurídicos em vários países.
As atividades de Watson e da organização foram acompanhadas no reality show Whale Wars, que teve sete temporadas entre 2008 e 2015.
Watson deixou a Sea Shepherd em setembro de 2022, criando então a fundação que leva seu nome.
GIULIANA MIRANDA / Folhapress