SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Na reta final de preparação para os Jogos Paralímpicos de Paris, que começam na próxima quarta-feira (28), atletas brasileiros do judô e do halterofilismo fizeram na semana passada os últimos treinos antes do embarque para a França.
De menor intensidade física, de modo que eles cheguem na ponta dos cascos à capital francesa, os treinamentos aconteceram no CT do CPB (Comitê Paralímpico Brasileiro), um espaço com piscinas, quadras, academia e alojamento com 300 quartos, inaugurado em maio de 2016 na rodovia dos Imigrantes, em São Paulo.
A meta do CPB é que o Brasil conquiste entre 70 e 90 medalhas na França, figurando entre os oito primeiros colocados no quadro geral de medalhas. Em Tóquio-2020, o Brasil teve seu melhor resultado até aqui, com 72 medalhas -22 de ouro-, terminando em 7º na classificação final.
A delegação brasileira na França conta com 255 atletas, incluindo um recorde de 117 atletas mulheres, ou 45,9% do total, a maior convocação feminina brasileira na história dos Jogos.
Entre elas, está Alana Maldonado, 25, de Tupã, no interior de São Paulo, responsável pelo primeiro ouro de uma mulher do país no judô na história das Paralimpíadas, no Japão.
Ela embarcou junto com a equipe de judô nesta quinta-feira (22) para Paris confiante na busca pelo bicampeonato paralímpico, após ter ficado quase um ano afastada dos tatames por causa de uma grave lesão no joelho.
Durante uma competição no início do ano passado, ela sofreu a ruptura do ligamento cruzado do joelho direito. Precisou passar por uma cirurgia e ficou o restante do ano longe dos treinos e das competições.
A judoca conta que o período acabou tendo um lado positivo, pois serviu para “colocar a cabeça no lugar”.
“Acho que eu precisava respirar um pouco. Eu vinha de quase dez anos seguidos de treinamentos, competições, e estava cansada mentalmente. Então aproveitei, quando infelizmente tive que operar, para dar uma desligada, fazer um trabalho mental e focar na minha recuperação. E quando estava apta para voltar ao tatame, foi uma alegria, uma sensação incrível. Acho que precisava disso para hoje estar me sentindo pronta para ser bicampeã”, disse Alana à Folha no tatame da sala de judô do CPB.
Ela começou a prática esportiva aos 4 anos, e, aos 14, descobriu a doença de Stargardt, que provoca a perda progressiva da visão. A modalidade paralímpica chegaria somente alguns anos depois, na faculdade de Educação Física.
“Quando voltei para o tatame, eu me descobri, foi quando me dei conta que eu queria ser uma atleta profissional. Como tinha começado desde novinha, não precisava de ajuda das pessoas. Conseguia ter autonomia de treinar, de fazer os movimentos todos sozinha. E era onde queria passar a maior parte do meu tempo, porque ali me sentia totalmente independente.”
Em sua terceira participação em uma Paralimpíada, Alana diz que não tem como deixar de “sentir um frio na barriga” a poucos dias do início das competições. Mas, ao mesmo tempo, acrescenta a campeã paralímpica, a experiência prévia e o apoio da comissão técnica ajudam a controlar a ansiedade e lidar com a pressão da melhor maneira possível.
“Tem pressão da mídia, da confederação, ainda mais quando já vem de um ouro, mas tento lidar com leveza. Eu não tenho a obrigação de ganhar, eu quero ganhar por mim.”
Campeã paralímpica e mundial foi descoberta por técnico em Itu
Nas Paralimpíadas de Tóquio-2020, o Brasil também conquistou seu primeiro ouro no halterofilismo. O feito coube à Mariana D’Andrea, atleta com nanismo de 26 anos nascida em Itu, no interior de São Paulo. Na ocasião, ela subiu ao lugar mais alto do pódio na categoria até 73 kg, ao levantar 137 kg.
Em agosto de 2023, Mariana voltou a fazer história ao garantir o primeiro título mundial do halterofilismo brasileiro, em Dubai, batendo o recorde na categoria até 79 kg, ao suportar 151 kg.
“A expectativa para Paris é a melhor possível. Eu venho treinando, me dedicando bastante. E depois de conquistar uma medalha de ouro em Tóquio, quero repetir esse feito, porque só a gente que é atleta sabe o quanto isso muda na nossa vida, o quanto a gente quer conquistar essa medalha”, disse Mariana após o treino na academia do CPB.
A entrada da atleta no halterofilismo aconteceu em 2015, quando, andando pelas ruas de Itu acompanhada da mãe, chamou a atenção do treinador Valdecir Lopes, que a convidou para iniciar na prática esportiva.
“Vi que ela tinha um perfil para a modalidade. Toda fortinha, falei na hora: ‘vai ser campeã. Só basta convencê-la de aceitar a modalidade’. Eu tinha muita certeza, desde o começo, que ela ia se tornar uma grande atleta”, diz Lopes, que segue como o treinador de Mariana até hoje.
“Na hora que ele me chamou, me assustei, tentei correr, fugir dele. Aí não deu muito certo e voltei. A gente ouviu o que ele queria, ele nos chamou para conhecer a academia. Na hora não queria entrar, mas, por incentivo da minha mãe, entrei, conheci e não gostei”, diz Mariana.
Ela afirma que, em seu primeiro contato com o esporte, não se animou muito pois teve dificuldade de levantar a barra de 20 kg. No entanto, não desistiu, foi gradualmente evoluindo e, quando conseguiu chegar aos três dígitos -100 kg- se convenceu de que realmente tinha potencial.
A primeira grande conquista viria em 2017, quando levantou 105 kg para ficar com o ouro nos Jogos Parapan-Americanos de Jovens, em São Paulo. No mesmo ano, levantou 107 kg e levou a prata na etapa da Copa do Mundo de Eger, na Hungria, batendo o recorde brasileiro júnior e adulto.
Em 2018, venceu o campeonato europeu, e, no ano seguinte, ganhou o ouro na etapa de Dubai da Copa do Mundo e nos Jogos Parapan-Americanos de Lima. Voltou a vencer o Parapan em Santiago (2023), quando levantou 141 kg e bateu o recorde das Américas, que já pertencia a ela.
Mariana conta que, se antes as pessoas a paravam pelas ruas de Itu para pedir uma foto devido ao nanismo, hoje é famosa na cidade pelos feitos conquistados no esporte, sendo bastante abordada pelos fãs sempre que sai de casa.
“O esporte mudou totalmente minha vida, consegui conquistar minha casa, meu carro. Sem ele, acho que isso seria mais difícil, nem sei como que seria. Então, hoje o esporte é tudo na minha vida.”
LUCAS BOMBANA / Folhapress