SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Famosa em Ubatuba, litoral norte de São Paulo, pelos empreendimentos de alto padrão, com fachadas muito bem arquitetadas, a Atmosfera Incorporadora resolveu colocar um pé no freio neste ano depois que o mercado voltou a apostar em um novo ciclo de alta de juros, o que acabou se concretizando.
Com apenas um lançamento neste ano e o relançamento de uma obra que havia sido desembargada, a empresa está apostando no seguro, preferindo colocar no mercado apenas os “blockbusters”, empreendimentos premium com venda instantânea em locais onde a companhia já possui uma carteira sólida.
“O pessoal de classe média, média-alta não está comprando [imóvel na praia] do jeito que estava antigamente. Então, pisamos o pé no freio este ano”, disse à Folha de S.Paulo Kailash Pinotti, diretor-presidente da Atmosfera.
A companhia projeta uma volta do crescimento apenas em 2026. Confira esse e outros trechos da entrevista.
PERGUNTA – Quando surgiu a Atmosfera?
KAILASH PINOTTI – Ela é uma continuidade da imobiliária do meu bisavô, fundada em 1958. A Atmosfera é a terceira geração da empresa que tem como sócios eu e meu pai 2006.
P. – A empresa, então, já viveu diversos ciclos macroeconômicos. O atual está sendo marcado por uma nova alta de juros. De que forma esse cenário impacta a Atmosfera?
KP – Nós estamos fugindo de fazer empreendimentos muito grandes, que dependam de um esforço enorme de quantidade de clientes, de crédito.
O pessoal de classe média, média-alta não está comprando [imóvel de praia] do jeito que estava antigamente. Então, pisamos o pé no freio este ano. Fizemos dois lançamentos, apenas de produtos premium, nada em localização mais difícil, que exija um grande esforço de venda. Estamos lançando agora só os “blockbusters”, que são produtos que têm a venda quase instantânea, em locais onde a Atmosfera já tem uma carteira de investidores.
P. – Seguramos o crescimento agora, mas em 2026 imaginamos que já tenha um mercado que consiga absorver lançamentos maiores.
No início deste ano a Atmosfera viralizou com o edifício VIW Residence, que tem piscinas de acrílico em todas as varandas. Como surgiu essa ideia?
KP – O empreendimento está de frente para o mar, na Praia Grande [Ubatuba], em uma área do mercado imobiliário de Ubatuba que tem o metro quadrado mais caro. Um apartamento ali já chegou a ser vendido por mais de R$ 30 mil o metro quadrado. Pensamos: ‘Vamos fazer o melhor apartamento de frente para o mar’. Queríamos criar algo diferente.
O desafio era colocar uma jacuzzi nas varandas. Mas quando você coloca uma jacuzzi em uma varanda, ela tampa a visão de quem está na sala, porque a jacuzzi aflora para cima do piso ou afunda na varanda do vizinho de baixo. Então, resolvemos fazer um movimento da varanda que imita mais ou menos a Serra do Mar da região. E colocamos o acrílico com o visor para poder criar o efeito de borda infinita.
P. – Em quanto tempo vocês conseguiram entregar esse empreendimento?
KP – Foi uma jornada. Foram uns 4 anos de obra. Mas foi no meio da pandemia, os portos travaram, a mão de obra não estava funcionando na Tailândia, onde se faz o acrílico. Foi bem desafiador.
P. P E vocês não puderam testar antes de instalar as piscinas, né?
KP – Isso foi um problema. É tipo engenharia de foguete: ele vai subir lá para a lua e tem que funcionar, não tem outra alternativa… Fizemos todos os cálculos, com grande segurança, e fomos atrás do melhor material. Tinha que ser aquele acrílico, com aquela espessura. Eram muitos detalhes.
E o que podemos esperar de mais novidades?
Depois de lançarmos o VIW, resolvemos fazer um produto um pouco diferente, voltado ao público que quer comprar apartamento como investimento, para alugar. O Bambu [lançado recentemente] nasceu com essa cara.
Queríamos uma fachada bonita e original. Então surgiu a ideia de uma piscina no topo com placas de cobre, imitando o verde do bambu, e também com bambu de verdade nos acabamentos. Foi uma solução pensada para usar material e mão de obra locais, além de trazer uma leveza ao empreendimento.
Agora, seguindo essa linha, estamos pensando em fazer um empreendimento com taipa, que é uma outra técnica de construção, super simples e brasileira, que é trazer terra para os acabamentos de fachada.
P. – Quais as particularidades de se atuar no mercado imobiliário do litoral de São Paulo?
KP – Existe uma grande insegurança jurídica. Porque as cidades aqui têm um plano diretor muito defasado e temos vários zonamentos entrepostos. Tem um zoneamento ecológico-econômico junto com um zoneamento municipal e restrição do Condephaat [Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico], porque toda a Serra do Mar aqui é tombada. Então, a aprovação é muito mais difícil.
Também tem um problema que é a falta de infraestrutura. Acabamos empreendendo em bairros que não têm esgoto tratado e às vezes temos que fazer uma obra de infraestrutura enorme com todo um custo a mais.
Por outro lado, temos escassez de área pela questão ambiental da preservação, o que eleva o preço. E sempre tem uma demanda alta. Mas tem épocas em que nossos produtos viram produtos de sobremesa. Porque, na hora da crise, a primeira coisa que a pessoa corta é a casa de praia, que acaba sendo vendida por um preço baixo. Então, o mercado se desvaloriza muito rápido.
P. – Como está o momento atual em relação a isso?
KP – Hoje, especificamente aqui em Ubatuba, ainda estamos vivendo um pouco do efeito da pandemia, porque muitas pessoas mudaram para cá e agora estão se estabelecendo. Então, ainda estamos com essa demanda acontecendo.
RAIO-X
Kailash Pinotti, 43
Formado em tecnologia da informação e em administração de empresas, passou pela Telefônica do Brasil antes de entrar no negócio do pai, hoje seu sócio, Paulo Pinotti. Na Atmosfera Incorporadora, Kailash passou por alguns cargos, como gerente de projetos e diretor financeiro, antes de assumir como CEO
STÉFANIE RIGAMONTI / Folhapress