BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Itamaraty publicou uma nota sobre a eleição na Venezuela na qual não parabeniza o ditador Nicolás Maduro, declarado vencedor pelo CNE (Conselho Nacional Eleitoral) no pleito deste domingo (28), e pede a publicação pelo órgão de “dados desagregados por mesa de votação”.
De acordo com o Itamaraty, trata-se de “passo indispensável para a transparência, credibilidade e legitimidade do resultado do pleito”.
No mesmo comunicado, o Itamaraty saudou ainda o “caráter pacífico da jornada eleitoral” e disse acompanhar com atenção o processo de apuração.
“[O governo] Reafirma ainda o princípio fundamental da soberania popular, a ser observado por meio da verificação imparcial dos resultados”, diz.
O governo Luiz Inácio Lula da Slva (PT) era, até a manhã desta segunda (29), um dos únicos atores relevantes na região a ainda não ter se manifestado oficialmente sobre as eleições na Venezuela deste domingo (28).
O CNE anunciou na madrugada de segunda que Nicolás Maduro venceu o pleito, mas os números foram contestados pela oposição, que denuncia fraude.
Enviado do Planalto para acompanhar a votação, o assessor para assuntos internacionais, Celso Amorim, estava nesta manhã em reunião com os observadores eleitorais do Carter Center. Depois, vai se encontrar com um painel de especialistas ligados à ONU. Ambos organismos são considerados os representantes estrangeiros com mais credibilidade para avaliar a lisura e transparência do pleito.
Na região, alguns líderes ecoaram as denúncias da oposição sobre irregularidades no pleito. Outros fizeram um chamado por transparência. Aliados do chavismo, por sua vez, parabenizaram Maduro.
O secretário de Estado dos Estados Unidos, Antony Blinken, expressou “grave preocupação” com a possibilidade de o resultado não refletir a vontade da população e pediu uma apuração “justa e transparente”.
Outros líderes de esquerda na região, como Gabriel Boric (Chile) e Gustavo Petro (Colômbia), seguiram linha semelhante. Enquanto o chileno declarou que os resultados eram “difíceis de acreditar”, o chanceler colombiano, Luis Gilberto Murillo, pediu a “contagem total dos votos”.
Desafeto de Maduro, o presidente da Argentina, o direitista Javier Milei, afirmou por sua vez que a oposição obteve uma vitória acachapante na Venezuela e chamou Maduro de ditador.
Já o ditador da Nicarágua, Daniel Ortega, o líder de Cuba, Miguel Díaz-Canel, e a presidente de Honduras, Xiomara Castro, felicitaram Maduro, assim como os representantes da China e da Rússia, que mantêm laços estreitos com Caracas.
O pleito foi disputado entre o ditador Maduro e o diplomata Edmundo González, apoiado pela principal líder opositora no país, María Corina Machado.
Foram meses de tensão, com inabilitação de opositores a própria María Corina foi impedida de concorrer e perseguição a adversários do chavismo.
O governo Lula é um aliado histórico do regime chavista, mas a relação nos meses que antecederam o pleito foram estremecidas. Depois de reabilitar Maduro ao recebê-lo com honras de chefes de Estado em maio de 2023, o petista mudou o tom um ano depois.
Em março, o governo criticou pela primeira vez o bloqueio à candidatura da Corina Yoris, nome que tinha sido escolhido pela principal força de oposição no país. Yoris, também indicada por María Corina, não foi autorizada a disputar e deu lugar a González.
O presidente brasileiro ainda conversou por telefone com Maduro em junho, pouco depois de o chavismo ter revogado um convite à União Europeia para que o bloco enviasse uma missão de observação eleitoral. Na ocasião, Lula reiterou a importância de o pleito contar com ampla presença de observadores internacionais
Dias antes da votação, Lula ainda reagiu à fala de Maduro de que poderia haver “um banho de sangue” caso ele fosse derrotado.
“Quem perde as eleições toma um banho de votos, não de sangue. Maduro tem de aprender: quando você ganha, você fica. Quando você perde, vai embora e se prepara para disputar outra eleição”, afirmou o brasileiro, em 22 de julho.
Maduro ironizou o petista. “Quem se assustou que tome um chá de camomila”, disse.
O último capítulo das tensões ocorreu depois que Maduro disse que os sistemas eleitorais de Brasil, Estados Unidos e Colômbia não eram auditados. Diante disso, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) cancelou o envio de uma missão eleitoral da corte que iria ao país acompanhar o pleito.
RICARDO DELLA COLETTA / Folhapress