GRAMADO, RS (FOLHAPRESS) – Ícone da teledramaturgia brasileira, a atriz Vera Fischer não sente saudade de fazer novela e hoje quer ser chamada para séries de streaming. Aos 73 anos, ela é uma das homenageadas do Festival de Cinema de Gramado, que premia nomes com forte ligação com o evento e a cidade.
“No momento, gosto muito de fazer teatro, porque estou imersa nisso há muito tempo, e cinema também. TV eu fiz na época em que as coisas eram boas, muito bem escritas, dirigidas, com uma direção artística da Globo muito forte”, afirmou. “Não sinto saudade de fazer novelas. Mas para séries de streaming, cinema, me chamem.”
Vera pondera que não é noveleira e que não acompanha de perto as atuais produções, mas que ouve que parte do brilhantismo se foi. Também demonstra certo ressentimento por ter ficado afastada das novelas enquanto estava disposta a trabalhar.
“Fiquei durante um bom tempo no limbo na Globo. Fui contratada por 46 anos, então tudo de bom que havia para ser feito eu fiz. Depois, caí num certo ostracismo, por parte deles, por opção deles, e isso me deixou bastante magoada”, disse.
Com mais de 20 novelas na emissora, além de minisséries, Vera parou de ser chamada para papéis de destaque por um tempo e diz ter ficado “parada em casa, recebendo em casa”.
“Depois começou a pandemia e as pessoas foram demitidas. Sendo honesta, o que sei é pelo que ouço falar, mas as novelas não são mais tão brilhantes, há muito remake, então parece que falta originalidade”, afirmou. Ela não negaria, entretanto, “um papel bom” escrito para ela.
A atriz quer produzir um filme ou uma série autobiográfica, que pode ter elementos ficcionais, e diz que o projeto ainda não tem um nome cotado para dirigi-lo. O roteiro iria, segundo ela, da infância, brincando com pedrinhas no chão –ela sonhava em ser arqueóloga–, às drogas e à violência, inclusive a não explícita.
“Eu fui muito assediada na televisão, no cinema e no teatro”, disse. “Mas sempre fui muito engraçada e consegui me salvar do constrangimento, nunca sucumbi. Eu sempre dava uma desculpa que deixava os homens muito enojados.”
Vera falou por quase uma hora nesta quarta à tarde ao público e a jornalistas. Lembrou de papéis no cinema e da pornochanchada. Disse que uma saudade que tem é de José Wilker, segundo ela, o único parceiro artístico por quem ela “caiu de quatro”.
“Uma vez fizemos um ‘take’ na praia e ele começou a recitar Drummond olhando dentro do meu olho. Comecei a ficar tonta, tonta, tonta e apaixonada por aquele homem. Meu Deus, Wilker, o que você fez comigo? Mas ele era casado, ela era minha amiga”, diz Vera, sobre o filme “Bonitinha, mas Ordinária”, dirigido por Braz Chediak a partir da peça de Nelson Rodrigues.
Para os mais novos, Vera é uma figura constante em páginas de memes, principalmente pela personagem Helena, de “Laços de Família”, dirigida por Manoel Carlos. A moradora do Leblon cancela atendimentos em seu consultório com frequência e é sempre servida pela empregada Zilda –Thalma de Freitas. A atriz diz se divertir com isso na internet.
“‘Vai um cafezinho, dona Helena?’, ‘uma salada de atum, dona Helena?’. Acho engraçado. Eu mesma uso isso nas minhas redes para descontrair, mas claro, tinha um problema, a Helena tinha uma empregada preta que trabalhava ‘full time'”, afirma. “Imagine hoje colocar uma empregada preta trabalhando toda hora? Inaceitável.”
PAULA SOPRANA / Folhapress