SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS0 – Vestindo um capuz preto estilo ninja cobrindo toda a cabeça, grandes óculos escuros espelhados e uma camiseta de cor verde marca-texto, o avatar do brasileiro Orlando Moraes, 25, percorre o mundo visitando localidades como Bangladesh e Ucrânia. A personagem, contudo, cai de paraquedas a cada nova viagem, sem fazer ideia do ponto ao redor do globo em que está.
A vegetação, a arquitetura, as placas ao longo da estrada e até o carro do Google Street View são algumas das pistas em que Moraes, ou Orlando Geo, como é mais conhecido, baseia-se para identificar a localização. Natural de Macaé, no Rio de Janeiro, ele é um dos melhores jogadores do planeta no jogo GeoGuessr.
Criado em 2013 na Suécia e hoje com cerca de 80 milhões de jogadores em escala global, o jogo se baseia em milhares de imagens capturadas pelos carros do Google. Cabe aos competidores descobrir os locais apenas com base nos elementos disponíveis na tela.
Entre os dias 11 e 14 de setembro, foi realizada em Estocolmo, capital da Suécia, a segunda edição da Copa do Mundo de GeoGuessr, com 24 participantes de 15 países na disputa por um prêmio total de US$ 50 mil (R$ 274 mil). A cada disputa, vence o duelo quem mais se aproxima do local exibido.
Moraes, que, como muitos ali, começou a jogar durante o confinamento social imposto pela pandemia de Covid-19, ficou em terceiro na fase de grupos –com três vitórias e duas derrotas–, venceu a repescagem e as quartas de final e parou somente na fase semifinal. Por muito pouco não chegou à grande decisão, sendo derrotado por 3 a 2 pelo norte-americano James “MK” Falconio.
Entre as paisagens que conseguiu reconhecer durante a competição, uma das mais emblemáticas –que foi a que lhe assegurou nas semifinais– foi a de Bangladesh. A única pista disponível no cenário era uma série de árvores em sequência no entorno de uma pequena via asfaltada.
“As árvores enfileiradas no canto da rua são algo bastante comum na região”, afirmou Moraes à Folha. “Não estudo muito especificamente cada tipo de vegetação, mas, de tanto ver, acabo associando. Não sei que espécie de árvore é aquela, mas sei que é um tipo comum em Bangladesh”, acrescentou o fluminense, que é estudante de engenharia de controle e automação na Unifei (Universidade Federal de Itajubá) e trabalha na área de programação, como desenvolvedor de softwares.
No caso de Bangladesh, segundo Moraes, também o ajudou no trabalho de identificação uma espécie de nevoeiro que paira no ar, em decorrência da poluição característica da região.
Durante as semifinais, Moraes também foi bem-sucedido ao conseguir identificar uma área rural na Ucrânia –graças à arquitetura típica do leste europeu e à paisagem montanhosa–, e uma estrada em um dia chuvoso em Minnesota, nos Estados Unidos –para isso, valeu-se da visualização de uma placa à beira da via que entregava qual estado ela cortava.
Na competição, há três categorias em que os participantes se enfrentam. As duas principais, que se revezam a cada rodada, são a que os jogadores podem mover o cursor 360º e a que eles podem se mover livremente com o avatar para explorar a região. Em caso de empate nas rodadas preliminares, há também a opção da imagem estática, que não permite que os competidores façam qualquer tipo de movimentação.
Além da vegetação e da arquitetura, os carros do Google Street View, que capturam as imagens para alimentar o buscador, também fornecem informações importantes. Segundo Moraes, para olhos treinados, é possível notar nas imagens das Américas a parte da frente dos carros, enquanto na Europa e na Ásia é a parte de trás dos veículos que acaba sendo visualizada.
Não sei por que é assim, mas é também uma forma para diferenciar os lugares”, afirmou o brasileiro, que se classifica como um jogador mais generalista em comparação com os pares.
“Há jogadores que focam muito alguns países específicos, tipos de estradas ou detalhes dos carros. Já eu tento estudar de tudo um pouco e acho que, em localizações com pouca informação, consigo sempre ter uma boa ideia. Talvez não tenha um destaque muito específico, mas de tudo entendo um pouco.”
O terceiro lugar na Copa do Mundo, ao lado do canadense Nathan “Fau” Pfeffer –não há disputa pelo bronze–, rendeu a Moraes uma premiação de US$ 4.000 (R$ 21,9 mil).
A competição, vencida pelo francês Mathieu “Blinky” Huet, foi um sucesso de público. O auditório em que foi realizada a competição teve a capacidade de mil lugares esgotada. Mais impressionante foi a audiência online, com quase 300 mil acessos simultâneos durante a final. A semifinal entre Moraes e MK foi seguida por 234 mil entusiastas.
Foi um salto em relação à primeira edição da competição, no ano passado, quando 70 mil acompanharam a final vencida pelo holandês Patrick “Consus” Noordijk.
Moraes, que chegou a contar com o patrocínio de uma empresa brasileira de geolocalização para a disputa do campeonato, espera estar de volta em 2025 para brigar pela taça de campeão.
Devido ao seu bom desempenho no país nórdico, o brasileiro viu seu canal no YouTube dar um salto de seguidores –foi de 3.000 para mais de 12 mil.
“Pretendo agora focar um pouco a faculdade e o trabalho até o fim do semestre e depois voltar aos estudos focados no GeoGuessr”, afirmou ele. Na preparação para o Mundial, Moraes chegou a treinar quatro horas por dia.
Com um modo gratuito até fevereiro, o jogo tem agora somente versões pagas, que variam entre R$ 6,59 e R$ 12,99 mensais.
“Meu objetivo é continuar jogando, manter o meu nível e inspirar mais jogadores brasileiros a se especializar no jogo.
Entenda como funciona uma partida de GeoGuessr
– a imagem capturada pelas câmeras do Google Street View é exibida na tela do smartphone ou PC
– os jogadores têm um minuto para analisar o cenário, podendo rotacionar 360º ou mover-se livremente, a depender do modo de jogo selecionado
– a partir da análise da imagem, os jogadores abrem um mapa-múndi e destacam a região que acreditam estar retratada na tela
– após um dos jogadores escolher a região, o adversário tem até 15 segundos para fazer sua opção; aquele que mais se aproxima do local exibido vence o duelo.
LUCAS BOMBANA / Folhapress