Hegemonia do Corinthians no feminino passa por elenco, profissionalização e arquibancadas

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A conquista do hexacampeonato brasileiro no domingo (22) pelas Brabas -como são conhecidas as jogadoras da equipe feminina do Corinthians-, ao bater o São Paulo em um dia de recorde de público na Neo Química Arena, na zona leste da capital paulista, reflete o sucesso de um trabalho iniciado há cerca de oito anos que inclui a construção e a manutenção de um elenco forte e competitivo, a profissionalização e o apoio vindo das arquibancadas.

A trajetória vitoriosa remonta desde a reativação do futebol feminino no Parque São Jorge, em 2016, ano em que a equipe resultante da parceria com o Grêmio Audax conquistou a Copa do Brasil.

No ano seguinte, veio a primeira das quatro taças na Copa Libertadores -que voltaria a ser levantada em 2019, 2021 e 2023-, e, em 2018, a do Campeonato Brasileiro, vencida novamente entre 2020 e 2024 de maneira ininterrupta.

Dois dos principais responsáveis pelas conquistas em série foram os profissionais encarregados pela montagem e pelo comando de um elenco capaz de brigar em diferentes frentes.

A dirigente Cristiane Gambaré, que havia ocupado um assento no conselho do clube por uma década, foi destacada para ficar à frente do departamento do futebol feminino após o término da parceria com o Grêmio Audax, em 2018, tornando-se uma das principais vozes em defesa da categoria, enquanto o técnico Arthur Elias, que já havia sido campeão brasileiro com a equipe do Centro Olímpico, chegou em 2016.

Sob o comando da dupla multicampeã -alçada recentemente à seleção brasileira devido ao retrospecto vitorioso no alvinegro-, o Corinthians viu começar a chegar uma série de jogadoras promissoras, que rapidamente ganharam destaque e projeção nacional, passando a compor a seleção brasileira.

São atletas como as atacantes Vic Albuquerque, que foi contratada em 2019 e tornou-se a maior artilheira do Corinthians feminino com 106 gols, e Gabi Portilho, que está desde 2020 e fez parte da equipe olímpica do Brasil que conquistou a prata em Paris-2024.

Devido ao bom desempenho apresentado no clube e na seleção, Portilho, junto com a zagueira Tarciane -vendida pelo Corinthians ao Houston Dash em abril, na transação mais cara do futebol feminino até então– foram indicadas ao prêmio Bola de Ouro 2024, assim como o técnico Arthur Elias.

“O Corinthians estruturou o departamento feminino com estratégia, com profissionais gabaritados e consequentemente formulando uma grande equipe. O clube está colhendo o que plantou e é referência dentro do campo e fora dele”, afirma o especialista de marketing Fábio Wolff, membro do comitê organizador da Brasil Ladies Cup.

Para a atual temporada, o clube ainda reforçou o plantel vencedor de quatro títulos em 2023 -Libertadores, Brasileiro, Paulista e Supercopa do Brasil–, com jovens promessas como as meias Yaya, 22, vinda do Santos, e Gisela Robledo, 21, revelação colombiana negociada junto ao América de Cali.

Além de serem atraídas para compor um elenco vencedor, as jogadoras também receberam em 2020 um incentivo adicional. Foi quando o clube optou pela profissionalização de todas as atletas do elenco, que até então tinham geralmente apenas contratos de curta duração como prestadoras de serviço, sem os benefícios previstos pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

“O futebol feminino é realidade. Não temos mais como recuar. Nesse sentido, a profissionalização de nosso elenco é de suma importância e um avanço de peso dentro do Corinthians e da modalidade”, declarou Cristiane Gambaré na ocasião.

O sucesso da equipe dentro das quatro linhas se manteve mesmo com as saídas de Arthur Elias e Cristiane Gambaré -já havia faturado o tri da Supercopa do Brasil em fevereiro-, e trouxe a reboque um apoio crescente da massa de aficionados.

Na segunda partida da final contra o São Paulo, no estádio corintiano em Itaquera, 44.136 pagantes apoiaram as Brabas na vitória por 2 a 0, registrando um novo recorde de público da América do Sul no futebol feminino de clubes.

O recorde já havia sido batido na edição de 2023 pelo próprio Corinthians, quando 42.556 torcedores compareceram à decisão contra a Ferroviária.

A equipe de Araraquara, no interior de São Paulo, é inclusive a única do país que conseguiu interromper a sequência de vitórias alvinegras, com a conquista do Brasileiro em 2019 -já havia ficado com o título em 2014-, e da Libertadores em 2020 -também venceu o continental em 2015.

O clube da zona leste também busca explorar o engajamento da torcida nas redes -a página da equipe feminina no Instagram soma quase 2 milhões de seguidores. Adversário na final do Brasileiro, o time do São Paulo tem cerca de 384 mil seguidores.

“A torcida do Corinthians é diferente. Enfrentei ela durante muito tempo e sei da força que ela gera para a equipe”, afirmou ao SporTV após a conquista do Brasileiro o técnico Lucas Piccinato, que chegou no fim do ano passado para substituir Arthur Elias após passagens por Internacional e São Paulo.

O título rendeu uma premiação de R$ 2 milhões, um reajuste de 25% em relação ao ano anterior, reflexo da valorização conquistada pelas mulheres dentro de campo.

“O Corinthians tem seguido premissas importantes, como investimento na base, na estrutura e nos profissionais, além de ter criado uma filosofia de trabalho que vem se mantendo, mesmo com as mudanças no elenco e na comissão técnica. A longo prazo, os resultados aparecem e são inevitáveis”, diz Flávia Magalhães, médica do esporte com passagem pela seleção brasileira e que trabalhou em todas as edições do Brasileirão feminino entre 2013 e 2023.

O Corinthians não informa nos balanços financeiros o valor destinado ao futebol feminino. Procurado pela Folha, o clube não se pronunciou até a publicação da matéria.

Para a maior artilheira da equipe, o caminho trilhado pelas Brabas na última década dificilmente será repetido. “Eu acho que não vai existir na história um time como o Corinthians, que hoje não é mais um projeto, é um time sólido, profissional”, disse Vic Albuquerque durante as comemorações do hexa.

A coleção de taças poderá ser ampliada ainda neste ano. O time está nas semifinais do Campeonato Paulista e disputará no próximo mês a Copa Libertadores. A competição continental será realizada de 3 a 19 de outubro, no Paraguai, onde as jogadoras do alvinegro defenderão o título.

Confira os títulos enfileirados pelas Brabas

Campeonato Brasileiro

2018, 2020, 2021, 2022, 2023 e 2024

Copa Libertadores

2017, 2019, 2021 e 2023

Campeonato Paulista

2019, 2020, 2021 e 2023

Supercopa do Brasil

2022, 2023 e 2024

Copa do Brasil

2016

Copa Paulista

2022

LUCAS BOMBANA / Folhapress

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