SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Após aumento na pré-campanha, o número de casos sobre propaganda eleitoral recebidos pelo TRE-SP (Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo) a três semanas do primeiro turno das eleições se aproxima do balanço de 2020, considerando o mesmo intervalo de distância do pleito.
A Justiça Eleitoral paulista registrou neste ano 1.715 processos sobre o tema até 15 de setembro, um recuo de 8% em relação ao consolidado do período de 1º de janeiro de 2020 a 25 de outubro daquele ano, quando o tribunal contabilizou 1.857 novos casos.
Em 2020, o Congresso adiou as eleições para 15 de novembro em razão da pandemia da Covid-19. O dia 25 de outubro seria o dia equivalente ao dia 15 de setembro de 2024, contando quantos dias faltam para as eleições, segundo o TRE-SP.
O levantamento considerou os casos encontrados no sistema de processo judicial eletrônico com o objeto propaganda eleitoral. Os dados abrangem apenas os que envolvem candidatos, e não eventuais processos sobre aspectos administrativos das zonas eleitorais.
Entre as demandas, há denúncias de propaganda eleitoral irregular, publicidade antecipada e pedidos de direito de resposta ajuizados por candidatos e partidos que alegam ser vítimas de informações falsas ou ofensas feitas por adversários.
É o caso de Pablo Marçal (PRTB), candidato a prefeito de São Paulo, multado em R$ 10 mil por sortear o boné usado por ele no debate da Band. O empresário publicou nas redes sociais uma foto fazendo um M com a mão e usando o assessório com a letra bordada.
O juiz Murillo D’Avila Vianna Cotrim, da 2ª zona eleitoral de São Paulo, responsável pelo caso do influenciador, entendeu que houve distribuição de brinde (algo proibido) e, apesar de não ter pedido explícito de voto, que a divulgação teve esse propósito.
Guilherme Boulos (PSOL) foi igualmente condenado após o presidente Lula (PT) pedir votos para o candidato durante evento do 1º de Maio antes do começo oficial da campanha. A decisão foi mantida em segunda instância.
Até 15 de agosto de 2024, período da pré-campanha, o TRE-SP registrou 774 casos sobre propaganda eleitoral, alta de 38% em comparação com os 561 de 2020, mesmo considerando o intervalo de tempo maior, já que pré-campanha foi até o dia 26 de setembro naquelas eleições.
Os números se estabilizam com o início da propaganda oficial. Entre 16 de agosto e 15 de setembro de 2024, somaram-se 941 processos. No caso de 2020, de 27 de setembro a 25 de outubro, foram 1.296.
O TRE diz que “diversos fatores no cenário político e social podem gerar impactos no volume processual”, que a Justiça Eleitoral está preparada e que as variações quantitativas são naturais.
O advogado e professor Wagner Gundim, doutor em direito constitucional pela USP, atribui o aumento no número de processos na pré-campanha de 2024, entre outras razões, à emergência da figura do candidato influencer.
Segundo o especialista, a significativa presença digital traz com ela não apenas uma multidão de apoiadores, mas de pessoas contrárias à candidatura. Além disso, o ambiente virtual propicia situações tênues, que no limite dão margem para o oferecimento de denúncias.
Gundim negou ter se referido especificamente a Marçal, mas é o autodenominado ex-coach que coleciona decisões contra ele de remoção de conteúdo e direito de resposta. O comportamento do candidato tem desafiado a Justiça Eleitoral.
“O acesso à informação é muito mais fácil. E esses novos candidatos, sobretudo eles, mas até mesmo os mais consolidados, se aproveitam da facilidade de fazer a divulgação dos atos de campanha pela internet.”
De acordo com o professor, a estabilização na sequência é normal devido aos julgamentos com aplicação de multa e outras penalidades. Da mesma forma, para ele, os candidatos tendem a “harmonizar” a própria campanha.
Anna Mendes, professora de direito eleitoral e coordenadora acadêmica da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político), considera que a variação sobre propaganda antecipada decorre de uma mudança no entendimento do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Segundo ela, uma alteração legislativa de 2015 proibiu explicitamente o pedido de votos da pré-campanha, o que abriu espaço para tudo que não fosse isso. Ultimamente, no entanto, o TSE tem tornado esse entendimento mais rigoroso.
A teoria das palavras mágicas começou a ser aplicada nesse sentido. A Justiça, por exemplo, pode penalizar o uso na pré-campanha de expressões com sentido parecido com o do pedido explícito de votos.
Em 2022, a corte superior ensaiou mais uma restrição: condenou o então candidato Jair Bolsonaro (PL) por propaganda eleitoral antecipada mesmo sem pedido explícito de votos por conta de uma motociata.
O tribunal entendeu naquele momento que a natureza do evento e o conjunto das circunstâncias em que foi organizado caracterizam ato de campanha.
“Esse foi um caso difícil, mas não vejo o TSE indo além”, diz Mendes, para quem o entendimento do TSE se equilibrou de modo um pouco mais restritivo que o fixado em lei.
ARTHUR GUIMARÃES / Folhapress