RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – O ministro Fernando Haddad (Fazenda) afirmou nesta sexta-feira (26) que há muita preocupação sobre a dívida de países de baixa renda, mas ainda pouco consenso sobre o tema entre os líderes financeiros do G20.
A declaração foi dada em balanço do encontro de ministros de Finanças e presidentes de bancos centrais do bloco -composto pelas 19 principais economias do mundo, a União Europeia e a União Africana.
“Há muita preocupação sobre dívida e ainda pouco consenso, apesar dos esforços dos organismos multilaterais de ampliar o financiamento”, afirmou Haddad.
“O financiamento continua caro pelas razões conhecidas de elevadas taxas de juros praticadas no mundo nesse momento. Elas estão caindo muito lentamente e, enquanto isso, o serviço da dívida dos países pobres está em patamares inalcançáveis. Há uma preocupação grande também com a dívida”, acrescentou.
De acordo com o ministro, há uma “reclamação generalizada” de que o fluxo de capitais dos países devedores está negativo -ou seja, está saindo mais dinheiro do que entrando. Ele cita o descontentamento explícito da União Africana e da Argentina.
O tema foi motivo de divergência durante a elaboração do comunicado, tendo a China como pivô, segundo relatos de fontes de países europeus à reportagem.
Nos últimos 15 anos, a China tornou-se o maior credor individual dos países africanos liberando recursos para investimentos em projetos de infraestrutura, oferecendo garantias reais.
Na Europa, há a avaliação que os chineses não estão acostumados a entrar em negociações para reestruturar as dívidas de países em dificuldade e precisam entender o funcionamento e a importância de os países credores agirem de maneira coordenada.
No comunicado do encontro, os membros do G20 citam entre os temas-chave de preocupação o “ônus elevado da dívida”. “Desafios globais de longa data continuam exigindo colaboração multilateral e ação decisiva”, diz o texto.
Os países dizem reconhecer que as flutuações de mercado, as condições financeiras restritivas e as vulnerabilidades da dívida podem estar adicionando pressão de curto prazo sobre orçamentos públicos sobrecarregados em meio ao aumento dos custos de financiamento.
“Acreditamos que soluções específicas de cada país para desafios de financiamento do desenvolvimento podem ser baseadas em políticas combinadas que apoiem crescimento, mobilização de recursos domésticos, fortalecimento de capacidades, fluxos de capital privado e financiamento concessional direcionado”, disse.
São três parágrafos que abordam especificamente “as vulnerabilidades da dívida”. O texto fala que os membros do bloco permanecem comprometidos em intensificar a implementação do quadro comum do G20 de maneira “previsível, oportuna, ordenada e coordenada”.
Há menção explícita ao tratamento da dívida de Zâmbia, Gana, Etiópia e Sri Lanka. “Também saudamos os esforços conjuntos de todas as partes interessadas para continuar trabalhando no sentido de aumentar a transparência da dívida e incentivar os credores privados a seguir esse exemplo”, diz o texto.
O bloco diz continuar apoiando a mesa de discussão sobre o tema para “avançar ainda mais na compreensão comum” entre as principais partes interessadas, incluindo o setor privado e os países devedores. O papel de apoio dado pelo FMI (Fundo Monetário Internacional) e pelo Banco Mundial é destacado neste trecho.
Quanto à ideia de troca de dívida pela natureza, os países do G20 mostram cautela, dizendo que tomam conhecimento das notas da presidência brasileira sobre o mecanismo, que poderia ser considerado “de forma voluntária e caso a caso” e pedindo “uma visão equilibrada sobre seus benefícios e limitações.”
Com relação ao ambiente macroeconômico, o comunicado final do G20 cita uma “crescente probabilidade de um pouso suave da economia global”, com a queda da inflação no âmbito global, mesmo que ainda restem vários desafios, como o crescimento global de médio e longo prazo abaixo das médias históricas.
“A atividade econômica provou ser mais resiliente do que o esperado em muitas partes do mundo, mas a recuperação tem sido altamente desigual entre os países”, diz o grupo no comunicado.
Os membros do G20 também disseram estar comprometidos em “resistir ao protecionismo” e em “apoiar um sistema de comércio multilateral baseado em regras, não discriminatório, justo, aberto, inclusivo, equitativo, sustentável e transparente com a OMC [Organização Mundial do Comércio].”
Também foi destacada a necessidade de que o G20 continue a debater a integração transfronteiriça de sistemas de pagamento nacionais, o que inclui sistemas de pagamento instantâneo, como o Pix, e as CBDCs (moedas digitais de bancos centrais, na sigla em inglês).
Outro ponto destacado pelo grupo é a importância de estudos que identifiquem os riscos financeiros relacionados à mudanças climáticas e catástrofes naturais, e que são necessárias “medidas ambiciosas e efetivas para enfrentar esses e outros desafios globais urgentes”.
O documento citou, inclusive, a tragédia no Rio Grande do Sul, que enfrentou enchentes em maio. “Também somos solidários com os povos e governos de outros países que enfrentam eventos climáticos extremos e desastres naturais”, afirmou o grupo.
NATHALIA GARCIA, RICARDO DELLA COLETTA E JÚLIA MOURA / Folhapress