SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um estudo divulgado nesta terça-feira (3) pelo Instituto Trata Brasil mostra que os gargalos para a universalização do saneamento básico no Brasil vão além da falta de investimentos por governos e empresas do setor. Para que o país consiga zerar o déficit nos serviços de água e esgoto, as próprias famílias terão de gastar com obras, o que inclui a instalação de pias, vasos e canos de conexão com a rede.
São necessários R$ 242,5 bilhões para readequar toda a infraestrutura residencial de saneamento no Brasil, valor que deverá vir principalmente de famílias pobres ou de classe média baixa que são as mais afetadas pela falta de saneamento.
O estudo foi feito pelo Trata Brasil em parceria com a Ex Ante Consultoria Econômica, a Asfamas (Associação Brasileira dos Fabricantes de Materiais para Saneamento) e o CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável).
O investimento de R$ 242 bilhões indica a necessidade de praticamente dobrar o esforço financeiro feito atualmente. De acordo com o trabalho, as famílias brasileiras gastaram, em valores atualizados, cerca de R$ 13 bilhões com reformas da infraestrutura de saneamento em 2018. Se as novas obras fossem feitas ao longo de dez anos, a despesa anual precisaria subir para R$ 24,3 bilhões.
Além de obras de adequação das moradias, entram nessa conta a instalação de caixas d’água e a ligação do escoamento de esgoto da residência à rede geral de coleta, etapas importantes para diminuir a poluição dos rios, diminuir a incidência de doenças e melhorar a qualidade de vida da população.
A análise considerou dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Continuada do ano de 2022, que indica aspectos da privação de saneamento. O estudo considerou cinco dimensões: privação de acesso à água, falta de canalização dentro da moradia, indisponibilidade de reservatório, insuficiência de banheiro e falta de conexão à rede de esgoto.
“Cerca de 75% do investimento necessário para a readequação da infraestrutura de saneamento do país está em moradias com renda de até R$ 5.724,00 mensais, ou seja, em famílias pobres ou da classe de renda média baixa. Esse fato levanta a questão das políticas necessárias para sustentar esse patamar de investimentos nesses segmentos da sociedade brasileira”, diz o estudo.
O trabalho ainda aponta a necessidade de investimento por região. A distribuição fica concentrada no Nordeste (26,9%), Norte (19,8%) e Sul (22,4%).
“Na região Norte, se a gente avaliar essas carências de infraestrutura residencial, teria que investir R$ 6.100 por habitante para resolver a questão, enquanto no Brasil esse investimento médio é de R$ 2.600 por habitante”, afirma Luana Pretto, presidente do Instituto Trata Brasil.
Segundo ela, a concentração das despesas na população de baixa renda e nos moradores do Norte no país aponta para a necessidade de se pensar políticas de crédito e de subsídio para viabilizar essa demanda e acelerar o processo de universalização do saneamento.
“Hoje, com a renda dessas famílias, esse investimento necessário para esse ciclo completo de saneamento básico não cabe no orçamento, e a gente pode não chegar no objetivo final. Os rios só vão ser despoluídos, por exemplo, se houver ligação da casa na rede. A saúde só melhorará se houver essa ligação”, afirma Pretto.
O estudo divulgado nesta terça mostra que a universalização do saneamento passa não só pela necessidade de investimentos por concessionárias e órgãos públicos.
Atualmente, há cerca de 32 milhões de pessoas sem acesso a água potável e mais de 90 milhões sem coleta de esgoto, realidade que o Instituto Trata Brasil considera como “precária”.
Para atingir a meta de atender 99% da população com abastecimento de água e 90% com esgotamento sanitário até 2033, o governo deveria desembolsar R$ 46,3 bilhões e, assim, alcançar os R$ 509 bilhões que ainda faltam ser investidos. Isso é mais que o dobro da média de R$ 20,9 bilhões destinada anualmente a esse serviço no período de 2018 a 2022.
“O saneamento olha tanto para a infraestrutura extramuros aquilo que precisa ser feito pelo poder público para que as pessoas tenham acesso à água tratada e coleta de tratamento de esgoto quanto para a parte intramuros. Nada adianta, por exemplo, a água chegar até o hidrômetro do cidadão e ele não ter condições de fazer a ligação da rede de água para dentro da casa”, afirma Pretto.
THIAGO BETHÔNICO / Folhapress