Uso de telemedicina em UTI não reduz tempo de internação, diz estudo

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um estudo do Hospital Israelita Albert Einstein, realizado por meio do Proadi-SUS (Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde), do Ministério da Saúde, em parceria com o ISGlobal (Instituto de Saúde Global de Barcelona), concluiu que o uso da telemedicina em UTI (Unidade de Terapia Intensiva) não contribui com o tratamento de pacientes internados nem reduz o tempo de hospitalização.

O ensaio clínico randomizado envolveu 17.024 pacientes graves, com 18 anos ou mais, de 30 UTIs de hospitais públicos brasileiros em 17 estados de todas as regiões do país, entre junho de 2019 e julho de 2021.

Os resultados do estudo, batizado de Projeto Telescope 1, foram apresentados no Congresso da Sociedade Europeia de Medicina Intensiva, em Barcelona, e publicados no The Journal of the American Medical Association (Jama), nesta quarta-feira (9).

Para a análise, 15 UTIs seguiram suas rotinas habituais de atendimento. A outra metade recebeu, além dos cuidados habituais, rodadas diárias de telemedicina que consistiam em reuniões entre um intensivista do Hospital Israelita Albert Einstein em regime remoto e a equipe local para discussão de diagnósticos e planos de tratamento.

O especialista também fornecia à equipe médica orientações atualizadas de tratamento e realizava sessões virtuais mensais para revisão dos indicadores de qualidade da UTI, de segurança, processo e desfecho. O modelo foi centrado no médico.

Para a intervenção, foram construídos 20 protocolos —produzidos em textos e vídeos— com as doenças e condições mais comuns no Brasil.

Os atendimentos ocorriam em dias úteis, dentro do Einstein ou de locais com estrutura e internet adequadas, longe de barulho e com boa iluminação. Não houve problemas tecnológicos.

Para a escolha das UTIs, os pesquisadores distribuíram convites por email para unidades do Cnes (Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde) e da Rede Brasileira de Pesquisa em Terapia Intensiva. A maioria não foi respondida e muitos números de telefone eram inválidos. As instituições que aceitaram o convite e atenderam aos critérios de elegibilidade foram incluídas no estudo.

Participaram da análise as unidades de terapia intensiva com pelo menos oito leitos —a maioria tinha dez— e médicos e enfermeiros registrados no local. Era requisito não ter intensivista nestes locais.

As especializadas —como unidades de cirurgia cardíaca e neurológica, por exemplo—, unidades de cuidados intermediários e UTIs em que rodadas multidisciplinares diárias estruturadas estavam em vigor ou a gestão era orientada por índices de desempenho disponíveis (auditoria periódica e feedback, e planejamento específico com base nos indicadores) foram excluídas. Apenas uma UTI por hospital foi inscrita.

As unidades participantes tinham estruturas semelhantes. Adriano Pereira, médico intensivista do Hospital Albert Einstein e pesquisador responsável pelo Projeto Telescope as define como UTIs da realidade brasileira.

“São UTIs com estrutura básica, de acordo com a que a legislação prevê. Em nenhuma faltava médico e enfermeiro no plantão. Não havia falta de um insumo crítico. Todas tinham ventilador, respirador. Qual é o perfil que precisamos? Não sabemos. O que eu posso dizer é que as que entraram no estudo são UTIs pragmáticas, da vida real do brasileiro”, afirma Pereira.

A principal questão do estudo era se a telemedicina poderia reduzir o tempo de internação na UTI, e a resposta foi não. A permanência média na UTI foi praticamente a mesma nos grupos de telemedicina e de cuidados habituais —cerca de oito dias. Outros resultados, como taxas de infecção e mortes hospitalares, também não mostraram diferenças significativas.

De acordo com Adriano Pereira, o estudo também indicou que ainda é um desafio encontrar a melhor forma de utilizar a telemedicina em cuidados intensivos.

“Temos as primeiras evidências científicas sobre o tema, mas há questões que precisam ser respondidas. Há diferentes formas de fazer telemedicina: síncronas, assíncronas, tem formas em que você envolve todos os profissionais ao mesmo tempo ou coloca só o médico do lado remoto, só o médico do lado da equipe multiprofissional… A nossa hipótese é de que as pesquisas precisam continuar no sentido de encontrar qual é o melhor modelo e perfil de UTI para receber a telemedicina”, afirma Pereira.

“Falar sobre telemedicina quer dizer que existe um tipo de atendimento remoto que pode ser muito diferentemente de um local para o outro, e que precisa ser melhor estudado, melhor avaliado, melhor compreendido.”

A pandemia de Covid ocorreu durante a realização do estudo e pode ter sobrecarregado os recursos dos hospitais participantes e impactando nos resultados. Porém, tal possibilidade não foi mensurada.

Os estudos continuam por meio do Projeto Telescope 2. Os resultados estão previstos para 2026.

PATRÍCIA PASQUINI / Folhapress

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