SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) virou alvo de investigação do MPT (Ministério Público do Trabalho) após relatos de servidores municipais convocados a participar de atos da campanha do candidato à reeleição.
Mensagens de texto foram enviadas por integrantes de cargos de diretoria e gerência na Prefeitura de São Paulo a subordinados com questionamento sobre a participação em reunião promovida por partido aliado e pedido de acesso a link de cadastro de apoiadores.
O servidor deveria responder no questionário se aceitaria participar voluntariamente dos eventos em apoio a Nunes, quantos seguidores tem nas redes sociais, se integra algum partido político e se disponibilizaria seu carros para colar adesivos de divulgação do candidato.
O inquérito civil do MPT, aberto na terça-feira (20), irá investigar se há configuração de assédio eleitoral e político no ambiente de trabalho.
Em nota, a gestão Nunes afirmou não autorizar uso do equipamento público para fins eleitorais e que a participação de servidores deve ocorrer fora do horário de trabalho, conforme legislação. “A gestão reforça, portanto, que não autoriza ou compactua com eventual uso de equipamento público por qualquer agente público para fins eleitorais.”
A Folha ouviu relatos de cinco funcionários da prefeitura que receberam convites por WhatsApp e até por telefone para comparecerem a eventos relacionados à campanha.
Servidores abordados afirmaram que se sentiram pressionados a atender os chamados feitos por superiores. Falando sob a condição de anonimato por temer represálias, um deles relatou uma convocação oral com pedido de chegada antes da hora marcada do evento e cobrança de postagem em rede social.
A reportagem obteve acesso a prints e mensagens de textos enviados pelo WhatsApp a funcionários comissionados –que, ao contrário dos servidores concursados, não gozam da mesma estabilidade.
Além disso, funcionários da prefeitura costumam comentar em chats ao vivo, em horário comercial, quando Nunes participa de alguma sabatina ou debate na campanha. A Folha identificou ao menos oito contratados da prefeitura que escreveram comentários elogiosos ao prefeito nessas ocasiões.
Eles são ligados ao gabinete de Nunes e às secretarias municipais de Infraestrutura Urbana e Obras, Educação, Gestão e Segurança Urbana.
A reportagem questionou a gestão municipal sobre essas participações online dos servidores, mas não obteve resposta.
Pesquisa Datafolha divulgada nesta quinta-feira (22) mostrou que Nunes oscilou negativamente quatro pontos percentuais em relação ao levantamento anterior e marcou 19% das intenções de voto. Ele ainda está empatado tecnicamente em primeiro lugar com o influenciador Pablo Marçal (PRTB), que subiu para 21%, e Guilherme Boulos (PSOL), com 23%.
Na caminhada da última sexta-feira (16) que marcou a estreia da campanha de rua de Nunes, realizada próximo à sede da prefeitura, no centro, havia funcionários municipais com crachá. O prefeito foi questionado sobre isso e afirmou que eles estavam em horário de almoço.
“Nós estamos em horário de almoço. […] A gente fez do meio-dia à uma hora. Se tem alguém aqui do governo, é referente ao seu horário de almoço”, disse Nunes, acrescentando, no entanto, que a prefeitura não teria “tanta gente que nem tem aqui”.
Parte dos funcionários chamados para eventos de campanha são ligados à Secretaria de Esportes e Lazer.
Na última terça-feira, servidores receberam convite do chefe de gabinete da pasta, Franz Felipe da Luz, para participarem de uma reunião de campanha no dia seguinte, às 17h30. No endereço informado na mensagem funciona a Fundação Podemos, partido do qual ele é integrante da executiva nacional como tesoureiro adjunto.
A mesma convocação para participar da reunião foi repassada em aplicativo de mensagens pelo coordenador de Administração e Finanças da mesma secretaria, Carlos Antônio Carvalho de Campos.
A Folha de S.Paulo pediu posicionamento dos servidores à gestão Nunes, mas não obteve resposta específica sobre eles, apenas a posição institucional da prefeitura.
Em nota, o Podemos afirmou não ter observado “qualquer irregularidade na conduta” e que se tratou de “um convite informal, livre e voluntário”, sem caráter de convocação.
Em outra mensagem repassada aos funcionários municipais, Nunes aparece em uma foto promocional ao lado de Renata Abreu, presidente do Podemos, partido que integra a coligação de Nunes.
O convite para participar da convenção de Nunes, no último dia 3, incluiu um link para a confirmação de presença seguido do aviso: “Mesmo que não possa comparecer ou não possa ficar durante todo o evento, é muito importante que todos se cadastrem”.
Um dos relatos à Folha de S.Paulo de concursados chamados por telefone é de uma servidora que atua em uma DRE (Diretoria Regional de Educação) na zona leste.
O município de São Paulo está dividido em 13 DREs. Essas diretorias regionais de ensino e as 32 subprefeituras, conforme apurou a reportagem, estão entre os setores mais suscetíveis aos convites. Isso porque possuem departamentos sob forte influência de vereadores da base de apoio de Nunes.
No último dia 14, em um evento com a presença de Nunes e do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) para a comemoração dos 104 anos de fundação da Portuguesa, tradicional clube de futebol paulistano, os carros pertencentes às DREs foram colocados à disposição para transportar os funcionários ao Canindé.
As 32 subprefeituras são loteadas historicamente entre aliados dos prefeitos, consolidando, assim, influência nos redutos eleitorais. Esses órgãos formalmente têm como função planejar e executar ações locais, articulando diferentes áreas da administração municipal.
Em um “convite especial” para eventos de campanha da última sexta, enviado para funcionários de uma subprefeitura, a mensagem diz o seguinte: “Iniciaremos a nossa campanha com a Missa de Ação de Graças celebrada pelo Bispo Dom José Negri” e encerra com “Nos vemos lá, Equipe Ricardo Nunes”.
ANA LUIZA ALBUQUERQUE, CARLOS PETROCILO, CAROLINA LINHARES, JOELMIR TAVARES E MARIANA ZYLBERKAN / Folhapress