SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O candidato à prefeitura paulistana Pablo Marçal (PRTB) pode ter a candidatura cassada caso fique comprovado o envolvimento dele no pagamento de cortes (vídeos curtos para publicação em redes sociais) feitos por apoiadores de sua campanha, segundo especialistas em direito eleitoral ouvidos pela reportagem.
Em um processo de investigação eleitoral aberto a pedido do PSB, da candidata Tabata Amaral, o juiz Antonio Maria Patiño Zorz acolheu o argumento de que há indícios de que Marçal esteja cometendo abuso econômico ao promover os cortes monetizados e concedeu medida liminar para suspender os perfis em redes sociais usados para esse fim.
“Conste que há documento demonstrando que um dos pagamentos proveio de uma das empresas pertencentes ao requerido Pablo, o que pode configurar uma série de infrações”, escreveu o juiz na decisão divulgada neste sábado (24).
No início da tarde, em entrevista Marçal negou que tenha oferecido dinheiro para pessoas cortarem suas entrevistas e espalharem as imagens pelas redes.
A remuneração a seguidores em troca do envio dos conteúdos pode configurar abuso de poder econômico, propaganda irregular, caixa dois de campanha e financiamento de propaganda por meio vedado.
Para Volgane Carvalho, professor da Unifor (Universidade de Fortaleza), “todas essas possibilidades estão na mesa, porque, por exemplo, não pode ter financiamento de campanha por pessoa jurídica. Se estiver sendo pago por uma das empresas, vai ser um tipo de propaganda irregular e um tipo de doação que não é permitido pela legislação”.
Segundo o professor, será possível apurar se houve irregularidades “quando se verificar de onde veio o dinheiro utilizado para pagar e se realmente está atrelado à campanha eleitoral”.
O professor de direito do Insper Ivar Hartmann ressaltou que deve ser analisada suposta violação ao artigo 34 da resolução 23.610 de 2019 do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
O texto legal proíbe a realização de propaganda por meio de disparo em massa de mensagens instantâneas sem consentimento da pessoa destinatária ou a partir da contratação de expedientes, tecnologias ou serviços não fornecidos pelo provedor e em desacordo com seus termos de uso.
“A prática do corte, remunerado ou não, já significa violação desse artigo. Com a remuneração, o abuso de poder econômico fica evidentemente configurado”, disse Hartmann.
De acordo com a advogada Isabela Damasceno, mestre pela UFMG e presidente da comissão de Direito Eleitoral da OAB-MG, “é possível que seja constatada a indevida vinculação de pessoa jurídica à campanha eleitoral quando empresas e candidaturas estabelecem, durante a campanha, uma íntima e estável vinculação, explorando, perante o eleitorado, o poder econômico de que dispõem os entes empresariais”.
Damasceno afirmou que será necessário verificar no caso se houve claro prejuízo à igualdade de chances entre os candidatos.
Os especialistas consultados pelo jornal consideraram a concessão da liminar equilibrada e bem fundamentada.
Para Damasceno, “é uma decisão moderada em seus efeitos, pois o juiz demonstra uma tendência a preservar a paridade da disputa”.
A presidente da comissão de Direito Eleitoral da OAB-MG destacou o trecho da liminar no qual o juiz afirma que “não se está, nesta decisão, tolher a criação de perfis para propaganda eleitoral do candidato requerido, mas apenas suspender aqueles que buscaram a monetização dos ‘cortes’ por meio de terceiros interessados”.
Carvalho acrescentou que as liminares em geral trazem “um juízo primário, um juízo mais de urgência, não é preciso um gigantesco aprofundamento teórico, jurisprudencial”.
“Então, a decisão juridicamente está perfeita, está suficientemente fundamentada, até, eu diria, mais fundamentada do que seria pertinente para uma tutela de urgência”, afirmou o professor da Unifor.
Segundo Hartmann, agora o processo deverá caminhar para a busca e apresentação de provas pelas partes na causa.
O professor do Insper disse que deverá ocorrer “a produção de provas sobre as pessoas envolvidas na prática de corte e os valores usados para remuneração”.
FLÁVIO FERREIRA / Folhapress