Juiz condena USP por ter barrado matrícula de jovem que não foi considerado pardo

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O juiz Danilo Ponciano de Paula, da 2ª Vara de Cerqueira César, no interior de São Paulo, condenou a USP a garantir vaga para um estudante aprovado por cotas raciais em medicina, no vestibular passado, e que teve a matrícula cancelada por um banca de heteroidentificação que não o considerou pardo.

A decisão confirma liminar obtida em abril por Alison dos Santos Rodrigues, que tinha 18 anos na época. Cabe recurso. Procurada pela Folha, a USP disse que não se manifestaria sobre a nova sentença.

Conforme a decisão proferida na terça-feira (24), a universidade também deve “ressarcir o autor de eventuais despesas que tenha suportado” por ter tido a vaga negada.

Alison foi aprovado em medicina em primeira chamada pelo Provão Paulista, vestibular exclusivo para alunos da rede pública e que distribuiu 1.500 vagas para a USP. A prova criada pelo governo paulista é uma das formas ingresso na instituição, além do vestibular Fuvest e da nota do Enem.

O candidato concorreu pela reserva de vagas para candidatos egressos da rede pública e autodeclarados PPIs (pretos, pardos e indígenas).

Ele se identificou como pardo, mas a comissão de heteroidentificação da USP, criada para avaliar esse tipo de informação a fim de barrar fraudes, discordou da autodeclaração. Depois de verificar uma fotografia e fazer um encontro virtual de cerca de um minuto com o candidato, a banca decidiu que ele não poderia ser considerado pardo.

Em justificativa para a Justiça a USP declarou que Alison não foi considerado pardo por ter “pele clara, boca e lábios afilados, cabelos raspados” e que, por isso, não apresentava o “conjunto de características fenotípicas de pessoa negra”.

Para o juiz, a argumentação da USP é “genérica, sem referência específica às condições do candidato e em aparente contradição com as fotografias trazidas aos autos”.

O magistrado também afirmou que Alison pode ter sido prejudicado pelo processo de avaliação da comissão, já que não foi garantido a ele o direito de ser analisado presencialmente por ter sido aprovado pelo Provão Paulista —como acontece com os candidatos selecionados pela Fuvest, vestibular próprio da USP.

Alison não foi o único candidato a ter autodeclaração como pardo rejeitada pela universidade neste ano. Conforme mostrou a Folha, só entre os aprovados em primeira chamada, 204 recorreram após ter sua a autodeclaração negada.

No início de março, outro estudante conseguiu garantir pela Justiça a vaga na Faculdade de Direito, depois que a USP negou que ele fosse pardo.

Uma das últimas universidades públicas do país a adotar cotas raciais, a USP reserva 50% das vagas dos cursos de graduação para alunos que estudaram na rede pública. Dessas vagas, 37,5% são destinadas para candidatos autodeclarados PPI (pretos, pardos e indígenas).

Em julho deste ano, a USP anunciou que acabaria com a entrevista presencial para a banca de heteroidentificação dos candidatos. A partir do próximo vestibular 2025, após análise das fotografias feitas na primeira etapa de averiguação, todos os candidatos reprovados serão convocados para uma entrevista virtual.

“É nossa meta implementar políticas que busquem garantir a diversidade na USP, dialogando sempre com a sociedade e fazendo os ajustes necessários”, declarou o reitor Carlos Gilberto Carlotti Junior, em nota na ocasião.

Em entrevista à Folha de S.Paulo em março, porém, Carlotti havia prometido que todas as entrevistas ocorreriam de forma presencial a partir de 2025.

ISABELA PALHARES / Folhapress

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