Mostra de Richard Long e Not Vital entrelaça natureza, escultura e arquitetura

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O suíço Not Vital escolheu pintar a tela “2 Self-Portraits” com um tom de branco desconcertante. Olhar para a obra é como encarar um abismo gelado. Já a maior parte da pintura “3 Self-Portraits” é de um azul intenso e quase opressivo. Se observarmos a obra por tempo suficiente, a impressão que se tem é a de submergir lentamente em águas profundas.

Em cartaz na galeria Nara Roesler, no Rio de Janeiro, a exposição “Mães” oferece ao público a oportunidade de mergulhar na produção do artista suíço. Aliás, não só na produção dele.

A mostra, que marca os dez anos da filial carioca da galeria fundada em São Paulo, apresenta também obras de Richard Long, ganhador do prestigioso Turner Prize e um dos pioneiros da “land art” –movimento que incorpora elementos da natureza a obras de arte.

Em 2000, por ocasião da inauguração do Tate Modern, em Londres, o britânico expôs uma escultura feita de rochas e limo. Desta vez, ele escolheu apresentar na exposição do Rio troncos e uma grande pintura feita a partir da mistura de argila e água.

Fundadora da galeria que leva seu nome, Nara Roesler diz que a proximidade com a natureza é justamente um aspecto que liga os dois artistas –amigos de longa data que admiram a mãe um do outro. Por esse motivo, decidiram homenageá-las com essa mostra.

“O Richard sempre foi um artista viajante, então ele trabalha com o material que acha no meio ambiente, de pedras a gravetos”, afirma Roesler. “Já Not representa a natureza, muitas vezes por meio de animais. Só que ele usa outro tipo de material, como peças fundidas na China, por exemplo.”

Nascido na pequena cidade de Sent, na Suíça, Vital cresceu em um ambiente cercado por neve e montanhas. Não à toa, tons frios são prevalentes em sua produção.

Exemplo disso é a escultura “Pão de Açúcar”, que reproduz a famosa formação rochosa localizada na zona sul do Rio de Janeiro. No entanto, no lugar do marrom da rocha e do verde das plantas, o que se vê é o branco produzido pelo uso do gesso.

“Quando eu era criança, lembro que nevou muito em um ano, então decidi construir um túnel de gelo que virou o meu habitat”, diz o suíço, que tem obras em instituições como MoMA, Guggenheim e Bibliotheque Nationale de Paris. “No inverno, as aulas entram em recesso devido ao frio. Então ficávamos meses sem fazer nada. Nesse período, aproveitava para construir casas nas árvores.”

Essa brincadeira se transformou em projeto estético. Not é célebre pelas obras que ele chama de “scarch” – neologismo com a mistura das palavras escultura e arquitetura em inglês.

Diferentemente dos arquitetos, Vital não constrói esses monumentos por motivos utilitários. Não há banheiros, cozinhas ou quartos. As obras são antes de tudo uma linguagem poética e um convite para contemplar a natureza. Os nomes de algumas delas deixam essa proposta evidente.

No Níger, ele construiu uma obra intitulada “Casa para Assistir ao Pôr do Sol”. Já na Indonésia, ergueu a “Casa para ver os Três Vulcões”.

O arquiteto libanês Hashim Sarkis escolheu um dos “scarchs” de Vital para compor a Bienal de Arquitetura de Veneza, quando fez a curadoria da exposição, em 2021.

Ele também já apresentou as obras em países como Chile, Filipinas, Mongólia, Suíça e Brasil, onde instalou na Amazônia uma escultura que lembra vagamente uma casa da árvore. A diferença, no entanto, é que a construção amazônica é alta, característica que está presente em boa parte das esculturas do suíço.

É um elemento que tem a ver com o fascínio pelas montanhas de sua infância. “Se eu tivesse nascido na Holanda, que fica abaixo do nível do mar, possivelmente meu trabalho não teria esse elemento.”

O artista leva um estilo de vida nômade. Ele tem casas no Rio, em Sent e em Pequim. Além disso, viaja frequentemente para construir suas esculturas. “Não acho que viver em um apartamento a vida toda seja o ideal.” Essa postura inquieta se reflete em sua produção, marcada por obras que se adaptam aos locais em que estão inseridas.

“Se estou na Amazônia, não faz sentido construir uma torre de ferro. Ela precisa ser de madeira”, diz ele, acrescentando que a estrutura foi tomada pela vegetação e por animais.

O artista, no entanto, não tem apego. “Pedi para não cortarem a grama e deixá-la crescer. Agora a obra é da natureza.”

Not Vital + Richard Long – Mães

Quando: Seg. a sex, das 10h às 19h. Sáb., das 11h às 15h. Até 19 de outubro

Onde: Galeria Nara Roesler – rua Redentor, 241, Ipanema

Preço: Gratuito

Classificação: Livre

MATHEUS ROCHA / Folhapress

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