Expo Cristã vai de ‘Convertidamente’ a faculdade de Malafaia

RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Vagner Marques, 41, estima que em um ano no mercado tenha faturado R$ 1 milhão. Um retorno e tanto para quem injetou R$ 10 mil iniciais numa linha de roupas infantis que inclui a estampa “Convertidamente” —a Alegria, a Tristeza e os demais personagens da animação “Divertidamente” confortados por Jesus, que as abraça e lhes diz “eu cuidarei de vocês”.

Por quatro anos, não teve uma feira para zelar por pequenos empresários como Marques. Havia demanda, havia oferta, mas não havia uma feira de grande porte que desse conta do público evangélico.

Com a volta da Expo Cristã, maior representante do gênero, cresceu o fluxo de negócios voltados a esse consumidor sedento por produtos pensados para ele.

O evento começou nesta quinta (5), num centro de convenções carioca, com um café da manhã para pastores que reuniu de Silas Malafaia a Cláudio Duarte. Os dois levaram também suas marcas para lá.

A Central Gospel, editora de Malafaia, vende clássicos infantis readequados “aos princípios cristãos”. Cinderela, por exemplo, em vez de apenas embarcar numa carruagem moldada a partir de uma abóbora pela varinha mágica de sua fada madrinha, agora sobe numa carruagem levada “por um redemoinho”, como fez o profeta Elias no bíblico Livro dos Reis.

A Teologia da Prosperidade, que incentiva a busca pela bonança material, impulsiona negócios como o de Aline Pimenta, 43. Sua grife Amo Bíblia, ela explica, nasceu d o “desejo de ter uma Bíblia dourada que eu não achava em lugar nenhum”.

Ela própria decidiu então fabricá-la, uma ideia expandida para a confecção de bolsas personalizadas para carregar as Escrituras. O modelo mais pop é feito de pedraria banhada a ouro, vem com uma plaquinha com o nome da dona e custa R$ 359.

No mercado desde 2001, com alguns vaivéns no caminho, a Expo Cristã quase sucumbiu na pandemia. “Acabou com a nossa vida”, diz a atual dona da feira, Adriana Barros. “A gente se prejudicou demais, a renda foi pra zero, sabe o que é zero?”

Marcas como Smilinguido, a formiguinha que prega valores de Deus, foram golpeadas pela crise sanitária, e não havia mais espaço para um evento como a Expo.

Barros notou algumas mudanças no quadriênio em que a feira deixou de acontecer. “O crente é um público que hoje ficou mais exigente, não aceita qualquer coisa, não.”

A educação é um filão forte. Grupos universitários se multiplicam no espaço, inclusive estrangeiros. A Faculdade Vitória em Cristo, com graduação em teologia com mensalidades de até R$ 427, é outro braço do grupo empresarial de Malafaia presente.

Selos sem DNA religioso também se espalham pelo espaço, dos perfumes da Hinode a um consórcio que ali oferta linhas de crédito para ajudar igrejas com construção de estacionamentos e reformas para acessibilidade.

Grifes pequenas se misturam a gigantes como o Três Palavrinhas. O canal infantil preencheu uma procura por “músicas lúdicas e cristãs” para crianças, diz a CEO do grupo, Marina Oliveira, 36, que circula no estande com um pingente onde se lê Jesus.

Hoje o trio de personagens que canta “Deus Grandão” e “Missionariozinho” está no top 20 de vídeos mais acessados no YouTube. São a “Galinha Pintadinha cristã”, compara Oliveira.

Música e literatura dão polpudos frutos mercadológicos. Evangélicos são conhecidos por cultos bem musicais, daí igrejas serem ótimas compradoras no nicho de instrumentos musicais e acústica. E o hábito de leitura do fiel é superior ao da média nacional.

Bíblias são, sem surpresa, o carro-chefe, mas essa avenida é larga. Um dos lançamentos, “Sem Censura”, atende a um perfil mais ideológico. É o novo livro do pastor André Valadão, que em 2022 marchou com o bolsonarismo e no ano seguinte sugeriu que Deus, se pudesse, voltaria ao início e mataria pessoas LGBTQIA+.

Na obra, ele retoma a carga fóbica e diz que o casamento homoafetivo abre portas para “todos os tipos de libertinagem”.

Mas a roupagem política está mais para exceção do que regra na feira, presente em mercadorias como a camisa “Ore pelo Brasil”, nas cores verde e amarela.

A vendedora Marcele da Silva, 29, prefere uma estampa com o nome de Cristo sobre fundo rosa. Compra duas, uma para ela e outra para uma amiga recém-convertida, e vai para a fila das Dez Pragas do Egito.

A atração virtual, sucesso na edição, reconta as chagas que se aplacaram sobre a região segundo a narrativa bíblica, como a morte de primogênitos e a epidemia de piolhos. Atores interpretam Moisés e o faraó Ramsés, que governava o Egito no período.

Esse tipo de trabalho vem se multiplicando em igrejas como a Batista Atitude, que a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro frequentava no Rio.

Isnard Silva, 75, um dos intérpretes de Moisés, é fiel dessa denominação. “Também já fui Pedro, Abraão”, ele elenca outros personagens bíblicos que viveu, com cachês que beiram os R$ 500. Em breve trocará a camisa da grife Tommy Hilfiger por vestes de Moisés. É hora do show.

ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER / Folhapress

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