SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) derrubou nesta segunda-feira (7) a decisão liminar que tinha suspendido, em julho, a licença prévia do polêmico projeto de reconstrução e asfaltamento do trecho central da BR-319, a rodovia inacabada que liga Manaus a Porto Velho. Assinada pelo desembargador Flávio Jardim, a decisão contemplou os pedidos formulados pela União, Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) contra a suspensão.
O tribunal afirma que a licença prévia apenas atesta a viabilidade ambiental do empreendimento, com o estabelecimento dos requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas fases subsequentes de implementação, que não será imediata.
“De modo diverso, trata-se de uma etapa avaliativa; de exame e de estudo. Os referidos estudos têm de atestar a viabilidade ambiental do empreendimento e de estabelecer o que deve ser executado para que as posteriores licenças de instalação e operação sejam deferidas”, diz trecho do processo.
O desembargador afirma ainda que “trata-se de uma verdadeira estrada de barro, que permanece em atividade e que demanda urgente revitalização, sob pena de manutenção do isolamento das populações que vivem nas regiões interligadas pela rodovia e dos gastos com medidas paliativas de não agravamento”.
Em setembro, o presidente Lula (PT) prometeu retomar “com a maior responsabilidade” a construção da BR-319 e disse que a obra ganhou importância diante do cenário de seca nos rios da amazônia.
“Nós temos consciência que quando rio estava navegável e cheio, que podia ter barco grande, a rodovia não tinha importância que tem [comparado a] quando o rio Madeira estava vivo. Não podemos deixar duas capitais [Manaus e Porto Velho] isoladas”, disse o presidente.
Durante visita ao Amazonas, em 10 de setembro, Lula também assinou uma ordem de serviço que autoriza as obras de pavimentação em 20 km da rodovia. Segundo o presidente, um edital seria lançado para licitar as obras de mais 32 km, totalizando 52 km de asfaltamento.
Em julho, a Justiça Federal suspendeu a licença prévia dada pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) para as obras no chamado trecho do meio da rodovia, que corta a amazônia. A decisão, de caráter liminar (provisório), foi da juíza Mara Elisa Andrade, da 7ª Vara Federal Ambiental e Agrária da Seção Judiciária do Amazonas.
A decisão, à época, baseou-se, entre outros pontos, no fato de as comunidades indígenas da região reclamarem que não foram consultadas sobre o empreendimento e a licença, além de não ter exigido estudo de impacto ambiental, também ter ignorado a possibilidade de gerar aumento no desmatamento.
O pedido pela suspensão das obras foi feito pelo Observatório do Clima, rede com mais de cem entidades ambientalistas, que alegou falta de medidas para evitar a destruição da amazônia.
Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, afirma que a decisão desta segunda-feira, pela derrubada da liminar que continha a licença prévia, é contraditória e tem “problemas sérios, inclusive do ponto de vista jurídico”.
“Essa liminar provisória expedida pelo governo Bolsonaro é nula. Atesta a viabilidade socioambiental de um empreendimento que, sem garantia de governança na região, é inviável. O próprio Ibama explicitou preocupação com o desmatamento na região com o asfaltamento da estrada em diferentes documentos constantes no processo de licenciamento”, afirma.
Araújo critica ainda o modelo de estrada-parque, isolada por cercas e com monitoramento eletrônico, defendida pelo Ministério dos Transportes. Segundo ela, a obra terá impactos negativos históricos, irreversíveis, conflitando com todo o esforço de implementação do PPCDAm (plano de controle do desmatamento na amazônia).
“Governança não se constrói prevendo um pequeno número de postos de controle na estrada. Nem cercas, como um grupo de trabalho do governo propôs. É bem decepcionante ver o governo Lula se manifestar nesse processo judicial explicitando apoio a esse empreendimento”, diz também.
JORGE ABREU / Folhapress