BATATAIS, SP, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Os incêndios em série registrados no interior de São Paulo nos últimos dias queimaram uma área de 59 mil hectares de lavouras de cana-de-açúcar, causando um prejuízo aos produtores rurais de R$ 350 milhões.
Os dados são da Orplana (Organização de Associações de Produtores de Cana do Brasil) e contemplam áreas a serem colhidas e também de rebrota de cana pulverizadas em várias regiões agrícolas paulistas. Só entre sexta (23) e sábado (24), foram 2.105 focos de incêndio no estado, 1.800 no primeiro dia e 305, no dia seguinte.
“O sábado começou melhor, mas os fortes ventos atrapalharam muito no fim do dia. O vento vai de um lado para o outro e aí as brigadas das usinas e dos produtores não dão conta de ficar apagando. Cada hora sopra para um lado e as fagulhas passam para outros talhões e isso se propaga”, afirmou o CEO da Orplana, José Guilherme Nogueira.
O cenário fez com que alguns moradores de Ribeirão Preto inclusive deixassem suas casas no condomínio Alphaville 3 entre o fim da tarde e o início da noite de sábado, já que o fogo se aproximou dos muros do residencial devido aos fortes ventos.
Os focos de incêndio em canaviais começaram pela região de São José do Rio Preto, atingindo cidades como Olímpia, e depois alcançaram o entorno de Piracicaba e chegaram à macrorregião de Ribeirão Preto, tendo cidades como Sertãozinho, Dumont, Jardinópolis, Pitangueiras, Bebedouro, Brodowski, Batatais, Barretos, Colina, Altinópolis e Cajuru entre as afetadas
De acordo com ele, as propriedades rurais mais prejudicadas são as que ficam próximas a rodovias e às zonas urbanas dos municípios. “O cara joga a bituca de cigarro e, mesmo que tenha uma área roçada pela concessionária ou da Artesp [agência reguladora dos transportes], fica uma palhada seca também e aquilo ali pega fogo e se alastra rapidamente. Só que jogar a bituca de cigarro é crime, isso precisa ser claro.”
O mesmo se aplica, conforme o executivo, a pessoas que colocam fogo em terrenos baldios nas áreas urbanas.
Medição da entidade aponta que choveu 12 milímetros neste domingo em Ribeirão, metade do que Nogueira considera como o necessário para resolver o problema das queimadas.
Nas terras da família de Marcos Meloni, que planta cana-de-açúcar, a colheita foi realizada entre os meses de abril e maio. O fogo, porém, afetou mudas de cana para a próxima colheita, no ano que vem.
Meloni afirma que, neste ano, a colheita, de 55 mil toneladas de cana, rendeu R$ 3,5 milhões. A família do produtor rural possui em torno de 550 hectares de terras espalhadas por Sertãozinho e Barrinha, no interior do estado.
“Pegou fogo em tudo aqui. Agora não tem mais esperança nenhuma. Tava muito seco. Veio o fogo e acabou de injuriar a soqueira [broto] da cana. Ano que vem não vai ter nada. A gente tem que comprar adubo, comprar veneno”, conta Meloni.
Em Pontal, município que fica a pouco mais de 30 km de distância de Ribeirão Preto (SP), o produtor Marco Guidi viu as raízes da cana-de-açúcar de sua plantação soltarem fumaça após serem alcançadas pelo fogo na última quarta-feira (21).
“Eu tinha aqui quatro caminhões-pipa, com uma média de 15 mil litros de água cada um. Nós só conseguimos proteger a sede da fazenda. O plantio de cana, no ano passado, ficou na ordem de R$ 12 mil por hectare. O prejuízo é grande”, diz.
Guidi explica que a queimada prejudicou as mudas de cana e diz que a safra do próximo ano deve ser afetada. “Eu perdi tudo, toda a minha muda queimou junto com a palha. Eu vou ter que comprar mudas de alguém.”
O fogo também prejudicou a plantação de empresas maiores. A Raízen registrou vários focos de incêndio nas áreas de produção da companhia. Segundo a distribuidora, também havia fogo em propriedades de fornecedores de cana e em áreas de outros grupos sucroenergéticos.
Empresa do setor agrícola, o Grupo Moreno chegou a publicar nota em redes sociais oferecendo recompensa de R$ 30 mil por informações de incêndios criminosos em áreas de companhia usadas para cultivo de cana-de-açúcar ou de vegetação nativa. A recompensa será concedida caso as informações levem à prisão da pessoa responsável pelo ato.
Na sexta, a Orplana publicou comunicado repudiando os incêndios na região de Ribeirão Preto, apontados por ela como criminosos, e dizendo que os produtores rurais e as usinas de açúcar e etanol não eram responsáveis pelas queimadas, já que sofrem prejuízo financeiro com elas.
No passado, queimar lavouras de cana era uma prática comum no interior especialmente na região de Ribeirão, mais tradicional polo produtor do país, mas a partir da assinatura do protocolo agroambiental, em 2007, a queima foi reduzida de forma acelerada nos anos seguintes.
Além da questão ambiental, queimar as lavouras prejudica outras atividades que surgiram nos anos seguintes nas usinas, como o etanol de segunda geração, combustível que é processado a partir de resíduos vegetais, como palha, folhas e bagaço de cana-de-açúcar.
Nos últimos dias, duas pessoas foram presas suspeitas de atearem fogo em vegetação em São José do Rio Preto e Batatais.
MARCELO TOLEDO E PAULO RICARDO MARTINS / Folhapress