PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – Afetados pelas fortes chuvas que levaram ao adiamento do CNU (Concurso Nacional Unificado), candidatos gaúchos fizeram as provas deste domingo (18) ainda sob impactos da tragédia que causou 182 mortes e tirou cerca de 600 mil pessoas de casa.
Moradora de São Sebastião do Caí, a cerca de 60 quilômetros de Porto Alegre, a lojista Jeane Zardo, 30, contou após a prova que teve a rotina alterada quando a cidade foi destruída pela maior cheia da história do rio Caí. “Na enchente eu abriguei familiares na minha casa e tudo ficou bastante inviável para mim.”
Ela elogiou a decisão de adiar o concurso, por proporcionar tempo suficiente para a reorganização do estado, mas disse ter reparado que as salas estavam com muitos lugares vazios a abstenção foi alta em todo o país.
“Muita gente foi prejudicada com essa mudança. Quem já tinha viajado ou pago hotel para ficar anteriormente, talvez essas pessoas tenham ficado desmotivadas ou até mesmo financeiramente atingidas”, disse.
Jeane afirmou que não achou as provas tão difíceis quanto esperava. Ainda assim, disse que sentiu “o peso da enchente em não ter tido tanto tempo para estudar.”
“Tive a casa cheia de lama dos meus sogros para limpar em Canoas [na região metropolitana da capital gaúcha] no pós-enchente”, explica.
Mais de 78 mil pessoas estavam inscritas para o CNU no Rio Grande do Sul, sendo 37 mil em Porto Alegre e o restante distribuído em outras nove cidades. De acordo com o Ministério da Gestão, seis locais que receberiam as provas precisaram ser alterados devido aos danos causados pelas enchentes.
Natural de Eldorado do Sul, a cidade mais afetada pelas chuvas, a professora Beatriz Rosso, 34, disse que o adiamento do concurso não lhe garantiu mais tempo de estudo. Ela chegou a adquirir um curso online, mas não conseguiu dar continuidade depois da inundação atingir sua casa.
“Não só em função da enchente, a vida se desorganiza de uma forma geral”, disse após deixar o local de provas neste domingo. Desde então, tentou conciliar a dedicação à prova com a retomada de sua rotina.
Apesar de ter aprovado o concurso, ela acredita que as cheias e a mudança de data da prova causaram um “impacto muito grande não só para mim, mas para todo o Rio Grande do Sul.”
“Mesmo quem não foi afetado diretamente foi afetado indiretamente com o trabalho e outras questões”, continuou.
Beatriz também notou muitas cadeiras vazias na sala em que estava, o que atribui à mudança de data. “Foram alguns meses entre maio e agora, muita coisa pode ter mudado na vida das pessoas, né? Então é normal”.
A servidora pública Camila Pozzebon, 35, mora em Porto Alegre e não precisou sair de casa com a elevação recorde do lago Guaíba, mas compartilha da mesma visão. “[A enchente] afetou de uma forma geral, com certeza”, fala.
“Esse concurso eu não me preparei especificamente, trouxe a bagagem de outros que eu que eu vinha fazendo.” Camila disse que a prova foi “bem elaborada” e apreciou o enfoque em temas sociais na redação e em muitas perguntas.
“Essa abordagem é importante”, disse. “Não tem como separar até porque o servidor público tem a função social”.
CARLOS VILLELA / Folhapress