SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A pessoa que veio a se tornar a múmia da “mulher gritando” pode ter morrido em agonia ou com dor, aos 48 anos.
A boca mumificada amplamente aberta, como que por resultado de um grito, pode ser um sinal de expressão de sofrimento antes da morte, que acabou marcada para sempre na múmia devido a um espasmo cadavérico.
É o que aponta uma pesquisa publicada, nesta sexta-feira (2), na revista Frontiers in Medicine. O estudo foi conduzido por Sahar Saleem, professor de radiologia na Universidade de Cairo, e Samia El-Merghani, membro do Ministério de Turismo e Antiguidades do Egito.
Não é a primeira múmia, porém, encontrada com a boca aberta, dizem os pesquisadores. Há, por exemplo, duas associadas à realeza egípcia que também foram achadas dessa forma.
Em um dos casos, o príncipe Pentawere tinha sido morto por planejar uma conspiração para assassinar o próprio pai, Ramessés 3º, cujo reinado se estendeu de 1187 a.C. a 1157 a.C..
A outra múmia com a boca aberta provavelmente era filha do rei Sekenenré Taá, do começo da 18ª dinastia. Exames de tomografia computadorizada indicaram uma significativa aterosclerose (obstrução parcial ou total das artérias como resultado do acúmulo de gordura), sugerindo uma morte repentina por um infarto agudo do miocárdio, segundo os autores da nova pesquisa.
Ao contrário desses dois casos, com a falta de identificação e a tomografia computadorizada realizada, não foi possível determinar a causa da morte da “mulher gritando”.
Diferentemente desses dois casos, o dessa múmia reunia menos elementos que permitissem investigar seu passado. Não havia na tumba pistas de quem era a mulher. Pesquisadores a submeteram a uma tomografia computadorizada, além de outros testes, mas não foi possível identificar a causa da sua morte.
Apesar dessas dificuldades, o local onde a múmia foi achada e alguns detalhes sobre o método de embalsamamento permitem deduzir um pouco mais sobre a vida daquela pessoa.
A múmia foi encontrada na década de 1930 em um caixão de madeira, em uma tumba com câmaras funerárias para parentes de Senemute, arquiteto da rainha Hatshepsut, que teve seu reinado de 1473 a.C. a 1458 a.C.. Isso leva a crer que a mulher mumificada mantivesse algum laço familiar com Senemute.
Além disso, segundo os pesquisadores, foram utilizados materiais de embalsamento importados e caros. A forma de mumificação refletia, em geral, a posição social e política da pessoa, ou seja, os indivíduos mais ricos recebiam um tratamento mais cuidadoso, enquanto os de classes mais baixas, processos mais simplificados.
Ao mesmo tempo, o cadáver da “mulher gritando” foi sepultado com as mãos sobre a virilha, sugerindo que não se tratava de uma integrante da realeza. No caso de mulheres com este status, o braço esquerdo ficava flexionado sobre o peito e o direito, ao lado.
Também existem outras explicações possíveis para uma múmia com a boca aberta.
No caso de Pentawere, por exemplo, o corpo do homem praticamente não foi embalsamado. Um possível motivo para isso é que simplesmente os responsáveis pelo processo deixaram de fechar sua boca embalsamadores muitas vezes prendiam a mandíbula ao redor do crânio.
Já no caso da múmia da filha do rei Sekenenré Taá, a boca aberta pode ter resultado de uma queda comum da mandíbula depois da morte, provavelmente mantida pelo rigor mortis.
Pelas características de cuidado no embalsamamento da “mulher gritando” material caro, peruca e anéis, torna-se menos provável que os embalsamadores tenham sido descuidados ao prender a mandíbula do cadáver.
É por esse motivo que os pesquisadores associam a expressão de grito ao espasmo cadavérico, que demonstra o ato final antes da morte e leva a um rigor imediato, com músculos contraídos ficando rígidos imediatamente após a perda da vida. O fenômeno é raramente observado.
De toda forma, não é possível determinar com exatidão o que causou a feição da múmia ou mesmo qual foi sua história. Como já dito, procedimentos do sepultamento e alterações após a morte podem influenciar na expressão facial das múmias.
Curiosamente, assim como os mistérios que ainda cercam a múmia da “mulher gritando”, também é desconhecido o destino de seu possível parente Senemute, que desapareceu da vida pública e não foi encontrado em nenhuma das tumbas que planejou.
Alguns outros detalhes curiosos sobre a múmia da “mulher gritando” foram relevados no novo estudo. Em vida, estima-se que ela deveria ter 1,54 m de altura.
As análises do corpo mostraram diversos dentes ausentes podendo ter sido removidos propositalmente ou não; há registros que mostram práticas de odontologia no antigo Egito e gastos.
Não há sinais, porém, de doença periodontal ou cáries.
Redação / Folhapress