Feira no Texas mostra como é difícil fazer americano aceitar os carros elétricos

DALLAS, EUA (FOLHAPRESS) – Os acessos à State Fair of Texas, feira que ocorre no estado americano desde o século 19, têm cartazes que indicam a proibição da entrada de armas na área do evento. A proibição foi estabelecida após um tiroteio na edição 2023, que terminou com três feridos.

Esses avisos dão o clima do evento, que é uma celebração da cultura texana realizada anualmente na cidade de Dallas. Os revólveres ficam do lado de fora, mas lá dentro estão as comidas e as picapes típicas desse pedaço republicano dos EUA. Transição energética? Não, obrigado.

É basicamente essa a resposta de um senhor de boné branco e bochechas rosadas ao se deparar com o Dodge Charger Daytona a bateria exibido em um pavilhão refrigerado. O primeiro “muscle car” 100% elétrico é destaque no minissalão do automóvel que faz parte da feira estadual, aberta ao público até o próximo domingo (20).

Por alguns segundos, o homem contempla o carro. Quando a consultora responsável pelo veículo se aproxima e começa a apresentar os dados técnicos, ele se espanta. “Electric? No”, diz, de forma educada. Em seguida, se dirige a outro estande.

Juliano Machado, vice-presidente da marca RAM na América Latina, observava o movimento ao redor do Dodge quando a cena ocorreu. O executivo admite a rejeição de grande parte do público americano aos elétricos, ainda mais quando se trata de um modelo icônico.

Machado afirma que haverá outras versões do novo Charger, incluindo a equipada com o motor V6 biturbo (548 cv) da picape esportiva RAM 1500 RHO. As marcas fazem parte do grupo Stellantis.

Esse utilitário faz sucesso na feira. Em uma pista off-road montada no evento, visitantes fazem fila para dar uma volta no banco do carona. Caminhões-pipa jogam água no trajeto de tempos em tempos para reduzir a poeira. A temperatura está em 33° C, com tempo seco.

“Uma em cada cinco unidades da RAM vendidas no mundo está no Texas, e Dallas é a cidade número 1 na compra de picapes”, diz Machado.

Além da 1500 RHO, outros utilitários enormes -e equipados com motores a gasolina igualmente grandes– atraem visitantes na área externa. Há também modelos compactos, como a Ford Maverick renovada que, em breve, chegará ao Brasil.

No pavilhão refrigerado, o tempo é frio em diversos sentidos. Além do Charger elétrico, outros modelos “emissão zero” estão expostos, como o SUV Jeep Wagoneer S e o compacto Fiat 500e. É possível notar que despertam a curiosidade, mas o público não dedica muito tempo a contemplá-los.

A Chevrolet Silverado EV é a exceção. Apresentada em janeiro de 2022, a picape tem o porte que agrada ao texano. São 643 cv de potência e mais de 600 km de autonomia, segundo a GM. Seu preço inicial sugerido é de aproximadamente R$ 400 mil.

Entretanto, apenas 5.250 unidades da versão puramente elétrica foram vendidas nos Estados Unidos entre os meses de janeiro e setembro, segundo o portal GM Authority. A produção em larga escala, prevista para uma nova fábrica em Detroit, já foi adiada algumas vezes e só deve ter início em 2026.

A razão está no resultado abaixo do esperado para os modelos que não queimam combustível. Números de vendas mais robustos só são vistos no estado da Califórnia, que responde por 40% das vendas de veículos a bateria nos EUA. Trata-se do maior mercado do país: no total, foram vendidas 1,78 milhão de unidades em 2023.

Mas o Texas aparece em segundo no ranking, 1,52 milhão de veículos comercializados no ano passado. A frota total de veículos leves e pesados é de 26 milhões de unidades, segundo o Departamento de Veículos Motorizados do estado americano. Desses, 210 mil são 100% elétricos.

Uma pesquisa realizada pela Universidade de Houston em parceria com a Texas Southern University mostra que 60% dos entrevistados que hoje possuem ou alugam um carro a bateria não pretendem se manter na categoria no futuro.

O estudo, divulgado em dezembro de 2023, mostrou que, para 38% dos 1.914 texanos entrevistados, o preço mais alto é uma barreira para o uso de veículos elétricos. Mas os maiores problemas estão na escassez de pontos de recarga e na baixa autonomia dos veículos. Essa combinação de fatores foi apontada como entrave por 46% do público-alvo da pesquisa.

Dessa forma, a transição energética americana tende a se basear em sistemas híbridos, como ocorre no Brasil. Entretanto, mesmo os carros que combinam eletricidade e motor a combustão ainda não decolaram nos EUA.

De acordo com dados da consultoria J.D.Power, há 41 modelos PHEV (híbridos plug-in, que podem ser recarregados na tomada) e 39 do tipo HEV (híbrido convencional, como o Toyota Corolla) disponíveis no mercado estadunidense. Somados aos 60 diferentes BEVs (100% elétricos) disponíveis, esses automóveis representam uma fatia de 10% do mercado. É pouco diante das diferentes projeções feitas pelas montadoras no início da década.

*O jornalista viajou a convite do grupo Stellantis

EDUARDO SODRÉ* / Folhapress

COMPARTILHAR:

Participe do grupo e receba as principais notícias de Campinas e região na palma da sua mão.

Ao entrar você está ciente e de acordo com os termos de uso e privacidade do WhatsApp.

NOTÍCIAS RELACIONADAS