SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Silvio Santos, morto aos 93 anos neste sábado (17), cresceu e apareceu por voz própria, mas sempre manteve o olho aberto para formatos que faziam sucesso fora do SBT. Na pré-história da internet e da TV paga, muitos de seus lançamentos foram inspirados em ideias que ele conheceu no exterior.
O apresentador driblava a compra oficial de títulos não só pelo custo, mas também pela liberdade de mexer no projeto à vontade, já que os formatos licenciados exigem que a emissora siga uma rígida cartilha de regras, quando Silvio tinha como máxima “minha TV, minhas regras”.
CASA DOS ARTISTAS
Foi por esse histórico que o empresário não titubeou ao copiar a ideia do Big Brother quando produziu a Casa dos Artistas, em 2001, após uma longa negociação com a Endemol empresa estrangeira dona do formato, que apresentou toda a engenharia do projeto em seus mínimos detalhes a executivos do SBT.
Silvio, no entanto, mandou rasgar o contrato no ato da assinatura, em Amsterdã, sede da Endemol, e mandou reproduzir todo aquele cenário em um terreno vizinho ao de sua casa, no bairro paulistano do Morumbi. Programa lançado sem aviso prévio, a Casa dos Artistas confinou um elenco de famosos com poucas afinidades, como Alexandre Frota, Supla, Mari Alexandre e Núbia Oliver.
O pacote de conflitos, como convém às melhores novelas, foi a receita que ultrapassou a audiência da Globo desde a noite de sua estreia. O programa atingiu 47 pontos de audiência, o recorde do SBT, em sua edição final, que consagrou Bárbara Paz como vencedora.
QUAL É A MÚSICA
Mesmo quando adaptou projetos vindos do rádio e de outros países, Silvio soube imprimir sua marca e fazer de sua versão uma referência. São os casos do “Namoro na TV,” que não nasceu nem acabou com ele, sendo reciclado por outros canais e por ele mesmo, e do “Qual É a Música?”, matriz do “Ding Dong”, seção do extinto Domingão do Faustão, para citar apenas um exemplo.
Vêm do “Qual É a Música” frases marcantes como “uma nota, maestro” para os competidores que se arriscavam a adivinhar a canção só com um toque, além da figura excêntrica que jorrava glitter do rosto quando surgia dublando as canções das respostas certas.
DOMINGO NO PARQUE E NA PORTA DA ESPERANÇA
Outro referencial deixado por Silvio é o foguete que animava as manhãs do “Domingo no Parque” . Alguém do auditório topava entrar na cabine, colocava um fone de ouvido para não escutar o som externo, devendo responder apenas “sim” ou “não” quando a luz da cabine se acendesse.
“Você quer trocar um carro zero por um pijama?”, perguntava hipoteticamente o animador. A plateia gesticulava, gritava desesperada que “não”, mas era bem capaz que o participante respondesse “sim” e saísse de lá com um brinde pífio.
Na “Porta da Esperança”, Silvio presenteava pessoas sorteadas em busca de casa, mobília, cachorro, cadeira de rodas ou outras necessidades. Só era preciso que a produção encontrasse empresas dispostas a patrocinar o presente em troca de exposição no programa.
SHOW DE CALOUROS
Um de seus maiores clássicos, o “Show de Calouros” equivale a um registro de autenticidade para os programas genéricos que o sucederam. O público aparecia para cantar, dançar ou fazer performances, com generoso espaço para travestis, figuras sempre bem-vindas no palco de Silvio.
A ideia de um júri composto por figuras prontas para serem odiadas ou ridicularizadas já vinha de outros auditórios, mas Silvio potencializava o folclore em torno de juízes como Pedro de Lara, Décio Piccinini e Aracy de Almeida.
SHOW DO MILHÃO
Veio o “Show do Milhão”, outro alvo de disputas na Justiça, semelhante ao mundial Who Wants to Be a Millionaire, ou Quem Quer Ser um Milionário, que depois foi importado para o extinto Caldeirão do Huck. Nas mãos de Silvio, no entanto, ele parecia outro programa.
TOPA TUDO POR DINHEIRO
Foi durante o “Topa Tudo por Dinheiro”, que ficou no ar por dez anos, de 1991 a 2001, que Silvio inaugurou um de seus rituais mais famosos. “Quem quer dinheiro?”, ele perguntava, enquanto atirava na direção do auditório cédulas de R$ 50 ou R$ 100 em formato de aviãozinho. Com calouros e pegadinhas de câmeras escondidas, ou assim anunciadas, o programa aceitava praticamente qualquer coisa.
Nome que serviu de guarda-chuva para todos os programas sob o seu comando, o Programa Silvio Santos remonta à TV Paulista, canal 5 de São Paulo, ainda na era das Organizações Victor Costa, desde 2 de junho de 1963.
Dessas seis décadas no ar, mais de quatro foram trilhadas pela locução da famosa voz de Luiz Lombardi Netto, conhecido apenas como Lombardi, que morreu em 2009. Ele foi o timbre padrão de seus programas desde a TV Paulista, inclusive a narração da bajulatória “A Semana do Presidente”.
A seção acabou, mas Silvio manteve a premissa de ser sempre a favor do presidente do momento se não fosse para paparicar o dono da caneta, sua orientação era para ao menos evitar confronto com o poder.
CRISTINA PADIGLIONE / Folhapress