SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma proposta de mudança na resolução de tombamento estadual dos Jardins, na zona oeste de São Paulo, acirra a disputa entre proprietários de imóveis contrários e favoráveis à flexibilização de regras de loteamento. Algumas das alterações sob análise, em tese, poderiam facilitar a criação de condomínios residenciais em uma das regiões mais valorizadas da cidade.
As sugestões para alteração de nove parágrafos e inclusão de outros três na resolução estão em texto apresentado pelo grupo de trabalho que analisa contribuições da sociedade sobre o tema no Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico do Estado de São Paulo), órgão subordinado à Secretaria de Cultura da gestão Tarcísio de Freitas (Republicados). A audiência pública devolutiva sobre a questão ocorreu no último dia 29 de julho e a votação está prevista para setembro.
Entre as principais sugestões do texto está a inserção de uma regra que submete ao Condephaat a avaliação sobre possibilidade de remembramento e desmembramento de lotes.
Outra mudança sugerida diz que lotes considerados muito grandes não estarão sujeitos a restrições que atualmente impedem tanto a criação de terrenos muito maiores ou muito menores do que os já existentes na quadra.
Ainda são sugeridas permissões para transplante e cortes de árvores que tragam risco a construções ou ao ecossistema, como no caso de espécies invasoras, e a construção de subsolo de até 2,5 m, desde que comprovada ausência de interferência no lençol freático.
Linhas demarcatórias dos lotes fazem parte do tombamento dos Jardins porque elas estão entre as regras que impedem o aumento do adensamento populacional.
Também são tombados o traçado das ruas, os recuos das construções em relação às bordas dos terrenos e a manutenção da cobertura vegetal. São características inspiradas nas cidades jardins inglesas criadas como resistência à industrialização, conceito histórico que justifica a classificação como patrimônio urbano do loteamento projetado na primeira metade dos anos 1900 pela Companhia City.
Críticos dessas regras afirmam que elas são responsáveis por manter a região acessível apenas aos muito ricos e com uma quantidade muito pequena de habitantes numa região fartamente abastecida por infraestrutura urbana, como meios de transporte e polos geradores de emprego. A avaliação de representantes do mercado imobiliário é de que há demanda para condomínios horizonteis no bairro.
Flexibilizações nas regras que definem tamanhos de lotes, cortes na vegetação e construção de subsolo são medidas que viabilizam diversos projetos de condomínio, para casas maiores ou menores, agrupadas horizontalmente ou sobrepostas, segundo Elisabeth Vinson, integrante da Coletividade de Moradores e Vizinhança Solidária dos Jardins. O grupo é formado por moradores contra quaisquer alterações na resolução de tombamento.
A Ame Jardins, associação de moradores mais conhecida e tradicional do bairro, também é contrária à maior parte das propostas de alterações das regras urbanísticas, mas faz concessões. Uma carta recentemente divulgada pelo grupo defende manejo arbóreo e o uso do subsolo dos lotes, desde que respeitando questões ambientais e limites do lençol freático.
Questionada pela Folha sobre sua posição quanto às alterações propostas pela relatoria do grupo de trabalho do Condephaat, a Ame Jardins informou que defende a manutenção do atual modelo e que algumas de suas sugestões foram incorporadas à proposta de alteração da resolução. Entre elas, a compensação por árvores removidas e uma inédita menção ao lençol freático.
Manifestações de moradores contra e a favor da criação de condomínios aparecem no parecer técnico do Condephaat que analisa contribuições. O único ponto de claro consenso é quanto à manutenção da cobertura vegetal. Entre aqueles que querem mudanças também há posicionamentos pelo fim do uso exclusivamente residencial e unifamiliar dos lotes.
Contrária à alteração das regras atuais dos bairros jardins, a urbanista Lucila Lacreta, diretora do Movimento Defenda São Paulo, afirma que a proposta para discutir limites de lotes caso a caso é ilegal. “Tombamento é uma figura jurídica muito séria, não pode ser ao gosto de freguês”, diz.
O Condephaat reforçou à Folha que o texto proposto não é definitivo e que será avaliado item por item para posterior votação. A previsão é que o tema entre em pauta a partir de setembro.
O conselho ressalta que desde a resolução de 1986 é possível fazer remembramento ou desmembramento de lotes, com deliberação prévia do Condephaat. “No entanto, isso não significa autorização para condomínios horizontais”, diz, em nota.
O órgão também destaca que a alteração do artigo 3º da Proposta do Grupo de Trabalho que trata da análise caso a caso de lotes grandes quanto a remembramento e desmembramento, caso seja aprovado pelo conselho, deixaria a determinação do uso do imóvel sob a competência da prefeitura. De acordo com a lei vigente, o uso dos imóveis da área dos Jardins é exclusivamente unifamiliar, diz o Condephaat.
CLAYTON CASTELANI / Folhapress