BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A participação dos municípios na segurança pública virá como um dos principais temas nas eleições deste ano, colocando as guardas municipais no centro das discussões tanto de representantes da direita como da esquerda.
Pré-candidatos sinalizam aumentar efetivos e aprimorar equipamentos e treinamentos. A intenção é passar a ideia de reforço da segurança local, além de garantir o apoio de uma categoria que se fortaleceu nos últimos anos.
Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostram que existem hoje no país 95.175 agentes distribuídos em 1.467 municípios, 26% das cidades brasileiras. Em 206 deles as guardas foram criadas a partir de 2019, primeiro ano do governo Jair Bolsonaro. Somente o Distrito Federal e o Acre não possuem contingentes municipais em suas cidades.
A título de comparação, o Brasil tem hoje um total de 404.871 policiais militares e 95.908 policiais civis, servidores vinculados às administrações estaduais.
Recebendo o apoio do presidente Lula (PT), o deputado federal e pré-candidato à Prefeitura de São Paulo pelo PSOL, Guilherme Boulos, manifestou sua intenção de expandir a GCM (Guarda Civil Metropolitana). A declaração foi feita em abril deste ano, após uma visita à sede do sindicato que representa a categoria.
Segundo a assessoria de Boulos, a prefeitura precisa retomar seu papel no debate sobre segurança pública. A equipe do pré-candidato, no entanto, destacou que segurança não se resume a repressão e policiamento ostensivo.
“Além de fortalecer a GCM, ampliando sua capacidade de atuação e incorporando 5.000 novos guardas em quatro anos, um dos focos será o policiamento de proximidade, especialmente no entorno de escolas”, afirmou, em nota.
O atual prefeito e pré-candidato à reeleição, Ricardo Nunes (MDB), também já falou sobre o tema. Em nota, a Prefeitura de São Paulo disse investir na modernização e ampliação da guarda com ações como aumento do efetivo, reajuste salarial, incremento da frota e implantação do Smart Sampa, programa de monitoramento com reconhecimento facial na cidade de São Paulo.
“Em relação ao efetivo da GCM, a prefeitura lançou em 2022 um concurso para a admissão de mil novos agentes. Em março de 2024, 500 candidatos foram empossados”, disse. “[Recentemente] a gestão anunciou a convocação de mais 500 candidatos, totalizando 2.000 novos guardas civis metropolitanos contratados pela atual gestão”, acrescentou.
A situação se repete em outras capitais. Em Curitiba, pelo menos dois deputados que são pré-candidatos à prefeitura têm abordado o tema. O deputado Luciano Ducci (PSB-PR), por exemplo, comprometeu-se a transformar a guarda municipal em uma força de segurança integrada às demais polícias.
“Polícia Municipal já! Apresentei para os servidores aposentados da Guarda Municipal de Curitiba a proposta da Polícia Municipal. A ideia é transformar a guarda de Curitiba em uma força de segurança integrada às demais polícias, com aumento de efetivo, treinamento e equipamentos”, disse em uma postagem, em maio.
Em junho, o deputado estadual e pré-candidato à Prefeitura de Curitiba, Ney Leprevost (União Brasil), também defendeu a transformação da guarda municipal em polícia.
“As grandes capitais do mundo evoluído já têm a sua própria polícia, próxima da comunidade e realizando ações preventivas e ostensivas intensas de segurança pública”, disse nas redes sociais.
Wellington Ribeiro Paranhos, presidente do Conselho Nacional de Dirigentes das Guardas Municipais e comandante da Guarda de Goiânia, destacou que a segurança pública já é uma preocupação central da população, que cobra ações efetivas de prefeitos e de vereadores.
“Eu vejo que o candidato ao Executivo que não tratar a segurança pública como um dos pilares de sua campanha, juntamente com saúde e educação, já começa em desvantagem. A segurança é o foco principal.”
Paranhos afirmou ainda que os governos que mais apoiaram as guardas municipais no país nos últimos anos, embora este seja um tema tradicionalmente associado à direita, foram aqueles comandados por partidos de esquerda.
Para auxiliar os candidatos do partido na elaboração de um plano de segurança nos municípios, o PT, por exemplo, publicou uma cartilha orientando sobre como lidar com o tema. O papel da guarda é um dos pontos centrais da discussão.
O documento destaca que a guarda “é fundamental para a prevenção da violência e pode ser uma grande aliada na inteligência contra o crime.”
A vice-líder do PT na Câmara, delegada Adriana Accorsi (PT-GO), pré-candidata à Prefeitura de Goiânia, tem demonstrado apoio à categoria liderando as discussões da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) das Guardas Municipais. O texto visa garantir segurança jurídica ao grupo, incorporando-o à Constituição como um órgão de segurança pública.
A deputada afirma que, quando era secretária Municipal de Defesa Social, realizou um projeto com a guarda municipal em uma região violenta de Goiânia, reduzindo a criminalidade em cerca de 80%. “A campanha quer colocar em prática um projeto de segurança municipal mais preventivo com as guardas, associado a outros pontos, como iluminação e videomonitoramento”, afirmou.
Qualquer município pode aprovar uma lei para criar sua guarda municipal, independentemente do número de habitantes. O tamanho da população influencia a quantidade de agentes, segundo percentuais definidos no Estatuto Geral das Guardas Municipais (Lei nº 13.022, de 2014).
Ainda que o tema da segurança ganhe protagonismo nas eleições, Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, avalia que o debate é feito de forma rasa.
“A discussão não pode ser somente em contratar gente, mas como pensar a gestão dos recursos disponíveis, como pode ser usada para prevenção, para fazer repressão. É complexo para a população, então vende o discurso de ir para cima e não avança em papéis da guarda”, disse.
Roberto Uchôa, especialista em segurança pública, destaca que há uma ênfase excessiva na ideia de que armar as guardas municipais pode resolver os problemas da violência. Defende também a discussão sobre o papel das guardas e o modelo que deve ser implantado. Para ele, é necessário evitar copiar o modelo de Polícia Militar, que já demonstrou não ser eficaz.
“Devemos entender o que queremos das guardas municipais. Queremos que se tornem policiais? Que protejam bens e municípios? Em cada cidade a atuação é diferente. Em São Paulo, já atuam no policiamento preventivo, efetuando prisões. No Rio de Janeiro, a atuação é mais marcada pelo confronto com mercados informais, como ambulantes. Criamos um estatuto, mas não definimos claramente o papel dessas guardas”, afirmou Uchôa.
RAQUEL LOPES / Folhapress